Nos confins do mérito

Por uma questão de honestidade intelectual, apesar de poder parecer pouco sincero face ao que tenho escrito sobre esta matéria nos últimos tempos, faço um esforço para relevar aspectos que considero positivos no programa do PSD, nas declarações do 1º ministro e, quando as houver, nas declarações do ministro da educação.

Já expressei um juízo global sobre o programa do PSD para a educação. Disse e reafirmo que o programa do PSD para a educação é uma continuidade das políticas do PS em tudo o que tem que ver com a(s): racionalização da rede de oferta de ensino (mega-agrupamentos); promoção de uma cultura de avaliação a todos os níveis do sistema de ensino (buscando a inspiração em MLRodrigues), promessa de estabilidade e dignificação da profissão docente; principais medidas que (atentem à pompa) visam promover a cultura de transparência orientada para resultados (o anterior executivo estabeleceu as metas nacionais do sistema educativo a atingir até 2015, agora são estabelecidas metas para a redução do abandono escolar); a reestruturação do Programa Novas Oportunidades.

Para quem desejava a implosão do ME (claro que todos percebemos o sentido figurado da afirmação), o aumento dos exames nacionais e a prova de avaliação de conhecimentos de acesso à profissão são minudências que pouco ou nada beliscam o monstro que foi desenhado nos discursos de pré-campanha eleitoral.

Como iremos ter muito tempo para esmiuçar cada uma dessas medidas, quando virem a luz do dia, aproveito para me regozijar com uma afirmação de Pedro Passos Coelho logo depois de se estender ao comprido com a questão da não suspensão da ADD.

Diz PPCoelho acerca da ADD que «saberemos distinguir entre o que tem em vista a progressão na carreira e aquilo que é a avaliação e melhoria de desempenho nas escolas».

Desligar a ADD da progressão da carreira é a chave de qualquer modelo de avaliação de desempenho cujo objectivo principal vise o desenvolvimento profissional dos professores. Se PPCoelho está ciente do que disse, não sei. Sei que ao dizê-lo PPCoelho tocou a primeira nota do lamiré do mérito 😉

Por falar em rigor…

Por razões óbvias estou cada vez mais susceptível a tudo o que sugere rigor. No trabalho e no lazer, na escola e em casa. Sou cada vez mais rigoroso comigo próprio e com os outros. De tão rigoroso que pretendo ser acabo por ficar mais inconveniente do que é normal. É bem provável que este post não existisse se não estivesse tão sensível ao rigor, como se verá de seguida.

Depois do jantar acompanhei o “Linha da Frente”, da RTP1. No respectivo site, o programa é apresentado como “Um espaço de compromisso com o inconformismo, com a reportagem, com a notícia, com a verdade” e que “vai decifrar a realidade, com o rigor e a seriedade que a RTP já habituou os seus telespectadores.”

Corroboro sem dificuldade que se trata de uma programa que vale a pena seguir com atenção. Hoje, o desafio passava por saber quais os riscos que os nossos (seus) filhos correm e como salvá-los da mais grave epidemia do século XXI. Era para mim inimaginável, num programa deste tipo, que uma das variáveis fundamentais da equação da obesidade desmerecesse a devida atenção da equipa de informação. Refiro-me à actividade física e, em particular, ao contributo da Educação Física e do Desporto Escolar no ataque ao flagelo. Zero! Nem uma palavra, nem uma só referência. Vi apenas a alusão ao mercado do exercício físico, aos ginásios e às academias. Num tempo em que se pedem contas por tudo e por nada, ninguém se preocupa em pedir contas ao Estado pela sua demissão nesta matéria a não ser pelo IVA que é cobrado nas “clínicas do exercício”.

Percebem agora porque considero inócua a bazófia do rigor quando não existe uma prática congruente?

De que modo o “eduquês” ampara o “anti-eduquês” Nuno Crato?

Quem lê e acompanha a blogosfera docente notou o efeito Nuno Crato sobre as expectativas dos professores. Ao eleger a purificação do ME como alvo da sua acção retórica em período pré-eleitoral, rapidamente granjeou apoios dos professores ostracizados pelas políticas dos anteriores governos. Esse capital de confiança não foi sustentado pelas ideias que defendia de forma avulsa, digo eu, ou sobre o modo como a retórica do rigor se materializava na acção política. A partilha efémera do alvo de contestação foi o denominador comum entre Nuno Crato e um conjunto alargado de professores, entre os quais não me incluo como têm notado alguns comentadores. Mas da divinização do investigador à demonização do político foi um passo muito curto e bastou apenas saber que o programa de governo omitia a trucidação do modelo de ADD socratino. Atentem como as medidas que se preconizam no programa de governo foram subalternizadas face ao modo como Nuno Crato vai resolver o problema da ADD. Reformar significa precisamente o quê?

Ora, o nó górdio da credibilidade de Nuno Crato decide-se no sentido que atribuir ao vocábulo “Reforma”. Se reformar significa destruir o anterior modelo e começar de novo, Nuno Crato retoma o capital de confiança perdido; se reformar significa recompor o anterior modelo, Nuno Crato entrará no quadro de mérito da equipa socratina que tão boas memórias nos deixou.

O paradoxo é que só o modo eduquês de resolver os problemas poderá salvar Nuno Crato do descrédito. Se não fosse trágico, pelo desgaste que provoca, até daria para rir.

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PS (salvo-seja): Este eduquês a que me refiro deve ser entendido no sentido que lhe é atribuído por Licínio Lima: um discurso educacional de senso comum, de estilo palavroso e vazio. A Reforma da ADD do PSD ajusta-se perfeitamente a este conceito.

Programa do PSD – Afinal, implodiu a bazófia!

Como era previsível, a montanha pariu um rato: O cidadão, o investigador, o pensador Crato metamorfoseou-se com o recente título ministerial. A retórica de ruptura com o status quo instalado no poder foi terraplanada pela máquina partidária e pela crua realidade.

O programa do governo PSD para a educação básica e secundária poderia ser o programa do governo PS. Aliás, o programa do PSD é um decalque das políticas socratinas para a educação. A transferência de competências para as autarquias, que já estava a ser ensaiada com alguns municípios amigáveis do PS, prossegue com um “novo” modelo de Contratualização com a Associação Nacional dos Municípios Portugueses, os mega agrupamentos serão verticais (atentem a novidade), e depois será tudo reavaliado com muito mais rigor, claro está, com mais exames e outros quejandos. Tudo isto será realizado tendo subjacente o desenvolvimento e consolidação de uma cultura de avaliação a todos os níveis do sistema de ensino. E fica sempre bem dizer que tudo se passa numa cultura de avaliação, coisa que não acontecia antes de Nuno Crato chegar ao governo, como se sabe.

A ADD será reformada, como aliás prometiam as ex-ministras da educação. Sobre a falácia da ADD que está no terreno não se percebe se servirá para alguma coisa. Sabemos que o modelo de ADD proposto pelo CDS passará a ser a referência para qualquer coisa que há-de vir.

Quanto à implosão do ME e das suas inócuas e redundantes estruturas centrais e regionais, nada! Apenas a promessa de que agora há que “Orientar a organização do Ministério da Educação para os resultados” apostando no MÉRITO e nas carreiras dos seus quadros.

Percebe-se agora o silêncio de Nuno Crato desde que tomou posse. É um silêncio acanhado que denota murchidão. E percebe-se porquê: ao invés de implodir o ME, implodiu a bazófia do conferencista incauto.

Não é assunto…

Haverá um tempo em que serão aclaradas as lógicas que determinam as nomeações políticas para as secretarias de Estado. Como nunca ouvi nenhum ministro reconhecer a ausência do critério de competência para a nomeação de cargos políticos, por mais miserável que fosse o desempenho do titular do cargo, não irei perder tempo com os ajudantes de campo de Nuno Crato.

Assunto que importa mesmo aprofundar chega amanhã à Assembleia da República.

Recusar a “meritocracia” de conveniência: Urge democratizar a escola!

“Os problemas do mundo atual exigem uma escola meritocrática, não uma escola que se esgota em projetos de treta, cidadania para aqui e para ali e muita fabricação de sucesso estatístico.”

O Ramiro está coberto de razão: os problemas do mundo actual exigem uma escola meritocrática. Não uma meritocracia manca que apenas destaca aptidões e capacidades de conveniência para um determinado tipo de aluno. Os problemas do mundo actual exigem uma escola democrática que promova todas as aptidões e capacidades das crianças e jovens. Sendo a escola actual unidimensional, no modo como promove o desenvolvimento das crianças e jovens, o discurso da meritocracia acaba por ser inconsequente se não for qualificado de democrático. Para que a escola actual atinja a diversidade das aptidões de todos os sujeitos que a frequentam e que reconheça não uma mas todas as excelências que fazem transcender o ser humano, tem de mudar de paradigma: A escola meritocrática vale muito pouco se não for democrática. Defender o mérito sim. Mas todos e de todos!

Querem ver que mora um “eduquês” em cada um de nós?…

“Um bom professor, tal como uma boa escola, é aquele que consegue contrariar o determinismo sociológico do estatuto socioeconómico familiar pela qualidade do seu ensino, pela forma como potencia as aprendizagens, pelas expectativas que consegue criar e pelas capacidades que consegue desenvolver nos alunos. Por isso dá tanto trabalho ser professor!” David Justino, Difícil é Educá-los, p. 92

Hummm… e como se avalia essa qualidade de ensino que contraria o determinismo sociológico do estatuto socioeconómico familiar?

Se isto não é eduquês, que se cale este blogue até ao próximo amanhecer 😉

Impõe-se um retiro…

Enquanto se esperam as medidas prenunciadas do ME, as conversas de corredor evidenciam muita esperança e uma vontade enorme de deslocar o diapasão do trabalho do professor para o trabalho dos e com os alunos. Esta é a boa notícia!

A má notícia realça uma característica da cultura escolar que é independente da personagem que governe o ME: para o bem e para o mal, os muros das escolas são uma verdadeira peneira das políticas centrais. Atente-se ao modo diverso como as escolas lidaram com as políticas iníquas de MLRodrigues e IAlçada. A questão que importa responder na escola situada é muito simples e até pode ser contestada em abstracto, sem precisar de uma medida governativa como indutora da reflexão:

Como obstar a que as lideranças nas escolas premiem o “facilitismo” e o “demérito”?

Já?

“(…) Bem consciente do ónus de me declarar tão cedo contra a corrente, não comungo da euforia generalizada, que abriu braços à Educação. Explico o que posso explicar. Em Abril, Passos Coelho tinha um programa eleitoral para a Educação. Em Maio tornou público outro, que não só nada tinha a ver com o primeiro, como era a sua antítese. Escassos dias volvidos sobre a divulgação do último, Passos Coelho comprometeu-se publicamente a melhorá-lo. Mas faltou à palavra que empenhou e apresentou-se ao eleitorado com um programa escrito em eduquês corrente, com medidas até a 19 anos de prazo, pasme-se, (…)

Nuno Crato é um econometrista confesso, que repetidas e documentadas vezes confunde avaliação com classificação. Nuno Crato pensa que se mede a Educação como se pesam as batatas e que muda o sistema de ensino medindo e examinando. E não mudará. Ou muda ele ou não muda nada. (…)” (in: Público, 22/6/11)

Ó Diabo!…

A seita tem um radar…

Não passa despercebido o incómodo, ou o ruído, como designou a Fernanda neste comentário, à “onda do cratês”. Qualquer jargão é redutor e o seu uso sugere um posicionamento de partida que desconsidera o seu objecto. Quando classifico de cratês o modismo do rigor e da exigência não desqualifico o rigor e a exigência, e muito menos o sujeito Nuno Crato, mas antes quero desacreditar o modismo que lhe subjaz. Quero acreditar que Nuno Crato pensou o mesmo quando se referiu ao eduquês inventado por Marçal Grilo.

Dizia eu que o desconforto pelos seguidores mais próximos ou mais fiéis ao actual ministro da educação é risível porque assenta no falso pressuposto de que quem crítica ou suspeita da competência da equipa ministerial deseja o seu fracasso. O que seria o mesmo que dizer que quem critica a (in)acção sindical é anti-sindical… certo?

Para memória futura

“Um Governo firme no fortalecimento do Estado perante a intrusão de interesses privados, ou de clientelas partidárias e corporativas, nas decisões que dizem respeito a todos e que envolvem os recursos que são de todos.” (PPCoelho, discurso da tomada de posse)

E só bastava cumprir esta ambição para reerguer o Estado: Impedir que o Estado seja transformado em carcaça pelas clientelas partidárias e corporativas.

Estaremos despertos!…

O “cratês” de vento em popa

Estou seguro que o cratês vai fazer escola, do mesmo modo que o fogo se propaga em ramo seco, por duas razões:

1º porque o modelo de melhoria da qualidade educativa centrado nos aspectos organizacionais adoptado pelo anterior governo foi improfícuo e a ruptura com o passado suscita uma alteração de modelo – cuja centralidade são os resultados escolares;

2º porque há uma carência generalizada de reconhecimento profissional após um longo calvário de ostracização política e é humano, é compreensível, que o professorado adira à oratória da dignificação da função docente pela via do pretenso aumento do rigor. A ideia que passa é que agora é que a coisa vai ser a sério e que já podemos ser levados a sério… O desejo de mudança é tão forte e foi tão reprimido, que basta um enunciado de intenções e de ideias soltas reveladas em tertúlias, descomprometidas com um programa de governação, para que se reacenda a chama.

E quem sou eu para refrear os ânimos?…

Agora é de vez…

Li, sem surpresa, orgásticas declarações de apreço à escolha do novo ministro da educação. Afinal, a retórica do rigor e da exigência passa muito bem e qualquer professor ciente da sua excelência profissional, manifestada nos resultados dos seus alunos ou num autoconceito inchado, acolherá com entusiasmo quem, do alto da sua cátedra, sabe distinguir o ensino a sério do ensino faz-de-conta.

Finalmente, a escola faz-de-conta tem os seus dias contados! Agora sim: A excelência profissional terá um chão que medre (ou de merd@).

Aprende-se para os exames ou fazem-se exames para aprender?

Se há área do conhecimento onde me sinto confortável essa área é a do treino. E por que razão invoco um argumento de autoridade para me referir aos exames nacionais? Porque é possível estabelecer uma analogia entre o treino desportivo e o treino dos exames. Quem pensa que sabe alguma coisa do treino desportivo para crianças e jovens está seguro de que ele difere do treino dos adultos. Quer o treino, quer a competição (ela própria uma elemento a ter em conta no processo de treino), visam objectivos distintos quando se dirigem aos adultos. É recorrente dizer-se que as crianças e jovens competem para o treino enquanto os adultos treinam para as competições.

Do mesmo modo que as competições ocupam um lugar especial no processo de treino das crianças e jovens, na justa medida em que as competições não são um fim em si mesmo, os exames são, pela mesma ordem de razões, elementos coadjuvantes no processo de aprendizagem, nunca se constituindo um fim em si mesmo.

Isto vem a propósito do delírio causado pela defesa dos exames nacionais como panaceia para a melhoria das aprendizagens. O Ramiro considera que mais exames e mais testes intermédios suscitariam melhores resultados nos PISA. Seria um caso merecedor de estudo se assim não fosse. O problema não se coloca tanto ao nível dos efeitos do treino intensivo nos resultados competitivos de curto-prazo. O problema que deve merecer a reflexão de todos nós coloca-se ao nível das perdas que resultam da aplicação de um treino intensivo precoce. Como o tempo é finito e escasso quando se trata de suscitar o desenvolvimento integral das crianças e jovens, que capacidades deixam de ser estimuladas pelo facto de se reduzir o treino das inteligências ao treino das habilidades solicitadas por uma dada competição?

Enfeitar a montra das escolas…

É do senso comum saber que um projecto partilhado e assimilado por quem o implementa tem melhores condições de concretização quando comparado com um projecto análogo que seja imposto aos artesãos.

MLRodrigues nunca percebeu esta evidência quando impôs um modelo de ADD piramidal iníquo e inexequível. Isabel Alçada, não sei se terá sido bem aconselhada pelos seus acólitos de serviço ou se foi tocada num rasgo de acuidade, baixou a altura da pirâmide envolvendo milhares de relatores para que através desse compromisso partilhado minorassem as resistências internas dos “zecos” à aplicação do “monstro”.

Isto vem a propósito da aplicação do projecto de educação sexual que as escolas tentam concretizar por incumbência normativa. Não vão faltar relatórios cor-de-rosa e egos inchados por uma mão cheia de nada e outra cheia de coisa nenhuma.

Iceberg

Chegados ao final do ano lectivo, extremam-se as posições prós e contras exames nacionais. Como em quase tudo na vida, os extremos tocam-se também na falta de senso. Não serei a pessoa mais indicada para moralizar este debate porque as minhas posições são há muito conhecidas relativamente a esta matéria. Mas por falar em falta de senso, não resisto a apresentar duas propostas congruentes com a ideia de escola meritocrática que subjaz à defesa da avaliatite dos exames nacionais.

Apesar de reconhecer que os exames nacionais ou as provas públicas de âmbito nacional têm os seus benefícios, designadamente, nos processos de regulação do ensino (bem mais incisivos do que nos processos de regulação das aprendizagens), os danos manifestam-se ao nível da distorção das prioridades do ensino que ignora o que não é susceptível de ser avaliado em exame, isto é, os exames nacionais avaliam apenas a ponta do iceberg.

Como primeira proposta sugiro a renúncia de um sistema de avaliação contínua. Como não há forma de avaliar em exame nacional os aspectos de natureza sócio-afectiva e volitiva, deixemos a educação para as famílias e centremo-nos no que realmente interessa que são as aprendizagens nucleares definidas centralmente. As escolas deixarão de ter problemas com a disciplina porque serão as famílias ou instituições de acolhimento de crianças e jovens a quem caberá resolver estas questões.

Como consequência da proposta anterior emerge a segunda: Não havendo avaliação contínua não há necessidade de realizar qualquer avaliação formal intra-muros. Os professores serão libertos da função de classificadores, cessarão os juízos discricionários e as injustiças (de que se queixam os alunos e encarregados de educação) deixarão de se fazer sentir na escola. Ganham os professores, alunos e famílias.

Como centro de treino para os exames, ninguém terá pejo em defender uma escola verdadeiramente exclusiva que seleccione os mais dotados para a competição académica.

Ressacados e agarrados

Seis anos de diarreia legislativa deixam marcas. O organismo vivo que é a escola habitua-se, o corpo docente adapta-se, e a ressaca toma conta do ambiente quando um novo normativo tarda em aparecer.

É vê-los agarrados a reler decretos antigos, mas ainda actuais, revisitando normas bolorentas! Para os mais descompensados sugiro que se deixem entranhar no acervo

Boas leituras !Winking smile

Governo deposto, governo posto – Duas prioridades de curto-prazo para a educação.

Enquanto se ultimam os preparativos do novo governo e, fundamentalmente, das “novas” políticas, começa a especulação acerca dos titulares das pastas. Convém que a cara combine com a careta e que o responsável pela pasta se reveja no programa que ajudou a delinear ou, no mínimo, que o adopte como se fosse seu co-autor. Ficarei surpreendido, portanto, se Canavarro não for o nomeado para o cargo da educação não superior como recompensa pelos serviços prestados na elaboração do programa eleitoral.

É evidente que não é despiciendo saber se o titular da pasta tem competência política para o cargo e se é assertivo no modo como encara os problemas políticos. Já chega de imprudentes e aventureiros…

Além da incontornável questão da competência política, há que definir prioridades de curto prazo, depois de definidas as equipas de trabalho e demarcada a orgânica interna do ministério responsável pela pasta da educação. Elejo dois dossiers que, pelos efeitos que gerará nas escolas situadas, devem ocupar a atenção do próximo ministro da educação: a avaliação do desempenho docente e a gestão escolar. As escolas encontram-se há demasiado tempo em apneia; Urge libertar as escolas das amarras de procedimentos inócuos, redundantes e inconsequentes, que decorrem da aplicação do modelo de ADD; não se trata de encontrar apressadamente um modelo que sirva os propósitos a que se destina (continuo a considerar que é um erro com consequências desastrosas para a credibilidade dos professores a defesa de um modelo que não seja exclusivamente formativo) mas interromper definitivamente a farsa em que se transformou a ADD. Depois temos a organização taylorista da escola que atrofia as práticas colaborativas e fomenta todas as formas de balcanização. Há que devolver o protagonismo aos grupos de recrutamento; há que fazer do conselho pedagógico um órgão técnico-pedagógico cuja constituição deve ser vedada aos alunos, encarregados de educação e auxiliares da acção educativa; há que devolver a colegialidade às direcções executivas…

Porque não podemos perder mais tempo!

Uma noite para esquecer porque…

… estou pouco interessado nas análises políticas dos comentadores de serviço que em dia de eleições entretêm os eleitores. Qualquer pessoa informada sabe que esta vitória do PSD é, em primeiro lugar, a derrota do PS. O PSD ganhou as eleições porque o PS não as poderia ganhar. Não foi o projecto político do PSD, que a campanha não esclareceu; não foi o carisma do seu líder que cativou os eleitores; foi o demérito de JSócrates e a sua desastrosa governação, foi a inércia da sua corte de confrades acríticos que conduziu o PSD ao poder.

Mais importante do que saber qual a configuração cromática da nova maioria, importa conhecer o programa de governo e qual o alcance desse programa face ao acordo assinado com o triunvirato.

Ao contrário do que já me fizeram transparecer alguns colegas que nutriam um ódio visceral às políticas de JSócrates, não tenho motivos para festejar e, arrisco a dizê-lo, eles também não.

Um caso de justiça II

Há casos de justiça que nem ao diabo lembra. Um professor de Educação Física foi condenado ao pagamento de uma indemnização de 75.624 euros a uma aluna que sofreu lesões graves ao executar um salto mortal. Em nenhuma passagem do acórdão se regista qualquer circunstância atenuante ou agravante da pena pelo facto de se tratar de uma ocorrência num colégio privado. Salvo a devida distância da analogia, atente-se ao teor da notícia:

Psiquiatra acusado de violação suspenso por dois meses

[…] Como a relação sexual que manteve com a paciente aconteceu no seu consultório privado, a Inspecção-Geral das Actividades de Saúde (IGAS) não pôde ir mais longe: invocando o Estatuto Disciplinar dos Trabalhadores que Exercem Funções Públicas, decidiu agora suspendê-lo durante dois meses do Instituto da Droga e da Toxicodependência (IDT) do Porto, organismo público onde o médico trabalha.