SEDES e a defesa da educação utilitarista

“Só através da dotação de conhecimentos habilitantes num mundo competitivo, se pode promover eficazmente a ascensão social, pelo que uma educação competente é o melhor, senão mesmo o único, meio de libertar duradouramente as pessoas da pobreza e das limitações da sua origem social. Por isso as atitudes de complacência e de rebaixamento dos padrões de exigência que têm dominado, nas últimas décadas, o nosso sistema de ensino são, no fundo, os melhores meios para tornar os pobres mais pobres e para perpetuar a sua situação de dependência. E não há nenhum discurso socializante que, por si só, inverta esta realidade.” (SEDES)

Equívoco 1 – A ascensão social é possível pela via dos conhecimentos.
Com a classe média a desaparecer e o número de licenciados no desemprego a engrossar, a ascensão social é uma promessa conveniente. Por um lado, a miragem da ascensão social retarda as convulsões sociais que podem ser desencadeadas pela tomada de consciência das condições de vida assimétricas e irreversíveis. Por outro lado, a miragem da ascensão social permite ao modus vivendi instalado gerir com mais folga os interesses da casta.

Equívoco 2 – A educação competente é o único meio para libertar as pessoas da pobreza.
Depreendo que o conceito de educação aqui aplicado pretenda significar uma educação escolar, eventualmente, uma formação profissional. É certo que uma educação competente não se reduz à sua dimensão utilitarista. O problema é que a formação profissional parece ser a única dimensão valorizada pelos arautos do neoliberalismo. O que me leva a inferir que a educação competente defendida pela SEDES é incongruente com a ideia de libertação.

A mãe adoptiva dos conselhos municipais da educação…

A ministra da educação confessava, há dias, que “costuma aconselhar-se junto de antigos ministros da pasta, a quem costuma telefonar «muitas vezes» para ouvir as suas opiniões”.

Presumo que terá sido o Dr. Justino o último conselheiro ouvido pela ministra. Como bem me lembro, o Dr. Justino foi o pai dos conselhos municipais de educação, criados pelo Decreto-Lei n.º 7/2003, de 15 de Janeiro de 2003 (que regula as competências, a composição e o funcionamento dos conselhos municipais de educação, regulando, ainda, o processo de elaboração e aprovação da carta educativa e os seus efeitos) .
Creio que a actual ministra da educação pretende ser a mãe adoptiva do definhado documento. E o que hoje foi anunciado pelo secretário de Estado da Educação, Valter Lemos, “que as autarquias podem assumir a gestão das suas escolas”, pode ser ter sido um passito mais adiante naquilo que foi a ambição do progenitor da descentralização de competências para as autarquias: a gestão das escolas pode ser, ou não (aguardemos para ver), a mão do autarca no interior das escolas. Pode ser uma mão que puxa as rédeas do poder situado. Como é evidente, os proletários da educação precisam, mais do que nunca, de controlo, de uma mão forte.

Espero estar profundamente equivocado. Como espero que a ilusão do controlo da acção situada seja isso mesmo: um erro de interpretação. Espero ainda que a ideia seja a de obrigar as autarquias a fazer o que deveria ter sido feito(ou se já foi feito não se notou): de coordenar e articular as políticas educativas com outras políticas sociais; de elaborar a carta educativa que gere a rede educativa municipal; de apoiar, no âmbito da acção social escolar, os projecto de inclusão das crianças com necessidades educativas especiais; de intervir na qualificação do parque escolar. Espero para ver!

O CNE vai encontrar a chave. Há que esperar pelo parecer…

Finlândia, Irlanda e Espanha são casos de sucesso na Educação e exemplos a seguir por Portugal. É a opinião do Conselho Nacional de Educação que convidou especialistas dos países a contarem o segredo educativo.
A Finlândia tem muitas horas de aprendizagem dentro da sala de aula, mas a chave do sucesso é mesmo a aposta em professores de apoio nos primeiros quatro anos de escolaridade. Já para os irlandeses, o segredo do êxito na Educação está nos professores altamente qualificados e que gostam da profissão. A especialista espanhola, Joaquina Maeso, revelou que a receita está sobretudo no apoio à língua espanhola, pois considera que se um aluno não dominar a língua vai fracassar às outras disciplinas.
São exemplos como os da Finlândia, Irlanda e Espanha que vão ajudar a formular o parecer sobre a Educação no ensino básico que o Conselho Nacional de Educação deve emitir em Julho.
in: TVI

Perdemos demasiado tempo à procura do elixir que nos fará transcender: Onde estará, afinal, a chave do sucesso na Educação?
É que passámos demasiado tempo a observar o caldo de cultura alheio e continuámos esperançados de que é possível importar modelos, paradigmas, e outros quejandos.
Parecemos umas baratas sem tino nem destino! Será possível existir um sucesso na educação sem que esse sucesso [travestido sei lá de quê] esteja reflectido num pretenso sucesso societal? Que miopia é esta que nos faz olhar para o sistema educativo através de uma lente que só enxerga o sistema escolar?

Triste sina a nossa!…

Conflito de interesses…

Há que reconhecer a minha ignorância: alguém me poderá ajudar a compreender o que perdem os cidadãos europeus com o definhamento do Tratado de Lisboa?
Eu já percebi o que perde o nosso primeiro-ministro, e pude perceber que os interesses pessoais do primeiro-ministro não podem ser confundidos com os interesses do país. É para mim claro que o país pode ganhar quando o primeiro-ministro perde. O Dr. Durão Barroso demonstrou precisamente o contrário: que o país pode perder quando um primeiro-ministro ganha. Ora, por todas as razões que desconheço e principalmente por esta dúvida basilar, conviria que o debate sobre esta matéria fosse amplo e esclarecedor sobre o que está verdadeiramente em jogo.

Que o Não irlandês leve os “eurocratas” a arrepiar caminho!

Adenda: “Um dia depois da bomba lançada sobre a União Europeia pela vitória do “não” no referendo irlandês ao Tratado de Lisboa, os líderes europeus não parecem dispostos a abandonar o documento que acordaram em Outubro passado e são cada vez mais os que admitem a hipótese de convencer Dublin a repetir a consulta.”

Comentário: A política de bordel pode ser uma excelente paródia! E não é que me apetece perguntar: Eu sou castanho? E puxo carroça?

Manga-de-alpaca

Tenho de reconhecer que tenho ainda muito caminho para andar até me transformar num bom operário da educação. Pressinto que me querem impingir esse estatuto, por razões meramente economicistas, mas ainda [?] não estou preparado para o cumprir. Estarei desfasado deste tempo? Sinto que as funções acessórias que estão a ser relevadas no conteúdo funcional da profissão que escolhi não se coadunam com o investimento que fiz na profissão e muito menos com as minhas expectativas de educador.
Tenho de reconhecer que não me sinto nada confortável, mesmo nada confortável, a ouvir a leitura de uma norma [02], que deveria ser distribuída pelos professores em formato digital [só para evitar o desperdício de papel]; Não me sinto nada confortável a vigiar uma prova de exame onde apenas é requerida a presença física e um mutismo fiscalizador; Não me sinto nada confortável a preparar pautas de provas de exame, resmas de papel para cumprir um ritual administrativo oco de conteúdo…
É um pena não exigirem mais do meu trabalho do que o simples cumprimento de formalismos inócuos. Corro o risco de passar uma imagem de imodéstia ao denunciar um pretenso desperdício de capacidade. Mas quem não se sente não é filho de boa gente!
Manga-de-alpaca, Não muito obrigado!

A fuga para o abismo II

“O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos. Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio dependem das decisões políticas.

O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta, o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.”

Bertolt Brecht

Psicologuês…

Este artigo de José Morgado (in: Público, 25/5/08) releva um conjunto de 7 equívocos que emergem dos discursos de alguns psicólogos supostamente impreparados para as matérias ligadas aos processos educativos:

Equívoco 1 – “Não se pode contrariar as crianças”.
Equívoco 2 – “As crianças têm sempre razão”.
Equívoco 3 – “As crianças são sempre boazinhas”.
Equívoco 4 – “Não se pode dizer às crianças que erraram, por que se traumatizam”.
Equívoco 5 – “As crianças podem fazer o que querem, trata-se de experiências”.
Equívoco 6 – “Não se pode castigar as crianças”.
Equívoco 7 – “A autoridade não é boa para as crianças”.

Dir-me-ão que estes equívocos não passam os muros da escola e que é apenas retórica de alguns fazedores de opinião. Pois…

Deputação funcionalista…

Socialistas com mais de 500 faltas
Os deputados socialistas já registaram nesta sessão legislativa, que termina a 18 de Julho, mais de 500 faltas às reuniões plenárias. Perante este cenário, o líder parlamentar do PS, Alberto Martins, chamou a atenção dos deputados e exigiu maior assiduidade”

Recordo o tempo em que a assiduidade dos docentes fazia a manchete dos jornais. Sorrio com o modo aparentemente ingénuo como a imprensa manipula as estatísticas, distorcendo e enviesando a realidade. O líder parlamentar socialista parece muito preocupado com a imagem que trespassa das ausências dos deputados no hemiciclo. No seu lugar não me preocuparia com este tipo de minudências e muito menos relevava o assunto na praça pública. No seu lugar, questionaria seriamente a qualidade da participação dos deputados dentro e fora do parlamento; questionaria seriamente o legado de confiança recebido nas urnas; perguntar-me-ia se a “deputação” é ou não uma espécie de funcionalismo público e um emprego.

O que importa esconder do exemplo finlandês.

“Los finlandeses, los europeos con mejores notas, tienen actividades deportivas todos los días.”

Há evidências nos estudos epidemiológicos que alertam para a importância da adopção de estilos de vida activos como meio de prevenir os riscos de doenças de essência hipocinética, das quais se destacam as cárdio-vasculares.
A adopção de estilos de vida cada vez menos activos, quando aliados aos problemas de obesidade, exige das entidades responsáveis pela Saúde Pública uma acção concreta dirigida à alteração de hábitos comportamentais. É necessário recorrer a um conjunto de estratégias diversificadas [a televisão e os meios de comunicação social jogam aqui um papel essencial] para sensibilizar as famílias para a necessidade de alteração dos seus hábitos de vida. A escola é chamada a colaborar. É indispensável convocar a educação física para dar o seu contributo. Apesar das recentes recomendações do parlamento europeu que desafia os estados membros a aumentarem o tempo semanal da Educação Física, o nosso governo parece incapaz de encarar o problema de frente. As pressões no sentido da redução da carga lectiva semanal fazem emergir o risco de se enveredar pelo caminho mais populista: a diminuição do peso das disciplinas pretensamente secundárias, entre as quais a Educação Física. Aliás, este caminho já foi iniciado, como comprova a presença muito subtil da disciplina nos cursos de educação formação, do ensino básico, e nos cursos profissionais, do ensino secundário.

E assim vamos cantando e rindo com a aposta centrada em programas de educação para a saúde inócuos já que se limitam a iniciativas esotéricas, como por exemplo, as acções de formação com “sabor a papel de música”. Há, no entanto, excepções que confirmam a regra: O programa Pessoa, ainda em fase de implementação, será desenvolvido no concelho de Oeiras e que parece bem desenhado para fazer face a este problema.

Isto vem a propósito deste texto da Glicéria e da sugestão de leitura do Ramiro Marques.

É necessário lançar um outroolhar para a democracia.

“No seu discurso na sessão comemorativa do 25 de Abril, no Parlamento, Cavaco Silva divulgou extractos de um estudo que mandou realizar sobre o alheamento da juventude face à política, e atribuiu parte da responsabilidade aos partidos políticos.” (Público)

O senhor presidente podia e devia ter aproveitado a oportunidade para assumir a sua quota-parte de responsabilidade. É uma verdade insofismável que as instituições democráticas e os partidos políticos não são assépticos. Ainda recentemente promulgou o diploma da gestão escolar, um diploma que constitui um retrocesso na vida democrática das escolas. Mas é preciso sair dessa esfera: seria um erro circunscrever a democracia à democracia política. É necessário complexificar um pouco mais a ideia de democracia, como nos sugere John Dewey*: «O problema da criação de uma genuína democracia não se resolve pela “super -simplificação da ideia de democracia” (LW.I3:95) resultante da circunscrição a uma forma de regime ou governo político mas pela complexificação, isto é, a sua extensão a todas as esferas da vida humana e a consequente transformação das condições de vida presentes, “numa integração moral e intelectual” (LW. 13:97). Só assim a democracia é, fundamentalmente, “um modo, um caminho de vida” (LW.I3:155), ou melhor, o ideal que inspira uma forma de vida – a democrática. Neste sentido, ela representa, como todos os ideais simultaneamente um meio e um fim: um meio-método, porque se trata de uma via em si mesma valiosa, pelas atitudes e valores que mobiliza e que são o seu próprio fim: o crescimento do “eu” e o crescimento social como forma integrada de um desenvolvimento conjunto, mais amplo.» (p. 133)

Não consigo deixar de pensar no diploma que V.Exª promulgou. Olhe que «A séria ameaça à nossa democracia não é a existência da Estados totalitários estrangeiros. É a existência, dentro das nossas próprias atitudes pessoais e dentro das nossas próprias instituições, de condições similares àquelas que deram vitória à autoridade, à disciplina, à uniformidade e à dependência externas do “Líder” nos países estrangeiros. O campo de batalha é também, consequentemente, aqui – dentro de nós mesmos e das nossas instituições» (p. 134).

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* Gambôa, R. (2004). Educação, ética e democracia – A reconstrução da modernidade em Jonh Dewey. Ed. ASA. Porto.

Os sindicatos que todos queremos dispensar.

As políticas educativas, como todas as políticas sociais, reflectem a dominância da Economia sobre outras formas de Cultura. Os estados, submetidos a pressões no sentido da redução das despesas com a educação, introduzem alterações mais ou menos profundas no próprio ensino, as quais afectam, inevitavelmente, o modo como é definido o trabalho dos professores. A proletarização do trabalho docente é a expressão de um modelo de desenvolvimento profissional anacrónico que valoriza uma formação mais utilitária e menos reflexiva e questionante. A precariedade do emprego e a degradação das condições de trabalho, a introdução da avaliação do desempenho para regular os métodos e os modelos utilizados pelos professores, são “inovações” que reflectem um modo de perceber o papel da educação e da escolas em geral e dos professores em particular: as escolas são enormes receptáculos de políticas nos quais são depositados os problemas irresolúveis da sociedade; os professores são os obreiros que preparam as gerações futuras para enfrentar esses problemas.

Num tempo em que a Economia parece instrumentalizar o Homem, num tempo em que a Economia deixou de estar ao serviço do homem, foi o homem inteiro que passou a estar ao serviço da Economia, como diria MF Patrício. Os sindicatos emergem neste tempo como uma almofada protectora da hostilização do trabalho humano. Há que trabalhar para os dispensarmos. Seria um sinal da humanização da economia. Mas não sejamos ingénuos. De que nos vale actuar nas consequências? Acham normal que pouca gente se atreva a fazer algo relativamente à economia, mas todos – os políticos, a comunicação social, o público em geral – queiram fazer algo na educação?

Déjà vu

“O que é a Autoridade?
O que significa o Respeito?
Como se relacionam Professores, Alunos e Pais?
Dos tempos da palmatória às imagens do empurrão?
Quem manda hoje nas nossas escolas?
O que é ser Professor e ser Aluno?
O maior debate da televisão portuguesa reúne Professores, Alunos, Pais, Sociólogos e Psicólogos.
Crescer e aprender em harmonia.”

O formato do programa não permitirá tratar com a necessária profundidade as questões elencadas pela moderadora. No final do programa ficaremos ainda mais convencidos ao descobrir a verdade lapaliciana de que o mundo, a sociedade, a escola, os alunos, os professores, os pais, os conceitos, os valores, mudam no [e com o] tempo. É necessário perceber o sentido e os contextos da mudança e muito provavelmente ficaremos confusos quando associarmos os problemas aos paradoxos e às perversidades deste tempo [pós-moderno].
Atrevo-me a lançar uma proposta de resolução para os problemas deste mundo [educativo] em constante mudança: situar num discurso ético o trabalho das escolas e dos professores; discutir em debate alargado os princípios da igualdade, da excelência, da justiça, da parceria, do cuidado para com os outros.

Os valores ou a falta deles?…

As lutas pelo poder nas escolas adoptam configurações muito diversas. Não estou a pensar nas lutas pelo poder legítimo, sufragado pelo acto eleitoral. Estou a pensar nas estratégias utilizadas por vários actores tendo em vista a manutenção dos seus interesses e a conquista de uma posição privilegiada que lhes permita manter o estado da situação. A divisão da carreira e as novas dinâmicas geradas pela preparação do processo de avaliação do desempenho docente vieram ressuscitar estas lutas pelo poder.
Ramiro Marques tem divulgado alguns casos, algumas evidências que nos obrigam a reflectir seriamente sobre o sentido que queremos dar à nossa profissionalidade:

“O ambiente das escolas alterou-se. Nuns casos, há guerra aberta. Professores titulares contra professores, PCE contra professores titulares, perseguições por delito de opinião e sessões de auto-crítica, em reuniões do CP, à boa maneira estalinista e maoísta.
Exemplo disso, é um email que eu recebi de um PCE (não o identifico nem à escola!) a exigir que eu revelasse o nome da professora que me enviou as fichas de avaliação. Ao que isto chegou!
Noutros casos, é o beija-mão: professores a darem graxa aos avaliadores. Lamentável! É isto aquilo que chamam a avaliação entre pares!”

Entramos no domínio mais perverso da escola. Aquele em que se refugia o corporativismo bacoco. E o enquadramento deste fenómeno deverá ser feito a partir de um quadro de referência onde se inverte a lógica de serviço – afinal, quem serve quem?
Por conveniência semântica rotulei os actores instigadores: são os acólitos. São eles que procuram assegurar a manutenção do statu quo. Há várias versões de acólitos mas a ideologia é a mesma: Camuflar eventuais “rabos-de-palha”; jurar vassalagem e, como moeda de troca, reclamar a eternização das benesses. É a cultura da cunha.
Os acólitos não desejam equidade, prescindem da liberdade intelectual e receiam a perda de confiança do poder que ajudaram a conquistar. Alguns “desaparecem” quando são desmascarados. Não acreditam na cultura de colaboração, desconfiam da inovação e da mudança. Através de um pacto de regime, silencioso, poucas vezes declarado, o clube dos acólitos congrega vários tipos, docentes e não docentes. Alguns são fundamentais na gestão dos conflitos internos nas escolas; amortecem as críticas firmadas; impulsionam a intriga para tomar o pulso da contestação.

Sem pretender revelar todo o cardápio, é possível definir vários tipos de acólitos (porventura agregados numa oligarquia):
  • Os irritados criticam as pequenas falhas de organização, são intolerantes com os alunos e colegas, principalmente, com os mais novos. Crêem na sua coragem consubstanciada numa crítica ligeira, disfarçada, que ninguém leva a sério;
  • Os trabalhadores andam sempre atarefados, azedos e nunca erram. Isto é, raramente assumem o erro, o engano, o descuido, a falha. São os super-profissionais;
  • Os calados não têm opinião, apresentam-se descomprometidos com a escola. São insuspeitos, são os desejados porque não “complicam”. São os ouvidos que as paredes escondem;
  • Os estrategas preocupam-se com o clima da escola e com as pessoas, mas o que realmente lhes interessa é a conjuntura. Se pressentem sinais de um eventual contra-poder tornam-se visíveis, actuam concertadamente e, com muita facilidade, mobilizam um batalhão de fiéis. São implacáveis na retaliação;
  • Os anónimos diferem dos calados porque não têm a capacidade de discernir o seu grau de influência. Fazem qualquer coisa para agradar ao poder instalado e anseiam subir na escala de influência.
Raramente os acólitos aparecem no seu estado puro. São híbridos e multifacetados. São pessoas que procuram a sua transcendência. É uma lástima que este tipo de superação suscite uma profissionalidade desprovida de sentido.

Urge retomar a discussão sobre os valores na Escola!

O que vale, verdadeiramente, a pena…

“São os indivíduos e os pequenos grupos de professores e de directores que terão de criar as escolas e as culturas profissionais que desejam.” (Fullan e Hargreaves)

Pela via da intensificação do trabalho e da luta política [no sentido mais amplo do termo] somos transportados, com eventual agravo, para terrenos agrestes. O risco do maniqueísmo é real.
Seria uma lástima perder o tempo [cada vez mais precioso] e a força [cada vez mais limitada] com inocuidades…

Que públicos nas doações públicas?

“Lei e contrato impedem Jardim de doar estádio ao seu clube” (Público, 6/2/08)

A doação de infra-estruturas públicas a privados exige critério, nomeadamente, que o privado garanta o cumprimento do serviço público para o qual a infra-estrutura fora criada. Gostaria de ter a certeza de que esta prática elementar de boa gestão é sempre aplicada e que os dinheiros públicos não servem para alimentar cortes de lacaios.

Não tenho qualquer reserva ideológica, ou de outra natureza, que me leve a olhar com desconfiança a partilha de responsabilidades entre o Estado e a iniciativa privada. O que me custa ver é a demissão do Estado das suas responsabilidades no momento em que delega funções e serviços aos privados. Um autarca ou um membro do governo que decida doar um bem [que não é sua propriedade], tem de garantir que esse bem chega com qualidade aos destinatários, aos cidadãos. A sua responsabilidade não termina aí. Deve criar mecanismos de controlo e de vigilância, deve salvaguardar a reparação dos danos nas situações em que o beneficiário da doação não cumpre a sua parte.

O que parece simples ao nível da retórica, a prática encarrega-se de complexificar.

Das farpas…

Este olhar do meu amigo Manel dirigido para as recomendações do Conselho de Escolas, associando-as a um tipo de atavismo castrador da iniciativa – mais conhecido pelo “deixa andar” – induz-me, não me perguntem porquê, a pensar num problema matricial deste PS. Marcado por uma experiência traumática, como foi o Guterrismo, cujo paradigma assentou num diálogo social conotado [erradamente a meu ver] com um “nada fazer” e “tudo adiar”, este PS quer rapidamente apagar da nossa memória colectiva uma parte do seu passado através de uma mudança radical de atitude. O “velho” PS, mais ponderado, mais sensato, mais lento, mais reflectido e porventura menos ágil, quer metamorfosear-se. O PS “Socratino” quer ser jovem, electrizante, decidido e arriscado. O “praticismo” é a sua onda…
Estou certo que depois de passar esta moda, o PS ainda será útil ao país. Pena é que tenhamos, todos, de suportar as consequências de crises de identidade alheias.

Escola pública em risco ou o risco da escola pública?

Diz o estudo realizado por dois investigadores do ISCTE, em 5 escolas de Lisboa, noticiado aqui no jornal da tarde [entre o minuto 16:36 e o 19:18], que “ a escola pública igual para todos está em risco”.

A escola pública igual para todos? Percebo a ideia mas preferia que a escola pública fosse diferente para todos. Adiante… o estudo não acrescenta nada de novo. Admitindo que este estudo do ISCTE é credível e que as conclusões são para levar a sério – ao revelarem problemas graves de equidade social na escola pública, qual foi o impacto das recentes medidas do governo associadas à campanha pública de descredibilização do trabalho docente? Dito de outra forma: ao empolar os resultados da avaliação externa da escola (a avaliação foi a panaceia do governo para os problemas educativos) e dos professores (ECD), não terá o ME induzido as lideranças fortes das escolas a seleccionarem os alunos para garantir bons resultados académicos?

Olhando agora para “o lado B” desta notícia, reparo que Albino Almeida (AA) reclama cotas para a constituição das turmas. Será que AA deseja que as cotas se devem aplicar também aos CEF’s (ensino básico) e aos Cursos Profissionais (ensino secundário), ou será que as cotas só devem ser consideradas para as turmas de excelência?
Se há um enquadramento legal para as turmas de nível, por que razão AA não contesta a discriminação promovida pelo ME quando legisla a criação de turmas de repetentes?

Um ano de educação em dois parágrafos.

As políticas deste governo não mobilizaram o País para a educação. De costas voltadas para os professores e funcionários, mas de braço dado com os representantes de alguns pais que se representam a si próprios e com uma dúzia de empresários que conseguiram “novas oportunidades” de negócio, o governo não teve um projecto educativo nacional que emergisse de um quadro de um projecto de sociedade. Não há um sinal que nos conduza a uma sociedade mais humanista e solidária.

As lógicas do imediato que subjazem às políticas deste governo parecem desadequadas à natureza da educação (que requer lógicas de longo prazo). Os interesses imediatos (políticos, sindicais, das associações de pais e de professores, das empresas, etc.) prevaleceram e ordenaram as tomadas de decisão sacrificando os interesses mediatos (o desenvolvimento e a modernização do País, a elevação significativa do nível cultural educativo das pessoas) apesar de uma retórica oficial que insiste em afirmar o contrário. A certificação deixou de ser sinónimo de qualificação.

Equívocos…

O projecto político neoliberal que este governo adoptou irá, paulatinamente, abrir caminho à privatização da educação pela via do empobrecimento do serviço público. Apesar da retórica do governo usar e abusar de chavões que estão, normalmente, associados à defesa da escola pública de qualidade, a verdade é que as medidas legislativas e as políticas adoptadas têm degradado a imagem da escola pública.

Como é do conhecimento geral, a escola pública prossegue objectivos de coesão social e de equidade ao nível da distribuição dos recursos. São objectivos de um serviço público do Estado que nenhuma escola privada adoptará porque não tem essa incumbência.
Se, por um lado, os objectivos da escola pública são cada vez mais difíceis de alcançar por circunstâncias políticas adversas, que resultam da aplicação de uma cartilha neoliberal, por outro lado, à medida que se agravam as desigualdades na distribuição dos recursos económicos e culturais, a escola pública é cada vez mais imprescindível. Ora, é um perfeito disparate considerar dispensável uma instituição do Estado, como é a Escola Pública, porque se constata que a sua acção é cada vez mais ineficiente. Este raciocínio levar-nos-ia à anulação do Estado porque ele se revela ineficiente em inúmeros domínios. Adoptando a lógica que subjaz a este raciocínio à Justiça, os tribunais seriam dispensáveis só porque se revelam incapazes de anular as causas e os efeitos das injustiças.
Haja paciência…

Isto vem a propósito de um artigo de opinião, no DN, onde o especialista em biotecnologia, João Miranda, revela os seus macaquinhos no sótão:

“Estes resultados [classificações dos alunos em exame nacional] demonstram o fracasso de uma certa utopia de escola pública. Aquela utopia que nos diz que a escola pública acabará com as diferenças sociais e produzirá igualdade de resultados entre pessoas de meios sociais diferentes. São os próprios defensores dessa utopia que, perante os rankings, o reconhecem. Como os rankings mostram que as escolas mais bem classificadas são escolas privadas, os defensores da utopia da escola pública são forçados a alegar que os resultados das escolas privadas se devem à origem socioenonómica dos seus alunos. Dizem que o meio socioeconómico influencia mais os resultados que a qualidade da escola. Reconhecem, em última análise, que, ao contrário do que diz a utopia, a escola pública está muito longe de anular os efeitos do meio socioeconómico.”

:(

Agradeço à Sra. Ministra da Educação. Não fora a sua excelente política e a consequente intensificação do meu trabalho, como seria possível executar com tamanha e visível mestria aquela tarefa fundamental da profissão Professor: realizar actas?

É verdade que enquanto realizo estas tarefas relevantíssimas, fico com menos tempo para pensar, criticar e intervir na vida cívica e familiar…

A estupidificação do meu trabalho é osmótica.

Folclore e a campanha do efémero…

O governo, em peso, decidiu fazer uma romaria pelas escolas para assinalar a abertura do ano lectivo. Não havendo nenhuma novidade a anunciar pelo governo no reinício das actividades escolares , há dois factos políticos a relevar: um decorre do folclore mediático, o outro está implícito nas mensagens da propaganda que querem transformar a escola num lugar onde o fácil é idolatrado, onde se promove o efémero, o utilitário e imediato.

1. A determinação do primeiro-ministro em aguentar, até ao final do mandato, a actual ministra da educação é um mau sinal. Os constantes votos de confiança política fazem-me lembrar aqueles presidentes dos clubes de futebol que se apressam a manifestar solidariedade ao treinador, depois de uma série de desaires desportivos, amortecendo desse modo as críticas dos adeptos mais impacientes. Nos dois acasos, a aparição pública do presidente (do clube ou do conselho de ministros) só se justifica porque há um mau desempenho que reclama uma mensagem de solidariedade. Um bom ministro dispensa a presença do chefe do governo. A sua obra fala por si. Nas coisas da bola, o treinador só resiste até ao fim do contrato com bons resultados. Nas coisas da política, um mau ministro só resiste até ao fim do mandato se o governo tiver espaço de manobra nas sondagens. Ora, como as recentes sondagens de opinião colocam o partido do governo em valores próximos da maioria absoluta, o primeiro-ministro pode continuar a gerir os maus desempenho dos membros do governo inaptos sem hipotecar a renovação de mandato.

2. A campanha idiota do regresso às aulas, que uma marca de supermercados lançou recentemente, dizia que regressar às aulas não custa nada. O programa “novas oportunidades” assenta no mesmo erro porque veicula, subliminarmente, uma ética do fugaz.

Dividir para reinar!

O Zé Manel congratula-se com o movimento de cidadãos que lutam pela criação do concelho das Taipas. São legítimas as pretensões de autonomia de quem se sente segregado por equipas executivas camarárias. Não se trata, obviamente, de criticar este tipo de movimentos. Trata-se de procurar perceber se a solução para uma pretensa má gestão, ou a distribuição pouco equitativa de recursos municipais, passa pela divisão administrativa. Se se concordar que a divisão administrativa é a solução para o problema da má gestão, então os novos concelhos terão dificuldades em recusar o cenário divisionista quando uma freguesia denunciar o esquecimento e reclamar autonomia. E assim sucessivamente. Seria dividir para reinar.

A meu ver, é necessário fazer um reordenamento administrativo que poderá passar pela extinção de alguns concelhos e pela criação de outros. Não faz qualquer sentido que um concelho nasça por negligência ou por má gestão de executivos municipais, segregando uma parte do seu território. É escandaloso que um país, cujos recursos escasseiam, nomeadamente em sectores básicos como a saúde, a protecção social e educação,…possam ser delapidados por máquinas municipais mais preocupadas em eternizações de poder do que em gerir com racionalidade os dinheiros públicos. É verdade que as populações dos municípios novatos beneficiaram com a injecção de meios e de capital. Também é verdade que o país ficou mais pobre com essa obra administrativa porque se multiplicaram as lógicas onde cada um “puxa a brasa à sua sardinha”.

Desemprego de professores e o santíssimo mercado

Há muito tempo que os discursos sobre a “crise da educação” procuram abrir caminho a reformas orientadas para a criação de “quase-mercados”, que são vistos como um quadro de referência para a organização e gestão dos serviços públicos. A ideia da escassez de recursos, a necessidade de enformar a decisão política em critérios “racionais”, a reintrodução de modelos tayloristas na gestão de pessoal, etc., são domínios que caracterizam as relações de mercado e tornam-se referência para a definição de políticas públicas.

As políticas educativas, de emprego, económicas, etc., fazem parte de um programa que visa reduzir a prestação de serviços públicos em favor de serviços de financiamento privados. Ora, este programa que aparece plasmado nos programas dos governos das duas últimas décadas, quer se trate dos governos de direita, propriamente ditos ou não, está ligado a noções de liberdade, justiça, desigualdade e distribuição de recursos. O desemprego é, paradoxalmente, um bem para o sistema económico quando se crê na distribuição justa de recursos pelo mercado. O desemprego de professores observado nesta óptica, e na óptica da nossa ministra da educação, é um mal necessário. O Estado deve deixar que o mercado regule o desemprego. O Estado deve demitir-se da sua função reguladora e fechar os olhos ao livre mercado.

Percebo, mas não compreendo, as lágrimas de crocodilo derramadas pelos responsáveis políticos diante do drama de milhares de licenciados que foram enganados pelo santíssimo mercado.

O influente*

“O influente ordinariamente é proprietário; (…) Na véspera de eleições todos o vêem montado na sua mula, pelos caminhos das freguesias, ou, nos dias de mercado, misturado entre os grupos: fala, gesticula, grita, tem pragas e anedotas. Dispõe de 200 ou 300 votos: são os seus criados de lavoura, os seus devedores, os seus empreiteiros, aqueles a quem livrou os filhos do recrutamento, a bolsa do aumento de décima, ou o corpo da cadeia. A autoridade acaricia o influente, passa-lhe a mão por cima do ombro, fala-lhe vagamente no hábito de Cristo. Tudo o que ele pede é satisfeito, tudo o que ele lembra é realizado. As leis curvam-se, ou afastam-se para ele passar. As suas fazendas não são colectadas à justa: é o influente! Os criminosos por quem ele pede são absolvidos: é o influente! (…)

Quando o deputado proposto pelo governo é da localidade, o processo de acção é o mesmo; somente em lugar de ser unicamente realizado pela autoridade, é-o de acordo com o deputado: é disto que se diz: o governo protege-lhe a eleição. Isto é – auxilia com a pressão e corrupção que exercem as suas autoridades oficialmente, a pressão e corrupção, que o deputado (proprietário, ricaço, agiota) exerce particularmente.

Fazer aqui a enumeração das vergonhas, misérias, torpezas, vexações de uma eleição – isso, leitores honestos – estaria muito acima da vossa paciência –, se não estivesse muito abaixo da nossa dignidade!” (pp. 61-62)

*Eça de Queiroz

O que vale um valor?

Um campo de milho, em Silves, ao ser vandalizado por um grupo de jovens, fez germinar um caso de polícia.
O ministro da agricultura, esmerado nas suas funções, deslocou-se ao local do delito e não se coibiu de declarar à imprensa que o Ministério da Agricultura dará todo o apoio jurídico de que o agricultor necessitar. Não sei se me está a escapar algum dado importante no meio desta azáfama mediática, mas parece-me algo exagerado o envolvimento directo de um ministro num conflito particular. E porquê? Porque se a presença de um ministro no local do delito enfatiza o valor da propriedade privada, a ausência da ministra da educação (por exemplo) nos locais onde se verificaram violações à integridade física dos professores, não contribuiu em nada para reforçar o valor da dignidade humana, configurado no direito à segurança na actividade profissional.

Uma gargalhada…

… para o contorcionismo de Marques Mendes (evidenciado na recente visita à Madeira) e para a (in) coerência da ministra da Educação (que defendeu no parlamento a actuação da directora regional do Norte Margarida Moreira e do director de serviço que denunciou o professor Fernando Charrua).

“a gargalhada nem é um raciocínio, nem uma ideia, nem um sentimento, nem uma crítica: nem é o desdém, nem é a imaginação; nem julga, nem repele, nem pensa; não cria nada, destrói tudo, não responde por coisa alguma! E no entanto é o único inventário do mundo político em Portugal. Um governo decreta? gargalhada. Fala? gargalhada. Reprime? gargalhada. Cai? gargalhada. E sempre a política, aqui, ou pensando, ou criando, ou liberal, ou opressiva, terá em redor dela, diante dela, sobre ela, envolvendo-a, como a palpitação de asas de uma ave monstruosa, sempre, perpetuamente, vibrante, cruel, implacável – a gargalhada!
[…]
Oh política querida, sê o que quiseres, toma todas as atitudes, pensa, educa, ensina, discute, oprime, – nós riremos. A tua atmosfera é de chalaça!” Eça de Queiroz in Farpas (2004), Cascais: Principia