Os influentes

As lutas pelo poder nas escolas nem sempre mitigam os interesses interesseiros. É um caldo de ascendências de onde emerge uma figura singular que encontra paralelismo nas Farpas do Eça sob o nome de influente.

“O influente ordinariamente é proprietário; (…) Na véspera de eleições todos o vêem montado na sua mula, pelos caminhos das freguesias, ou, nos dias de mercado, misturado entre os grupos: fala, gesticula, grita, tem pragas e anedotas. Dispõe de 200 ou 300 votos: são os seus criados de lavoura, os seus devedores, os seus empreiteiros, aqueles a quem livrou os filhos do recrutamento, a bolsa do aumento de décima, ou o corpo da cadeia. A autoridade acaricia o influente, passa-lhe a mão por cima do ombro, fala-lhe vagamente no hábito de Cristo. Tudo o que ele pede é satisfeito, tudo o que ele lembra é realizado. As leis curvam-se, ou afastam-se para ele passar. As suas fazendas não são colectadas à justa: é o influente! Os criminosos por quem ele pede são absolvidos: é o influente! (…)”

O influente quer crer que faz parte de uma espécie de casta superior só porque se move na penumbra dos poderes instituídos; é um verdadeiro peão de brega.

Este “cromo do ensino” é inteligível a partir de um quadro de referência que inverte a lógica de serviço público. É a cultura da cunha em todo o seu esplendor. Os influentes não desejam equidade, prescindem da liberdade intelectual e receiam a perda de confiança do poder que ajudaram a conquistar. Alguns desaparecem das salas de professores quando são desmascarados. Através de um pacto de regime, silencioso ou declarado, o clube dos influentes congrega vários tipos de docentes. Amortecem as críticas, impulsionam a intriga para tomar o pulso da contestação e impedem a inovação. Rejeitam a mudança, sobretudo, a que suscitar a modificação do modus vivendi instalado.

Há vários tipos de influentes e agregam-se numa oligarquia:

Os irritados criticam as pequenas falhas de organização, são intolerantes com os alunos e colegas, principalmente, com os mais novos. Creem na sua coragem consubstanciada numa crítica ligeira, disfarçada, que ninguém leva a sério.

Os trabalhadores andam sempre atarefados, azedos e nunca erram. Isto é, raramente assumem o erro, o engano, o descuido, a falha. São os super profissionais.

Os calados não têm opinião, apresentam-se descomprometidos com a escola. São insuspeitos, são os desejados porque não “complicam”. São os ouvidos que as paredes escondem.

Os estrategas preocupam-se com o clima da escola e com as pessoas, mas o que lhes realmente lhes interessa é a conjuntura. Se pressentem sinais de um eventual contrapoder tornam-se visíveis, atuam concertadamente e, com muita facilidade, mobilizam um batalhão de fiéis seguidores. São implacáveis na retaliação.

Os anónimos diferem dos calados porque não têm a capacidade de discernir o seu grau de influência. Fazem o que for preciso para subir na escala de influência.

Raramente os influentes aparecem no seu estado puro; São híbridos e multifacetados. São os videirinhos!

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(reedição com pequenos arranjos na redação (14/1/2004)

Poesia aplicada…

perrenoudPerrenoud será sempre uma referência incontornável da nossa vida escolar, ou não fosse o autor um guru do nosso referencial externo no processo de autoavaliação. Percorrer os textos de Perrenoud e imaginar a escola situada é um exercício poético imperdível, digo eu que não tenho qualquer sensibilidade poética.

Um dos livrinhos do autor que é de leitura obrigatória para quem ousa promover a mudança, a reforma, ou, não sendo o caso de mudar porque se quer crer que está tudo bem, manter as práticas pedagógicas diferenciadas e ativas, data de 2002 na sua versão portuguesa. A capa desse “guia de boas práticas” (para quem o quiser adquirir encontra-o num canto esquecido de uma livraria com saída) ilustra este pequeno apontamento.

Diz o autor que “O sistema educativo é ingovernável sem a adesão de, pelo menos, uma parte dos professores e dos utentes, pais e alunos”; que “Nas sociedades desenvolvidas, os poderes organizadores e o establishment político começam a compreender que não vale a pena tentar “domar” os professores”; que “a ausência de negociação não bloqueia, portanto, constantemente, as decisões, mas acaba sempre por as esvaziar do seu sentido…”. Perrenoud quer enfatizar a necessidade de uma pilotagem negociada da mudança. E uma verdadeira instância de pilotagem de uma mudança na escola situada consiste em ultrapassar as clivagens e os regateios habituais, para adotar uma visão coletiva.

Percebem agora porque considero que imaginar as ideias de Perrenoud aplicadas à escola situada pode constituir um exercício poético imperdível e… hilariante?

Já agora: ampliem a imagem e leiam tudo, porque vale a pena!

Normativite

Numa ação dirigida às lideranças intermédias no âmbito de um processo de autoavaliação das escolas do agrupamento (algo que não deve ser confundido com o processo de autoavaliação do agrupamento de escolas), o investigador convidado que dirigia os trabalhos alinhava o seu pensamento com as ideias de Perrenoud, sociólogo e professor na Universidade de Genebra, autor de uma vasta obra na formação de professores. Para os mais familiarizados com o linguajar “gestionário”, Perrenoud é um dos referentes externos do nosso referencial. Para os menos familiarizados com esse linguajar, Perrenoud será um dos nossos gurus, não só da avaliação dos resultados escolares como da avaliação de outras áreas a avaliar. Para o bem e para o mal!

Muito haveria a dizer sobre o pensamento de Perrenoud e mais ainda sobre os perigos de se treslerem as ideias de autores de referência (quem não se lembra do caso do escritor Nuno Crato ter treslido Rousseau?)…. mas não temos tempo.

O que diria Perrenoud se fosse convocado para a “discussão pública” desenhada em torno de um documento estruturante, como é o caso do regulamento interno, “estrangulado” por uma resma de documentos reguladores?

Diria, muito provavelmente: “… que uma parte do problema da escola não reside nas suas intenções, mas na maneira como ela organiza o trabalho, como perde tempo e energia no prosseguimento de objetivos sem grande importância, na sua falta de continuidade no tratamento dos problemas.” (Perrenoud, 2002)

O pensamento de Perrenoud, no que diz respeito ao peso burocrático que afeta a escola e extenua os professores, não podia ser tão desafiante e tão contundente face às rotinas instaladas.

Os megas situados – Entre o anacrónico e o paroquial!

Ainda é cedo para formular um juízo situado sobre os problemas que decorrem da agregação que “vitimou” a minha escola. A notícia e os testemunhos que surgem nesta pequena janela do DN (que roubei descaradamente ao Arlindo) remetem-nos para questões materiais, não direi que são despiciendas porque a degradação das condições salariais dos professores configura um roubo de igreja, e quase que deixam escapar outros sinais que atestam a transformação das escolas… para pior:

É anacrónico o modo como a informação encrava quando deveria ser processada mais rapidamente, ou não estivéssemos no tempo da velocidade, dos bites e dos bytes (é o tempo do bitaite!);

É daltónica a cultura visual, instantânea, marcada pela superficialidade, como se se ousasse substituir a reflexão aturada e o debate público rigoroso;

É paradoxal a tentativa de centralizar a gestão quando as boas práticas aconselham a descentralização das decisões e das lideranças;

É irónico que as estruturas organizacionais mais planas sejam amarfanhadas num controlo hierárquico dissimulado.

Há quem os designe de equívocos “pós-modernistas” gestionários. Eu chamo-lhe apenas paroquialismo!

Mais proximidade, mais acompanhamento, mais exigência…

A competição é intrinsecamente positiva e a participação em atividades competitivas cria oportunidades do desenvolvimento de competências, na procura da excelência e da superação. Nem todos os adultos que acompanham as competições dos mais jovens percebem as diferenças conceptuais entre a competição dos adultos e a competição dos mais jovens. Um breve percurso pela investigação permite-nos encontrar sinais que comprovam a ideia de que, também no desporto, as crianças e jovens não são adultos em miniatura.

Sem pretender ser muito exaustivo, porque este espaço é meramente opinativo, vejamos o que defendem alguns autores de referência nesta área do conhecimento:

“No desporto de alto rendimento a competição é o quadro de referência para a organização do treino; no desporto de crianças e pubescentes, a competição deve constituir uma extensão e complemento do treino” (Marques, 1999: 26). As competições devem servir os propósitos da formação, e por isso, devem estar ligados não só no plano organizativo, como nos conteúdos (Weineck, 1983).

As competições devem ser encaradas numa óptica de progressão, mesmo num quadro que visa a preparação de atletas para o alto nível. Nas primeiras fases, o divertimento e o prazer são os objectivos primeiros, existindo de seguida uma evolução posterior até se chegar às competições olímpicas (Bompa, 2000).

Se as alterações na estrutura e regulamentos das competições começam a deixar de gerar resistências por parte dos responsáveis pelas actividades físicas dos mais jovens, a alteração do conteúdo das competições já é defendida por um número crescente de especialistas (Rost, 2000; Lima, 2000).

O que se pretende é introduzir alterações na competição de forma a torná-la mais adequada aos objectivos de formação: por um lado, contribuindo para o desenvolvimento da multilateralidade, não só uma multilateralidade geral – competições múltiplas (Rost, 2000) – como uma multilateralidade específica – adequada às necessidades de cada desporto (Marques, 1997); e por outro lado, estimular o desenvolvimento de pressupostos de prestação que já são treináveis, nas primeiras fases da preparação desportiva – desenvolvendo preferencialmente os pressupostos coordenativos. Uma questão que terá de ser equacionada, quando se sugere a alteração da competição dos mais jovens é o problema dos escalões competitivos, organizados em função da idade cronológica.

Etc, etc…

Se a competição desportiva e o sistema de treino devem ser diferentes quer se trate do desporto de crianças e jovens ou desporto para os adultos, também devia ser diferente o modo e as expectativas dos pais, dirigentes e treinadores sobre o valor dos resultados desportivos na competição dos mais novos.

Ora, malogradamente, na realidade sobram os exemplos de má formação desportiva daqueles que têm a responsabilidade de acompanhar os mais novos. Num quadro de ajustamento das responsabilidades, sou muito mais complacente com a atitude errática de pais desportivamente analfabetos do que com a atitude irresponsável de dirigentes e treinadores que se projetam nos resultados desportivos dos mais jovens para suprir os seus próprios recalcamentos.

Só o acompanhamento de proximidade permite que os pais mais informados compensem desvarios dos agentes desportivos que acompanham o desporto dos filhos. Se nenhum encarregado de educação está obrigado (a não ser que se trate de um profissional da área) a aferir se os técnicos e dirigentes que acompanham os mais novos dominam a matéria técnico-pedagógica do desporto que ensinam; todos os encarregados de educação devem ser exigentes e inflexíveis quanto ao incumprimento de regras que ofendem a dignidade da pessoa. Aqui não há desculpa!

Com papas e bolos se enganam os tolos

Não foi por obra do acaso que o país chegou onde chegou. Foi necessário conjugar vários elementos perversos para a saúde da nossa democracia: irresponsabilidade política de inúmeros oportunistas, videirinhos que tomaram de assalto lugares de comando do Estado; inércia abstencionista de milhares de eleitores que deixam terreno fértil para a aberração democrática designada por “partidos do arco do poder”; conivência da comunicação social, em muitos casos acéfala, que por manifesta incompetência parece mais vocacionada para propagandear o poder hegemónico do que para desconstruir os factos políticos, garantindo o mesmo espaço mediático ao contraditório.

E mais grave do que não abrir um espaço para o contraditório é ocupar esse espaço com uma metamorfose da propaganda oficial travestida de contraditório. A opinião de Maria de Lurdes Rodrigues, só para dar um exemplo, é em termos conceptuais a opinião do atual ministro da educação: são econometristas da educação e acreditam cegamente de que é possível melhorar a qualidade do serviço educativo sem contar com os professores. No fundo, fazem parte da mesma família política, a família de “partidos políticos do arco do poder” que nos conduziu ao ponto onde nos encontramos!

Com papas e bolos se enganam os tolos.

Não se trata de uma refundação. É mais uma reestruturação… ou uma reculturação :)


Recomendação do Conselho Nacional de Educação

Mega-agrupamentos” fragilizam” autonomia das escolas

(…) No documento, a que o PÚBLICO teve acesso, e que aguarda ainda publicação em Diário da República, o CNE constata que a recente criação dos chamados mega-agrupamentos “tem vindo a criar problemas novos onde eles não existiam”.

São exemplo o “reforço da centralização burocrática dentro dos agrupamentos, o aumento do fosso entre quem decide e os problemas concretos a reclamar decisão” ou a “sobrevalorização da gestão administrativa face à gestão autónoma das vertentes pedagógicas”.

Ao ser desafiado por um colega a reanimar este cantinho, não podia escrever sobre outro tema: É que as culturas profissionais estão na ordem do dia, pelas piores razões.

Para quem acredita, como é o meu caso, que as culturas profissionais de colaboração, designadamente as culturas de colaboração que não dividem (não é o caso dos vários tipos de balcanização), mitigam alguns dos efeitos da intensificação do trabalho docente, não tem sido fácil encontrar terreno fértil na escola situada para deixar germinar algumas dessas sementes.

Elejo duas razões, embora existam inúmeras causas para a cultura do individualismo, que justificam o quadro descrito:

1ª Porque há sentimentos de culpa recalcados pelas dificuldades de lidar com a falta de tempo e pela sobrecarga de trabalho que conduzem muitos professores ao isolamento;

2ª Porque os padrões de sucesso da resistência dos professores contra as hostilidades do MEC estão orientados exclusivamente para os resultados imediatos, quando deviam orientar-se fundamentalmente para os processos.

Não se vislumbrando sinais de melhoria nas condições de trabalho, nem sendo expectável a alteração súbita da perceção de sucesso dos professores nas suas lutas contra a tutela, a solução contra esse isolamento perverso depende da criação de pequenas comunidades docentes que lutam nas escolas situadas pelo reforço do poder discricionário dos professores em certos domínios, cedendo o poder a outros parceiros em outros domínios, se necessário for, de modo a garantir a centralidade do pedagógico sobre o administrativo.

Manual de sobrevivência…

Fiquei indignado quando li um documento emanado do MEC explicando aos professores como se dirige uma reunião de trabalho entre pares. Foi uma espécie de manual para totós que supostamente pretendia minimizar os efeitos da intensificação do trabalho docente que surgiu animado pela avaliatite. Era um tempo em que recusava a ideia de que os professores devessem ser tratados como meros operários da educação, porque não eram acéfalos, porque eram intelectuais livres do pensamento. Aquilo era um manual para diretores de turma, delegados de grupo e coordenadores excessivamente zelosos que esticavam as reuniões até ao limite da paciência de um santo. A ideia do MEC seria o combate ao formalismo e ao esquematismo que faziam escola nesse tempo mas que ainda não desapareceram das práticas de alguns professores.

Hoje ficaria menos indignado!…

Mudam-se os tempos…

Crise de identidades

Confesso que já passei por melhores momentos na profissão. Já vivi momentos profissionais mais estimulantes, quiçá de maior risco, ou por via do maior risco.

É bem provável que este estado provavelmente transitório coincida com uma alteração de identidade profissional. Quero com isto significar que o modo como sinto a minha identidade é o resultado como a defino pela mente, coração e corpo. Ora, as circunstâncias profissionais, determinadas por uma amálgama da cultura, da biografia pessoal, da influência social e dos valores institucionais, podem mudar. E podem mudar com as emoções. E podem mudar mudando os eus subjetivos que emergem com as histórias pessoais e sociais, com os papéis atuais, com as crenças e descrenças, com os valores, acerca do tipo de professor que esperamos ser.

Não, não se trata de uma desesperança assumida. Trata-se de sinal de situação!

Eles comem tudo!…

A partidarização do Estado só podia conduzir à falência do estado social. Logo que amarfanham o poder, os partidos políticos ocupam todas as estruturas de chefia como quem se movimenta na sua própria coutada. A consequência é o macabro definhamento do Estado.

Imunizar o Estado à voracidade dos partidos políticos seria a Reforma do Estado que urge fazer, mas que nenhum partido político do arco do poder se atreve a iniciar.

Isto vem a propósito deste episódio relatado pelo Manel.

Política da terra queimada

No final da manhã acompanhei parte do programa opinião pública da SIC onde foi abordado o tema educação alimentar. Tirei duas breves notas:

1. Foi evidente o desconforto do convidado, um técnico nutricionista do MEC, quando interpelado com questões relacionadas com a Educação Física e Desporto Escolar. Fiquei com a ideia de que há uma guerra de tipo paroquial entre gabinetes do MEC, guerra essa que justificará parte das imbecilidades que o MEC vai impondo às escolas, em busca de um protagonismo estéril de uns sobre os outros.

2. Está a ser congeminado um programa de atividade física informal para o 2º ciclo. Informal? Valha-me Deus!

Farol

António Nóvoa foi entrevistado na RTP em horário nobre.

Não acredito que fizesse rebentar as audiências porque a concorrência das futilidades é imbatível. Mas tenho a certeza que o seu discurso não caiu em saco roto.

Que raciocínio límpido e escorreito; que frontalidade e honestidade intelectual; que convicção e esperança no futuro!

Não sei se foi capaz de inspirar algum político do centrão… provavelmente nenhum se sentirá livre para o reconhecer em público.

Sei que a narrativa de António Nóvoa é herética e funciona como um farol!

Desvalorização do saber – Paradoxos

Lisboa, 29 ago (Lusa) – O Ministério da Educação admitiu hoje estar a preparar novas ofertas de ensino, entre as quais cursos de ensino vocacional, que poderão ser frequentados por opção, dos alunos ou encarregados de educação, ou como resultado do desempenho escolar.
Ler mais: http://visao.sapo.pt/educacao-governo-prepara-novos-cursos-de-ensino-vocacional-para-dar-mais-oportunidades-a-alunos=f683336#ixzz24vkPaV8d

É intolerável o modo como o governo e o seu MEC trata as disciplinas “não fundamentais”, os cursos profissionais como segunda oportunidade, a escola dos coitadinhos, só justificável à luz de uma visão reacionária de educação.

Atentem ao paradoxo da eficiência e do rigor, que nos é relembrado todos os dias: por que são anunciados novos cursos vocacionais a 15 dias do início do ano escolar? De que serve um anúncio tão precoce? Ou será que estão a pensar implementar estas novas experiências já este ano letivo, depois das turmas constituídas?

Mas o que é grave é o facto de não existir uma estratégia de valorização do saber ao longo da vida. Como se o saber profissional dispensasse uma atitude permanente de valorização do conhecimento.

Participação portuguesa nos Jogos Olímpicos – Mais do mesmo

Os Jogos ainda agora começaram, há atletas que ainda não participaram nas suas competições, e os resultados alcançados e a alcançar irão suscitar discussões acerca do programa de desenvolvimento desportivo do país.

Face ao desinvestimento do governo no desporto escolar e na educação física (embora os burocratas insistam que se mantêm a regulamentação do deporto escolar e os créditos horários adstritos aos professores com grupos/equipas, convém esclarecer que essa mesma regulamentação impede a criação de novos grupos/equipas não satisfazendo as necessidades de prática para os alunos que mudam de escola ou de ciclo se na “nova” escola não existir oferta.), aumentaram as dificuldades de complementaridade entre os subsistemas escolar e federado. Dito de modo mais simplista, a escola e o clube desportivo (onde se promove o desporto da elite) não só estão de costas voltadas como se afastaram ainda mais.

Ainda é cedo para balanços, mas seria desejável que a discussão (que não deve ser lamechas pelos previsíveis maus resultados) sobre o desporto português considerasse os três objetivos para os programas de desporto juvenil: o objetivo educativo, o objetivo da saúde pública e o objetivo do desenvolvimento da elite. Há um quarto objetivo que, sendo menos aparente, não é menos importante: preservar, proteger, e realçar práticas do desporto.

Veremos como os comentadores televisivos multifacetados e os especialistas do regime abordam o problema e, mais importante, que soluções preconizam.

Espero, sentado, para ver…

Daltonismo cultural – uma consequência do “cratês”

No final do campo de férias, antes de recolher a miudagem, houve um breve período de reflexão. Pais e filhos, em pequenos grupos, revelam perceções: sobre o meio social e comunitário em que nos movemos; sobre as diversas representações de juventude. Tudo muito bem planeado pelos organizadores, com um guião simples mas que permitiu observar a pluralidade das representações de cada um dos participantes…

Depois foi necessário encontrar um porta-voz de cada grupo para, em plenário, revelar os consensos possíveis, o que não foi conseguido na medida em que, por falta de experiência ou por narcisismo, os representantes na maior parte dos casos representaram-se.

Das reflexões transmitidas foi possível perceber uma colagem aos discursos hegemónicos veiculados pelos fazedores de opinião, reveladores de um certo determinismo social – A sociedade carece de sujeitos competitivos, porque as oportunidades de sucesso são escassas e só premiarão alguns, poucos, diziam os mais entusiastas. Dirigindo-se para a miudagem adolescente, apelavam: “têm de estudar para vencer!…”.

É fácil de perceber que o cratês vai fazendo o seu caminho à custa da ausência de questionamento sobre o lugar que cada um quer ocupar no mundo e, fundamentalmente, sobre que mundo urge construir. A cultura de massas terá mesmo vencido, como afirma Clara Ferreira Alves (neste texto que surripiei ao Paulo). Porque bastaria que algum dos oradores colocasse a hipótese, vá lá, do absurdo, que o seu rebento ficará do lado dos perdedores.

Por que vale a pena lutar?

Michael Fullan e Andy Hargreaves, fizeram publicar em 1991, no Canadá, um texto que ainda considero atual. Por que vale a pena lutar? aclara o modo como podemos transformar as escolas em lugares atrativos  e gratificantes e aborda as formas de introduzir alterações significativas  na vida quotidiana e na experiência de cada vez mais docentes, diretores de escolas e alunos.

Havia muito a dizer sobre o livro e, fundamentalmente, sobre as questões que ele suscita. Quem o leu sabe bem do que falo e para quem não o leu aconselho vivamente a leitura, até porque não pretendo reduzir e empobrecer o seu conteúdo a meia dúzia de linhas soltas.

Hoje, as circunstâncias que marcam o nosso quotidiano são extremamente conflituantes e potencialmente tensas. Há dois tipos de exaustão que, nas palavras dos autores, provoca efeitos opostos nos professores: o primeiro decorre das batalhas solitárias, dos esforços não reconhecidos, da perda de terreno e de um sentimento crescente e corrosivo de impotência; o outro tem a ver com aquela espécie de cansaço total que acompanha o trabalho duro enquanto membro de uma equipa, um reconhecimento crescente de que se está envolvido numa luta que vale a pena travar e de que aquilo que se está a fazer tem um efeito crítico junto de uma criança ou de um colega desanimado. Com o tempo, o primeiro tipo de exaustão faz sentir os seus efeitos sobre a motivação do docente mais entusiasta; o segundo tem a sua própria reserva interna que nos permite recuperar após uma boa noite de sono. Na realidade o primeiro tipo provoca ansiedade e insónias, enquanto o segundo induz o descanso e a regeneração das energias.

Pergunta retórica: será o nosso dispêndio de esforço inglório ou vantajoso?

Dependerá de cada um de nós, embora a solução não dependa exclusivamente de nós. São os indivíduos e pequenos grupos de professores e de diretores que terão de criar as culturas profissionais que desejam.

Ora, quem lê criticamente as caixas de comentários dos blogues mais frequentados, quem for capaz de observar com distanciamento as lutas inter geracionais de docentes de teor autofágico, percebe que nós temos a solução, que nós somos a solução!

Sem esta consciência de classe, sem entendermos que este é o ponto de partida, não há plano de ação que nos valha, por mais assertivo que ele nos pareça.

Carta PESSOAL do Presidente da APEF – Foztejo ao Ministro da Educação e Ciência

Exmº Sr Ministro da Educação e Ciência

A Luta pela posse de uma Bola

Pensei traduzir a minha indignação, relativamente à alteração curricular que Vª Exª propõe, mas confesso que a emoção foi tal que tive de esperar algum tempo para, após fazer algumas inspirações com profundidade, saber como o havia de fazer.

Imagine que tenho um filho, ou Vª Exª tem um filho por exemplo, e questiono-me como é que o devo educar. Naturalmente, a minha preocupação começa por contextualizar um desenvolvimento infantil baseado numa boa alimentação e no conforto de um envolvimento afectivo familiar (preferencialmente, no mínimo Pai e Mãe). Eu percebo e sei, que tal não é possível para todas as pessoas. Uns porque têm que bulir, sujeitos às necessidades de sobrevivência, outros porque colocam a sua carreira profissional à frente de tudo, primeiro a carreira depois os filhos e ainda outros por ganância de dinheiro ou de poder, aspectos essenciais para lhes alimentar o ego. Encostam-se aqui e ali, juntando-se a outros com os mesmos objectivos e vão constituindo “lobbies” de poder. Ora bem, todos sabemos que, nos primeiros anos de vida, é fundamental e importante garantir à criança um desenvolvimento equilibrado. Não é necessário tirar uma licenciatura nos EUA. Qualquer Faculdade, mesmo essas muitas dezenas instaladas há uns anos atrás, sabe-se lá com que objectivo, explicam isso. Penso que o referido objectivo foi para valorizar o ensino e a formação das populações, ou de alguma população. O crescimento deve acompanhar um bom desenvolvimento. A qualidade dos estímulos a que sujeitamos a criança é fundamental. O crescimento é-nos garantido por condições saudáveis de vida. Se a genética não nos pregar nenhuma partida, uma boa alimentação, afecto, equilibrado, e um funcional enquadramento familiar, multidisciplinar, social e cultural, são aspectos fundamentais a considerar. Podemo-nos questionar o que é um bom desenvolvimento. Este baseia-se, naturalmente, na particularidade dos estímulos. Começa aqui a nossa discordância. Apercebo-me que para si, os factores cognitivos são os essenciais. Vª Exª é um homem do pensamento. Do pensamento abstracto. Da criatividade, do intelecto. Como se isso fosse um exclusivo da teoria. Esquece aspectos endógenos como os idiossincrásicos. Vª Exª está a ver!? Não pode, nem deve, ignorar o corpo. É ele que o acompanha desde o primeiro dia. Aquele que quando não está bem, transmite sintomas que o fazem, preocupado ou assustado, recorrer ao médico. Aquele que irá ficar consigo até aos seus últimos dias, quer saiba muita matemática, muitas línguas ou não. Isto é, independentemente, das suas potencialidades intelectuais, das suas competências, dos seus conhecimentos, tem que carregar com ele. Estamos perante uma realidade universal. Aquele corpo onde se dão as reacções químicas que sustentam a vida. Sim, porque é da vida que estamos a versar. Aquele corpo que o olha reflectido no espelho. Que lhe alimenta o ego. Que fomenta a vaidade. Que expõe o narcisismo que há dentro de cada um. Que na intimidade promove um diálogo permanente, nem sempre pacífico, com o espírito. Como nos diz André Giordan “O meu corpo, a primeira maravilha do mundo”. Vª Exª vê, já estamos a misturar as coisas. Coisas do corpo, da sua química e coisas da psique, do pensamento. Pois é, eu cá no velho e histórico Portugal, estudei que nós somos uma unidade. Nos EUA não sei, nunca lá fui. Daí que eu conceba um desenvolvimento harmonioso, nomeadamente na população infanto-juvenil, considerando essencialmente, a unidade das áreas, da relação afectiva, cognitiva e motora. Não é por acaso, que por exemplo, a (OMS – Organização Mundial de Saúde), no combate ao sedentarismo, propõe um reforço da actividade física na formação geral nos currículos académicos. Desculpe Vª Exª a audácia e o confronto. Não quero ferir susceptibilidades nem sensibilidades. Parece-me que estamos a amarrar os miúdos às carteiras, com a ergonomia que se lhe reconhece, (muitos miúdos, devido aos “trocos”) e dar-lhes mais do mesmo, conceitos, fundamentalmente teóricos, independentemente dos ritmos de aprendizagem e dos níveis de concentração, até eles se saturarem… ou adormecerem. Atrás do bocejo, vem sonolência, a desconcentração, promovendo assim o abandono. Desculpe, Vª Exª., mas não previu sequer no tempo de aula curricular o tempo para os sentar (aos trinta). Desculpe… é o meu sentido pragmático de analisar as coisas. Não ligue. Sabe, Vª EXª, desde Abril de 74 já tivemos, sentados no seu cadeirão, alguns trinta e quatro ministros, e todos a pôr a mão na legislação. Não hão-de os professores a estar confundidos e, naturalmente a cair na psiquiatria. Voltemos ao hipotético filho.

Ora, a criança expressa-se e desenvolve-se significativamente, na sua unidade, pelo movimento. Sobe, desce, empurra, salta, cai, corre, atira, agarra, equilibra-se, etc.. Atenção, não nos vamos esquecer aqui, dos protegidos, dos “arrumadinhos” que estão sempre fechados e privados, não só do convívio em interacção com o outro, mas também, de se exporem e expressarem através de actividades práticas promotoras de desenvolvimento activo. Está a ver Vª Exª como se começam a imprimir modelos de vida, virados para a actividade ou para o sedentarismo. Isto numa fase do desenvolvimento de significativa dependência. Ora, como parece que somos seres inteligentes, é fácil perceber o que é mais saudável. Não nos podemos esquecer que aquelas crianças que estão fechadas, a família mais próxima que têm é, normalmente, a televisão, com os seus efeitos subliminares neuromusculares (Derrick de Kerckhove, em “A pele da cultura”, estuda isto), depois a televisão e as playstation e, mais tarde, a televisão, as playstation e os computadores. Digo família porque eles passam mais tempo sossegadinhos com estes aparelhos, do que com qualquer elemento da família. Certos pais dizem com orgulho que “_ O meu menino não quer sair de casa” (“está domesticado”). Quando eles vivem a complexa ruptura do abandono da infância, na adolescência, os pais dizem-nos, “_Gostava que ele praticasse algum desporto, mas ele não quer. Não sei o que hei-de fazer dele.” Desde cedo é a publicidade através de filmes coloridos, bem musicados, movimentados, curtos, variados e com a promessa de uma oferta, a estimular o imaginário (e o consumo), que prende os mais novos. As mamãs para eles estarem mais sossegadinhos ainda, até os põem em frente à televisão. Não sei, na minha ignorância, até que ponto começam aqui a ficar referenciados os níveis de concentração das crianças. Os rapazes do Marketing sabem isso e agradecem. É necessário segurar estes potenciais consumidores. Depois da fase publicitária proporcionam-lhes o convívio com desenhos animados. Estes, os desenhos animados, vão acompanhá-los, alternando com os jogos informáticos, até à idade adulta, e continuam no decorrer desta. Pois, diariamente, podemos usufruir de desenhos animados e jogos para adultos. Começa-se com “A Branca de neve e os sete anões” e viaja-se até aos “Simpsons” ou “Family Guy”. Enfim há que infantilizar. Quanto mais infantis, quanto menos crescerem, mais condicionados às referências dos primeiros anos e mais consumistas. Talvez seja oportuna uma leitura a “Consumed – How markets corrupt children, infantilize adults, and swallow citizens whole” de Benjamin R. Barber. Isto claro para ler nas férias numa esplanada à beira mar. Até está em versão “amaricano”. Chomsky chama-lhe «a fabricação do consentimento». Temos ainda aqueles pais, que para compensarem a sua ausência familiar reforçam esta situação com ofertas destes equipamentos. E… atenção, quanto mais caro melhor. Mais compensações afectivas. Mais ganhos afectivos. Julgam eles. Estou a lembrar-me, o que lhe recomendo, do filme português “Adeus Pai”. E eu penso, tenho que libertar o meu filho desta imposição, deste padrão de vida implantado, desta formatação de sujeito. Exmº Sr Ministro veja bem a aberração que não é, darmos a liberdade de movimento que a idade infantil sugere e impõe, potencializar esta motivação que a criança tem para brincar, interagir, explorar e descobrir. Veja bem a aberração que é estruturar situações práticas, com segurança, no contexto da aula, situações estas de grande envolvimento, onde o corpo, na sua unidade, é o objecto de aprendizagem. Promover actividade física com significado. Desafiando a criança a novas aquisições. De superação individual. Com esforço. Atenção, digo com esforço físico e intelectual. Em grupo, onde a criança se expõe e interage, adquirindo novas amizades e, simultaneamente, evoluindo da dependência para a independência. Aprende a confrontar os amigos na posição de adversários e a aceitar isso como natural. É aqui que se promovem correctas atitudes e aquisição de valores, de compromisso e de dever, de obrigação e de reforço das atitudes volitivas. Será isto socialização, prática, experimentada e vivida? Palermices, não ligue. Não terão os pais, os encarregados de educação e a sociedade, o compromisso de proteger e defender a formação e o desenvolvimento multifacetado da personalidade das suas crianças? Estamos perante uma proposta cultural de desenvolvimento, de complexidade progressiva, baseada em acções motoras fundamentais, tal como prevêm e sugerem os PROGRAMAS de EDUCAÇÃO FÍSICA. Sim, porque existem os programas. Aprovados pelo Ministério e concebidos para determinada carga horária semanal. Talvez o Exmº Sr Ministro ignore a sua existência, ou não queira olhar porque o fundamental agora sejam os tais “trocos”. Mas eles existem, há já largos anos, organizados por objectivos gerais e específicos, considerando as capacidades, as atitudes e valores e, ainda imagine, as competências. Veja só, já enquadrava as capacidades de realização por integração de competências. Como Vª Exª pode verificar trata-se dum conjunto de asneiras, mas existem uns visionários, inteligentes, que se propõem já tratar desta situação, rever os currículos e ignorar isto da Educação Física, senão os miúdos não aprendem a contar, escrever e a ler e, ainda assim, podem-se poupar as referidas “massas”. É aqui que lamentavelmente, nutro alguma tristeza pelo significativo esforço, em vão, de alguns intelectuais, nomeadamente Fernando Savater, Edgar Morin, e quantos outros.

Repare Vª Exª que os programas se enquadram numa lógica de verticalidade e horizontalidade, de objectivos, conteúdos e avaliação de competências, desde o Pré Primário ao Secundário. Isto está tudo bem “armadilhado”. Olhe, se Vª Exª estivesse distraído!? Veja só Vª Exª o que eles propõem ainda. Oportunistas como são, enquadrados de acordo com uma lógica cultural de desenvolvimento, e tirando partido da significativa motivação dos alunos para a prática da disciplina (não podemos ignorar a satisfação e gratificação das crianças e jovens na realização das aulas de EF) insistem em continuar a promover os tais estímulos em qualidade, aumentando assim, a rede neurónia, dado que o cérebro continua a crescer e a desenvolver-se. Já viu Vª EXª o que é sujeitar um filho a situações de confronto controlado, de interacção, de cooperação, promovendo o espírito de grupo e equipa? Está mal!? E depois obrigar os miúdos a respeitarem-se, a respeitarem os outros quer como colegas de equipa, quer como adversários, a respeitar o Professor (a instituição), a respeitar as regras e normas? Está mal!? Sujeitar os miúdos a situações de superação individual, a aprender a lidar com a frustração, a promover o espírito de sacrifício, a consolidar aprendizagens e evoluir para novas aprendizagens? Ensiná-los a lutar pelos seus objectivos, de acordo com os objectivos propostos para aquisição de novas competências, cada vez mais exigentes e complexas? Ensiná-los a exporem-se na tentativa de execuções nas situações de aprendizagem, a reforçarem a sua inclusão, a admitirem o erro como um desafio para novas superações, a envolverem-se na estratégia de grupo, a desenvolverem o sentido crítico perante as estratégias utilizadas?

A luta pela posse de uma bola.

Mas, depois, temos o problema deles suarem. Pois é, já me esquecia desse pormenor. Tudo isto está mal!? Eles escolhem, gritam, riem-se, choram, abraçam-se e, veja Vª Exª, que até se emocionam! Emoção. Quantas aulas de outras disciplinas a promovem?? Eu sei que isto não acontece na matemática ou no Português. Não há cá “abraçinhos“ nem as típicas manifestações “Olé, Olé, Olá” quando acertam um problema. Mas um golo, um cesto, merece individual e colectivamente a emoção do grupo. E, para chegar lá, o cérebro tem que pensar, rápido, em pressão, como deve executar ou como deve movimentar-se no espaço perante os outros, equipa e adversários, de acordo com a actividade padronizada proposta, para ser eficaz. E isto vale a emoção dum abraço, que alimenta a unidade do grupo, quer no contexto de aula, quer fora do contexto de aula. Promove ainda um clima escolar facilitador das aprendizagens e, consequentemente, evita o abandono escolar. Já viu Vª Exª, o micro social, grupos, equipas, regras, normas, árbitros, disciplina, luta, empenho, esforço, estratégia, compromisso que um simples jogo representa em termos de amostra para o macro social? Com a vantagem de não ser simulado, é mesmo vivido e integrado. Repare Vª Exª, a aula acabou, eles dizem “_Já!? Oh professor, deixe-nos ficar mais um pouco”. Repare Vª Exª, no recreio eles correm todos para a biblioteca para fazer exercícios de matemática e estudar outros conteúdos. Vá Vª Exª a uma escola e veja por si. São os jogos que os motivam. Estão a treinar. A repetir os conteúdos de EF. Vª Exª já experimentou ler as observações dos alunos nos relatórios das avaliações das escolas? Para muitos é a Educação Física (EF) e o Desporto Escolar (DE) que os leva à escola.

Vou segredar a Vª Exª uma questão curiosa: No primeiro dia de aulas depois das habituais apresentações. Proponho um jogo e, disfarçadamente, observo-os. Depois vejo, quem tem hábitos desportivos e executa com alguma qualidade, quem se empenha, quem se retrai, quem tem medo, quem evita expor-se, quem é egoísta, individualista, quem se expõe demasiado, quem é disciplinado, quem, embora sem grandes técnicas, é lutador tenta superar-se, quem é extrovertido, quem é introvertido. A esta observação acrescento uma leitura da ficha biográfica dos alunos (pais, mães, profissões, empregos, irmãos) e tenho a turma retratada em pouco tempo. Tudo porque a Educação Física tem a particularidade prática de envolver significativamente, os miúdos, alunos, nas actividades solicitadas. Aqui não estão a olhar para o professor ou para o quadro fingindo que estão concentrados e estão com o pensamento distante. Aqui o empenho só pode ser de envolvimento e entrega às situações de aprendizagem. Exmº Sr. Ministro, depois de tudo isto diz-nos que a nota vai deixar de contar para a média no Secundário!!?? Então eu estou motivado, esforço-me e depois não conta? Ainda assim, com médias de sucesso elevadas em Educação Física, dada a motivação e empenho dos alunos. Está a prejudicar a grande maioria dos alunos e a esvaziar e ignorar os compromissos empenhados destes ao longo dos anos. Está a ver Vª Exª a injustiça e revolta que está a promover? Tem razão, Vª Exª é Ministro, logo, tem razão. É evidente, que isto é tudo treta! Vª Exª, não acredite em nada disto. Até aqueles sujeitos daquela organização da saúde (OMS), também estão metidos nisto. Veja só que querem que a actividade física seja diária, como forma de prevenir a doença e promover a saúde. Mas, nós estamos protegidos por pessoas inteligentes do Ministério da Educação. Basta uns minutos por semana de brincadeira e aí estão os hábitos saudáveis de vida implantados, para toda a vida do cidadão, sem promoverem despesas a médio e longo prazo na área da saúde. E depois, o que é isso da prevenção da obesidade infanto-juvenil, diabetes, hipertensão, do reforço da estrutura osteomuscular, da coordenação motora, da estabilidade psicológica, do aumento da auto estima, etc.. Tudo tretas!

Exmº Sr Ministro da Educação não vou alongar mais este resumo. Vª. Exª dá ares de inteligente, prove-o, reflicta nesta situação e reconheça que as coisas não estão bem decididas. Todos nós erramos e por vezes até somos ultrapassados por certas contingências, mas por favor, não estrague! Compreenda o significado da luta pela posse de uma Bola.

Romão G Antunes

(Presidente da Direcção da APEF-Foztejo, Associação de Profissionais de Educação Física dos Concelhos do Barreiro, Moita, Montijo e Alcochete)

Bandeira a meia-haste

O lugar do desporto numa sociedade moderna deve emergir da sua dimensão holística. Reduzir o desporto às suas dimensões comercial e industrial – é o mesmo que o subjugar às regras de uma economia capitalista onde o espetáculo é o ópio do povo – é amputá-lo de dimensões que catapultam o sujeito para níveis superiores de desenvolvimento: Refiro-me concretamente à prática desportiva devidamente orientada e ao desporto como instrumento educacional, duas prioridades governativas que nenhum governo pode negligenciar. Quando um governo opta por camuflar o que é essencial preferindo relevar o que é acessório numa lógica desenvolvimentista, opta pelo simulacro em vez da política responsável.

É exatamente a triste realidade a que assistimos incrédulos, mas impávidos. É uma lástima o oportunismo conivente da comunicação social que parece apenas interessada em navegar a onda do negócio.

A bandeira do desporto português está a meia-haste!

Os extremos tocam-se!

Crato quer mais exames a mais disciplinas

Os vinte e poucos anos de serviço – atentem ao rigor – permitem-me olhar para o sistema escolar e antecipar a era pós crato:

Face ao sectarismo do ministro – uma pobre hipérbole cartesiana que se consubstancia na defesa de inimagináveis disciplinas estruturantes e na redução do currículo ao saber ler, escrever e contar – assistiremos ao retorno da ideia de escola que olha o aluno como sujeito integral, cultural. Não sei que estrada será calcorreada, mas tenho a certeza para onde nos levará o caminho. Uma escola demissionária da sua função educativa (re)produz uma sociedade axiologicamente débil, ou não fosse a escola um microcosmos da sociedade.

Um ministro pode estragar muita coisa mas não pode tudo. Um governo pode fazer retroceder o sistema escolar várias décadas, como é o caso. Mas tal como o elástico, depois de esticado ao máximo basta soltar uma ponta…

Seleção nacional – Um baile de debutantes

Não vou comentar a prestação desportiva da seleção nacional de futebol nos dois últimos jogos de preparação para o europeu. Nem sequer irei evidenciar o modo complacente como a comunicação social trata o selecionador nacional agora que desapareceu de cena o mal-amado Carlos Queiroz. Sei que ficará muito por dizer mas não temos tempo e, honestamente, não me apetece remexer no assunto.

O que me impressiona mesmo é a desvinculação de uma equipa profissional de futebol, que é altamente cotada e experiente mas que denota – este é o paradoxo – laivos de amadorismo. Num momento em que se exige concentração máxima de todos os jogadores, o grupo andou na última semana numa roda-viva de compromissos sociais como se de um baile de debutantes se tratasse.

Este processo autofágico não serve apenas os interesses da indústria do futebol, que não são despicientes face às receitas que gera, mas serve sobretudo para engordar os egos de uma oligarquia de dirigentes que se eternizam nas estruturas associativas.

Receio bem que a subversão dos objetivos de preparação de uma equipa de futebol conduza à autofagia competitiva. É bem provável que as inúmeras variáveis que determinam o sucesso ou insucesso competitivo sejam evocadas à la carte para camuflar a aleivosia, que nenhum interveniente direto se atreverá a confirmar. É pouco provável que alguém morda a mão que lhe dá de comer!

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Adenda: Hoje, Manuel José, o treinador em exercício mais experiente corrobora a minha opinião, aqui.

Oráculo da escola pública

Não revelarei nada de surpreendente, pelo menos a quem se movimenta na blogosfera docente, se disser que a narrativa do Ramiro Marques mudou com a passagem de testemunho dos partidos do bloco central: o professorado, aquele aliado de conveniência que iria precipitar a queda do famigerado governo de JSócrates, metamorfoseou-se em adipócito que importa delapidar de um Estado perpetuamente obeso, na perspetiva da direita, claro. Por isso aceita, não direi acriticamente mas direi que aceita compreensivelmente, a redução da despesa pública pela via da degradação da qualidade da escola pública.

Esta cambalhota do Ramiro reflete o empenhamento ideológico dos defensores da privatização do ensino. Quanto pior a qualidade da escola pública melhor, quanto menos fundos forem alocados para a escola pública, mais propensão (que é legítima) terão os pais a escolher a escola privada.

Este seu excerto bem que podia ser o oráculo da escola pública, sob o ponto de vista quem deseja acabar com ela:

O futuro profissional dos licenciados e mestres em ensino não  está no sistema público. Está no sistema cooperativo e particular. Logo que a economia comece a crescer e o desemprego a diminuir, voltaremos a assistir a um aumento da procura de escolas privadas. Essa procura será tanto maior quanto mais confusão e indisciplina existirem nas escolas públicas. E mais confusão e indisciplina é algo que não vai falta no sistema.

(O negrito é meu!)

Percebem agora a quem interessa mais confusão e indisciplina nas escolas públicas?!

Hipocrisia legislativa.

A mexida nas matrizes curriculares e a subtil diminuição dos tempos letivos em quase todas as disciplinas que fazem parte dos planos curriculares vem, inevitavelmente, relançar a discussão sobre os limites da autonomia das escolas. O MEC não abandona a bandeira da autonomia e insinua que, dentro de limites temporais máximos por ano letivo e mínimos por disciplina, as escolas têm liberdade para organizar e gerir o seu tempo.

Não tardará a confirmação sobre a boa-fé do MEC, quando for explicada a forma de contabilização dos minutos letivos a cumprir pelos docentes e a forma como serão considerados nos horários legalmente atribuídos aos professores, como alerta a FENPROF. Adiante.

Admitamos que o MEC agiu com honestidade e que os objetivos pedagógicos prevaleceram face aos objetivos económicos. Admitamos que não está em causa a intensificação do trabalho docente, para os que ficam, e a diminuição de horários de trabalho, para troika ver. Centremos o olhar na lógica organizacional e esqueçamos a rotina dos toques de campainha e outros constrangimentos que atentam contra a liberdade de organizar o trabalho escolar. Esqueçamos ainda que estes constrangimentos existem porque a escola passou a ser um depósito de alunos e a lógica taylorista acaba por ser exclusiva e paradoxalmente necessária para evitar o caos. Esqueçamos a entropia que emerge da criação dos Mega ou Hiper-agrupamentos. Depois desta amnésia que vos sugeri, passemos à liberdade de organização das escolas e à propalada autonomia. Mas façamo-lo aclarando a noção do tempo, ou dos tempos, dos vários tempos:

O MEC determinou um tempo para o programa. É o tempo institucional, formal. Foi mais longe e definiu que esse tempo é um tempo útil ou funcional que, no caso da Educação Física, por exemplo, é o tempo que resta depois de descontar o tempo passado nos balneários. Resta ainda o tempo disponível para a prática, o tempo na tarefa e os restantes tempos didáticos adstritos a cada disciplina.

Ora, regressando ao caso da organização do tempo da disciplina de Educação Física, as lógicas administrativas têm roubado aos alunos tempo útil ou funcional. Arrisco dizer, e não imaginam como gostava de ser desmentido, que não há uma escola portuguesa que cumpra o tempo útil que legalmente está definido para a disciplina. Nenhuma escola cumpre a lei!

E conhecendo bem as lógicas que prevalecem na escola taylorista, não me venham acenar com a cenoura da autonomia porque o que está em causa é a legitimação do roubo aos alunos de um tempo a que têm direito e que é vital para o seu desenvolvimento físico-motor (como demonstram inúmeros estudos nacionais e internacionais repetidamente anunciados pela imprensa, mas hipocritamente ignorados pelos (ir)responsáveis políticos.

Se houvesse boa-fé do ME sobre a organização do tempo, até porque conhecem o que se passa com a disciplina de educação física e a incapacidade das escolas em gerirem o tempo, esta proposta de reorganização curricular teria ficado na gaveta.

E não se pense que o digo porque me deixo entrincheirar por uma lógico corporativista. Pelo contrário: se as escolas soubessem, ou pudessem, gerir a pluralidade de formas organizativas do tempo, a perda de 30 minutos semanais na disciplina de Educação Física no ensino secundário (de 180 para 150 na atual proposta), por exemplo, traduzir-se-ia num ganho considerável para os alunos. Se as escolas respeitassem a lei, 150 minutos de tempo útil por semana expressaria uma distribuição do tempo útil de 2 períodos de 60 minutos e 1 período de 50 minutos por semana, por exemplo. Havia, face ao atual quadro, um acréscimo de tempo de aula para os alunos. Ora, nenhuma escola pode respeitar a lei porque esta “escola contentor” não admite criatividade na organização do tempo.

Sejam sérios e deixem-se de demagogia barata, por favor!

O negócio das metas…

Mais Sucesso Escolar: 14 agrupamentos desistem por insucesso

Metas contratualizadas no programa não foram atingidas

Catorze agrupamentos/escolas dos 123 selecionados para o Programa Mais Sucesso Escolar (PMSE) desistiram do projeto por «não terem atingido as metas de sucesso contratualizadas», segundo um relatório do Ministério da Educação, que será divulgado nesta sexta-feira.

A investigação sobre o rendimento educativo identifica um conjunto de variáveis que podem explicar os resultados na educação: variáveis que se referem a fatores não ligados diretamente ao sistema educativo ou às escolas (variáveis relacionadas com as condições sociais e económicas em que decorre a ação educativa) – variáveis extrínsecas; e variáveis ligadas a fatores diretamente relacionados com o funcionamento do sistema educativo (variáveis relativas à organização do sistema educativo, aos processos de ensino e aprendizagem na sala de aula e na escola) – variáveis intrínsecas. Não sei se por voluntarismo ou por conexões partidárias que agitaram alguns diretores nas anteriores legislaturas, houve escolas que  negociaram o sucesso escolar. É importante que a investigação analise o fenómeno e nos ajude a perceber o efeito e a interdependência de cada uma dessas variáveis no rendimento educativo, por razões óbvias. Mas isso é uma coisa. Outra coisa bem distinta é pensar ser possível garantir o sucesso escolar só porque existe um aparente controlo sobre algumas das variáveis intrínsecas. Quero acreditar que foi a partir desta presunção equívoca que um conjunto de escolas contratualizou as metas de sucesso…
Ainda há males que vêm que bem!

Haja luz!

Há algum tempo que não compro jornais. Há já algum tempo que deixei de contribuir com a minha guita para a farsa em que se transformou a imprensa publicada, salvo as raras exceções em que adquiro um jornal depois de bem conferido o seu conteúdo na banca. Sinto nojo daquele jornalismo servil do statu quo que se encrosta ao poder, pouco importa se o faz para sobreviver ou se o faz para crescer. Por isso vou acompanhando as últimas notícias pela net e os artigos de opinião que valem a pena acabam por ser divulgados na blogosfera, porque os bloggers não dormem…

Hoje li no Aventar um excerto de um texto que merece ser divulgado na blogosfera. É admirável ver um político profissional compreender o óbvio.

Fala Pacheco

Publicado a 28/04/2012 por João José Cardoso

“Quando ouço falar do “festim do crédito”, quem é que é responsável pelo “festim”? Quem deu a festa para recolher lucros, ou participou nela para ter vida mais fácil? A resposta justa é: pelo menos os dois. A injustiça da resposta é que só um aparece como “culpado” do “festim”, e só um lhe paga os custos. E se falarmos mesmo dos muitos milhares de milhões que constituem a dívida nacional, que hoje é apontada como um fardo moral para os pobres que “viveram acima das suas posses”, com esse plural majestático do “nós”, em “nós vivemos acima das nossas posses”, eles não foram certamente para o bolso das pessoas comuns que hoje lhes pagam o custo. Não foram os pobres, nem os funcionários públicos, nem a classe média baixa que fez as PPP. O discurso do poder é todo feito para culpabilizar os de baixo, enquanto quase pede desculpa para moderar um pouco os de cima. A resposta dos de baixo é uma rasoira populista e igualitária, que também não promete nada de bom para o futuro.

Há uns imbecis que dizem que falar assim é falar como o Bloco de Esquerda. Não, falar assim é falar como deveriam falar todos aqueles que não vêem a realidade com os olhos do poder e das ideias da moda, e que se esforçam por perceber o sentido último da política em democracia: as pessoas só têm uma vida, e, estragada essa vida, não há outra. É laica a política em democracia, vive da vida terrestre não da vida celeste. E se isso não é a pulsão da política em democracia, o bem comum e concreto das pessoas, então a democracia não sobrevive. Não tenho feitio para Catão, e tudo o que aqui é dito é mais que moderado e devia ser, se não andássemos todos virados para as explicações simplistas e para os slogans dicotómicos dos blogues, sensato. Aliás, a grande traição do PSD, do PS e do CDS é terem deitado fora, ofuscados pelo poder, todas as raízes humanistas, sociais, liberais, e cristãs, do seu pensamento e, pior ainda, do seu “sentimento”.

Revisão curricular – Uma proposta herética

Acompanhando a interpelação de José Soares: “que alternativa tem a Escola para combater a epidemia da obesidade e o aumento assustador da diabetes tipo 2 que não seja o exercício e a alimentação? Tratada a alimentação, o que propõem para o exercício? Presumo que alguns estejam a dizer que este é um aspecto secundário. Deixem-me dizer que segundo a Organização Mundial de Saúde estima que esta geração mais nova vai ser a primeira a ver os seus filhos morrerem antes deles. A esperança de vida vai, de forma estúpida, diminuir. Se a Escola não se preocupa, quem se deve preocupar?”

Não vou tão longe ao desejar que a Escola, pela via da Educação Física, proporcione 1h por dia de atividade física (sim, se não for assim, tirem lá a palavra “saúde” dos objetivos), nem pretendo reduzir os objetivos desta disciplina à temática da saúde. Apesar de não querer reduzir o alcance da disciplina à questão da saúde, sinto-me obrigado a questionar algumas vacas ideias sagradas que trespassam a “ideologia do rigor e da exigência”.

Correndo o risco de falhar a minha independência na abordagem à alteração inócua ao desenho curricular (e chamem-me lá corporativo por uma vez), há condições, sem tocar no máximo total de carga curricular, para darmos mais um passo em direção ao objetivo da 1 hora diária de atividade física.

Sendo a escola pública laica, por que razão é realizada a oferta unilateral (voluntária para os alunos mas obrigatória (?) para a escola) de uma confissão religiosa?

Acham mesmo que é uma heresia transferir 45 minutos por semana de EMR nos 2ºs e 3ºs ciclos para a EF, e 2x 45 minutos no secundário?

Maniqueísmos…

No dia em que a imprensa deu voz à CGTP para anunciar a greve geral, mostrei aqui a minha desconfiança quanto à sua oportunidade. Pensava no efeito ricochete para o movimento sindical se os níveis de adesão fossem desprezíveis, como veio a acontecer. Dispenso os números: basta-me a leitura das linhas e entrelinhas das declarações do Arménio Carlos e do colega Mário Nogueira. Face às dificuldades de mobilização a que se referia Arménio Carlos, o terreno fica fértil para o avanço das políticas regressivas dos direitos laborais.

Ironias das ironias: os receios com a banalização da greve geral assaltaram muitas consciências, principalmente daqueles que a contestam. Subliminarmente em alguns casos, mais categoricamente noutros, o direito à greve é questionado porque atenta contra uma série de direitos individuais de circulação ou, de forma egocêntrica, do usufruto de serviços públicos. O próprio primeiro-ministro acaba por defender a ideia maniqueísta de que há muitos portugueses que hoje trabalham e ajudam o país, apesar da greve…

Há quem descubra nestas declarações um ideal progressista! Assim como há quem descubra nestas declarações um ideal neofascista!

Maniqueísmo com maniqueísmo se paga!

Modelo ideal de professores – Entre o funcionalismo e a profissão liberal

Ao contrário do que pensa o Paulo Guinote, creio que a minha visão de professor não deve estar assim tão afastada da sua.

Julgo que António Nóvoa, discorrendo sobre o processo de profissionalização do professorado, acaba por delimitar muito bem os limites do nosso aparente desacordo. Nóvoa considera que “a funcionarização deve ser encarada como uma vontade partilhada do Estado e do corpo docente. E o modelo ideal de professores situa-se no meio caminho entre o funcionalismo e a profissão liberal: ao longo da sua história sempre procuraram conjugar os privilégios de ambos os estatutos.”

Não ignorando que esta afirmação encerra um evidente oportunismo, direi histórico, da profissão docente, que nos daria pano para mangas, é inequívoco o posicionamento dual dos professores.

Se há funcionalismo, é normal que os sindicatos de professores assumam a defesa dos seus profissionais face aos empregadores, não se diferenciando nesta matéria de outras associações sindicais. E à medida que regride o estatuto socioeconómico dos professores, os movimentos sindicais clássicos acabam por ver reforçado o papel dos seus aparelhos. Correndo o risco de parecer incoerente com o que tenho defendido aqui, considero que a crescente importância dos sindicatos de professores acaba por revelar a pujança de uma visão funcionarizada da profissão, que é de todo indesejada. O corte com esta visão proletarizada da profissão docente requer um projeto de autonomia profissional responsável e exigente e uma cultura profissional assente num conjunto de regras éticas que pautem as relações com outros atores educativos e que impeçam a consagração de teorias que fomentam as desigualdades sociais.

São necessários projetos de autonomia das escolas e a reconfiguração da profissão docente.

Quanto à falta de projetos de autonomia, a proliferação de “tiranetes” na gestão escolar não recomenda o autogoverno das escolas; Quanto à reconfiguração da profissão, não é possível recriar a profissão docente sem questionar o modelo de formação e, fundamentalmente, sem reforçar o estatuto socioeconómico dos professores para que cada um defina os percursos da sua carreira.

Como reestruturar as redes de caciques

Assim que um director de uma escola que ainda não foi agrupada terminar o seu mandato, fica impedido de voltar a candidatar-se e de ser reconduzido para um segundo mandato. A escola é tomada de imediato por uma comissão administrativa provisória, nomeada pelo Ministério da Educação. Esta comissão assume a gestão da escola e só dali sairá quando o governo decidir sobre a sua fusão com outros estabelecimentos de ensino ou agrupamentos escolares. A partir de agora e até ao fim do ano lectivo 2012-2013 terá de ser assim. in: http://www.ionline.pt/portugal/directores-impedidos-se-candidatarem-terminar-fusao-escolas

Um governo que usa e abusa da retórica meritocrática não devia enveredar pelo caminho dúbio de nomeações políticas em patamares intermédios da função pública. Se se confirmar que o ME nomeará as comissões administrativas provisórias, das duas uma:

Ou trata-se de um estratagema para premiar os boys cansados de salas de aula?

Ou pretendem purificar as redes dos caciques?