Poesia aplicada…

perrenoudPerrenoud será sempre uma referência incontornável da nossa vida escolar, ou não fosse o autor um guru do nosso referencial externo no processo de autoavaliação. Percorrer os textos de Perrenoud e imaginar a escola situada é um exercício poético imperdível, digo eu que não tenho qualquer sensibilidade poética.

Um dos livrinhos do autor que é de leitura obrigatória para quem ousa promover a mudança, a reforma, ou, não sendo o caso de mudar porque se quer crer que está tudo bem, manter as práticas pedagógicas diferenciadas e ativas, data de 2002 na sua versão portuguesa. A capa desse “guia de boas práticas” (para quem o quiser adquirir encontra-o num canto esquecido de uma livraria com saída) ilustra este pequeno apontamento.

Diz o autor que “O sistema educativo é ingovernável sem a adesão de, pelo menos, uma parte dos professores e dos utentes, pais e alunos”; que “Nas sociedades desenvolvidas, os poderes organizadores e o establishment político começam a compreender que não vale a pena tentar “domar” os professores”; que “a ausência de negociação não bloqueia, portanto, constantemente, as decisões, mas acaba sempre por as esvaziar do seu sentido…”. Perrenoud quer enfatizar a necessidade de uma pilotagem negociada da mudança. E uma verdadeira instância de pilotagem de uma mudança na escola situada consiste em ultrapassar as clivagens e os regateios habituais, para adotar uma visão coletiva.

Percebem agora porque considero que imaginar as ideias de Perrenoud aplicadas à escola situada pode constituir um exercício poético imperdível e… hilariante?

Já agora: ampliem a imagem e leiam tudo, porque vale a pena!

Privatizar a educação – fraude eleitoral

O PCP pediu hoje a presença do ministro da Educação no Parlamento para explicar as “verdadeiras intenções” do Governo em relação ao financiamento do ensino obrigatório, considerando que existe o risco de introdução de propinas.

(…)
Para o PCP, “não há dúvida nenhuma” de que o primeiro-ministro se referiu “à introdução do pagamento de propinas” na escolaridade obrigatória, disse o deputado Miguel Tiago, em declarações aos jornalistas no Parlamento.

Passos Coelho foi claro: advoga a supremacia dos princípios e mecanismos de mercado sobre os princípios de cidadania e financiamento democráticos da escola pública. Passos Coelho defende um modo de privatizar a educação pela via do aumento da percentagem de financiamento da escola pública pelas famílias.

Se não podemos dizer que estamos surpreendidos com a ideologia neoliberal do primeiro-ministro, podemos dizer que as medidas que agora vem defender com o pretexto de não haver dinheiro para sustentar o Estado Social não foram sufragadas pelo voto dos pacóvios que nele acreditaram, o que configura, a meu ver, uma fraude eleitoral.

Se Portugal tivesse Presidente República, o governo seria deposto!

Não se trata de uma refundação. É mais uma reestruturação… ou uma reculturação :)


Recomendação do Conselho Nacional de Educação

Mega-agrupamentos” fragilizam” autonomia das escolas

(…) No documento, a que o PÚBLICO teve acesso, e que aguarda ainda publicação em Diário da República, o CNE constata que a recente criação dos chamados mega-agrupamentos “tem vindo a criar problemas novos onde eles não existiam”.

São exemplo o “reforço da centralização burocrática dentro dos agrupamentos, o aumento do fosso entre quem decide e os problemas concretos a reclamar decisão” ou a “sobrevalorização da gestão administrativa face à gestão autónoma das vertentes pedagógicas”.

Ao ser desafiado por um colega a reanimar este cantinho, não podia escrever sobre outro tema: É que as culturas profissionais estão na ordem do dia, pelas piores razões.

Para quem acredita, como é o meu caso, que as culturas profissionais de colaboração, designadamente as culturas de colaboração que não dividem (não é o caso dos vários tipos de balcanização), mitigam alguns dos efeitos da intensificação do trabalho docente, não tem sido fácil encontrar terreno fértil na escola situada para deixar germinar algumas dessas sementes.

Elejo duas razões, embora existam inúmeras causas para a cultura do individualismo, que justificam o quadro descrito:

1ª Porque há sentimentos de culpa recalcados pelas dificuldades de lidar com a falta de tempo e pela sobrecarga de trabalho que conduzem muitos professores ao isolamento;

2ª Porque os padrões de sucesso da resistência dos professores contra as hostilidades do MEC estão orientados exclusivamente para os resultados imediatos, quando deviam orientar-se fundamentalmente para os processos.

Não se vislumbrando sinais de melhoria nas condições de trabalho, nem sendo expectável a alteração súbita da perceção de sucesso dos professores nas suas lutas contra a tutela, a solução contra esse isolamento perverso depende da criação de pequenas comunidades docentes que lutam nas escolas situadas pelo reforço do poder discricionário dos professores em certos domínios, cedendo o poder a outros parceiros em outros domínios, se necessário for, de modo a garantir a centralidade do pedagógico sobre o administrativo.

purga…

… para quando faltar o alento! Ainda vale a pena olhar para aqueles que não se resignam…

Quero É Viver

(Humanos)

Vou viver
até quando eu não sei
que me importa o que serei
quero é viver

Amanhã, espero sempre um amanhã
e acredito que será
mais um prazer

e a vida é sempre uma curiosidade
que me desperta com a idade
interessa-me o que está para vir
a vida em mim é sempre uma certeza
que nasce da minha riqueza
do meu prazer em descobrir

encontrar, renovar, vou fugir ou repetir

vou viver,
até quando, eu não sei
que me importa o que serei
quero é viver
amanhã, espero sempre um amanhã
eacredito que será mais um prazer

a vida é sempre uma curiosidade
que me desperta com idade
interessa-me o que está para vir
a vida, em mim é sempre uma certeza
que nasce da minha riqueza
do meu prazer em descobrir

encontrar, renovar vou fugir ou repetir

vou viver
até quando eu não sei
que me importa o que serei
quero é viver,
amanhã, espero sempre um amanhã
e acredito que será mais um prazer

_______

Adenda: Creio que não ficaram indiferentes à semiótica da letra da música 😉

À atenção dos iluminados do MEC

Quantas evidências empíricas serão necessárias para convencer pseudocientistas com responsabilidades governativas que a redução da carga horária da disciplina de Educação Física é nefasta ao desenvolvimento integral das nossas crianças e jovens?

Atividade física ajuda crianças com déficit de atenção e hiperatividade

(Estudo publicado no “Journal of Pediatrics”)

As crianças com déficit de atenção e hiperatividade têm um melhor desempenho escolar após a prática de 20 minutos de atividade de física, sugere um estudo publicado no “Journal of Pediatrics”.

Apesar de a maioria dos atuais tratamentos para o déficit de atenção e hiperatividade ter sucesso, muitos pais e médicos estão preocupados com os possíveis efeitos secundários dos mesmos, estando também os gastos com a medicação a aumentar.

Assim, este estudo mostra que a prática de exercício físico pode ser considerada uma ferramenta não farmacológica importante para este tipo de transtorno, a qual deveria ser recomendada pelos psicólogos. (continuar a ler)

Manual de sobrevivência…

Fiquei indignado quando li um documento emanado do MEC explicando aos professores como se dirige uma reunião de trabalho entre pares. Foi uma espécie de manual para totós que supostamente pretendia minimizar os efeitos da intensificação do trabalho docente que surgiu animado pela avaliatite. Era um tempo em que recusava a ideia de que os professores devessem ser tratados como meros operários da educação, porque não eram acéfalos, porque eram intelectuais livres do pensamento. Aquilo era um manual para diretores de turma, delegados de grupo e coordenadores excessivamente zelosos que esticavam as reuniões até ao limite da paciência de um santo. A ideia do MEC seria o combate ao formalismo e ao esquematismo que faziam escola nesse tempo mas que ainda não desapareceram das práticas de alguns professores.

Hoje ficaria menos indignado!…

Mudam-se os tempos…

Por que vale a pena lutar?

Michael Fullan e Andy Hargreaves, fizeram publicar em 1991, no Canadá, um texto que ainda considero atual. Por que vale a pena lutar? aclara o modo como podemos transformar as escolas em lugares atrativos  e gratificantes e aborda as formas de introduzir alterações significativas  na vida quotidiana e na experiência de cada vez mais docentes, diretores de escolas e alunos.

Havia muito a dizer sobre o livro e, fundamentalmente, sobre as questões que ele suscita. Quem o leu sabe bem do que falo e para quem não o leu aconselho vivamente a leitura, até porque não pretendo reduzir e empobrecer o seu conteúdo a meia dúzia de linhas soltas.

Hoje, as circunstâncias que marcam o nosso quotidiano são extremamente conflituantes e potencialmente tensas. Há dois tipos de exaustão que, nas palavras dos autores, provoca efeitos opostos nos professores: o primeiro decorre das batalhas solitárias, dos esforços não reconhecidos, da perda de terreno e de um sentimento crescente e corrosivo de impotência; o outro tem a ver com aquela espécie de cansaço total que acompanha o trabalho duro enquanto membro de uma equipa, um reconhecimento crescente de que se está envolvido numa luta que vale a pena travar e de que aquilo que se está a fazer tem um efeito crítico junto de uma criança ou de um colega desanimado. Com o tempo, o primeiro tipo de exaustão faz sentir os seus efeitos sobre a motivação do docente mais entusiasta; o segundo tem a sua própria reserva interna que nos permite recuperar após uma boa noite de sono. Na realidade o primeiro tipo provoca ansiedade e insónias, enquanto o segundo induz o descanso e a regeneração das energias.

Pergunta retórica: será o nosso dispêndio de esforço inglório ou vantajoso?

Dependerá de cada um de nós, embora a solução não dependa exclusivamente de nós. São os indivíduos e pequenos grupos de professores e de diretores que terão de criar as culturas profissionais que desejam.

Ora, quem lê criticamente as caixas de comentários dos blogues mais frequentados, quem for capaz de observar com distanciamento as lutas inter geracionais de docentes de teor autofágico, percebe que nós temos a solução, que nós somos a solução!

Sem esta consciência de classe, sem entendermos que este é o ponto de partida, não há plano de ação que nos valha, por mais assertivo que ele nos pareça.

Tiro o meu chapéu ao grupo parlamentar do PCP porque…

… Recomenda ao Governo a manutenção da carga letiva da disciplina de Educação Física no currículo do 3º ciclo do ensino básico e do ensino secundário e a valorização do desporto escolar.

A Constituição da República Portuguesa (CRP) consagra no seu artigo 70.º que “Os jovens gozam de proteção especial para a efetivação dos seus direitos (…) nomeadamente na educação física e no desporto”; no artigo 73.º da CRP que “todos têm direito à educação e à cultura” e que para tal “o Estado promove a democratização da educação e as demais condições para que a educação, realizada através da escola e de outros meios formativos”, e também no artigo 79.º que “todos têm direito à cultura física e ao desporto” incumbindo ao Estado “em colaboração com as escolas promover, estimular, orientar e apoiar a prática e a difusão da cultura física e do desporto”.

No mesmo sentido a Lei de Bases do Sistema Educativo, no nº 5 do artigo 51.º, reconhece a importância do Desporto Escolar com o qual “visa especificamente a promoção da saúde e condição física, a aquisição de hábitos e condutas motoras e o entendimento do desporto como fator de cultura (…) salvaguardando-se a orientação por profissionais qualificados”.

O Decreto-Lei n.º 95/91, de 26 de Fevereiro, define como objetivos da Educação Física e Desporto Escolar a “formação integral dos alunos na diversidade dos seus componentes biofisiológicos, sociais e axiológicos, através do aperfeiçoamento das suas aptidões sensoriomotoras, da aquisição saudável da condição física e do desenvolvimento correlativo da personalidade nos planos emocional, cognitivo, estético, social e moral”, e a “prática de atividades corporais, lúdicas e desportivas”. A Educação Física e o Desporto Escolar desempenham ainda um papel fundamental na “ integração e na reabilitação de alunos portadores de deficiências e de necessidades educativas especiais”.

Entendemos por isso que é determinante fazer cumprir o papel da escola pública de qualidade, através da garantia das condições materiais e humanas necessárias e do elevado nível de enquadramento técnico-pedagógico para cumprir o imperativo constitucional de efetivação dos direitos sociais e culturais na educação física e no desporto de crianças e jovens.

A Educação Física e o Desporto Escolar assumem um papel central na garantia da formação da cultura integral do individuo, bem como em dimensões de projetos de combate ao abandono e ao insucesso escolar. O Desporto Escolar abrange largos milhares de alunos, que na sua esmagadora maioria têm nesta atividade a sua única oportunidade de prática desportiva formal e gratuita.

A disciplina de Educação Física assegura a milhares de crianças e jovens uma primeira experiência planificada e sustentada com a atividade física regular nas suas múltiplas dimensões, lúdica e formativa. Aliás, vários estudos científicos justificam mesmo que a prática regular e contínua do exercício físico nos jovens é fator determinante para o aumento do sucesso escolar.

Assim, nos termos e ao abrigo da alínea b) do artigo 156.º da Constituição e da alínea b) do n.º 1 do artigo 4.º do Regimento da Assembleia da República, os Deputados abaixo assinados do Grupo Parlamentar do PCP, apresentam o seguinte Projeto de Resolução:

A Assembleia da República resolve, nos termos do n.º 5 do artigo 166.º da Constituição da República Portuguesa, recomendar ao Governo que:

– Suspenda imediatamente as matrizes curriculares definidas pelo Ministério da Educação e Ciência e enviadas às escolas, alterando correspondentemente o Despacho Normativo n.º 13-A/2012, de 5 de Junho;

– Mantenha a carga horária da disciplina de Educação Física e incremente a disponibilidade de componente de horário de professores prevista para o Desporto Escolar, afeta à componente letiva;

– Considere que a disciplina de Educação Física deve continuar a ser considerada como disciplina a integrar as médias globais do aluno;

– Valorize a Educação Física e o Desporto Escolar, garantindo a sua universalização e a existência de meios materiais e infraestruturas em todas as escolas adequadas aos currículos de Educação Física, assegurando que nenhuma modalidade programática deixa de ser lecionada com a dignidade merecida;

– Que alargue a componente letiva do horário de professor e créditos das escolas para Desporto Escolar e assegure o pagamento das despesas inerentes à realização de atividades e deslocações no âmbito do Desporto Escolar.

 

Assembleia da República, 28 de Junho de 2012

Os Deputados,

RITA RATO; MIGUEL TIAGO; JOÃO OLIVEIRA; JERÓNIMO DE SOUSA; BRUNO DIAS; JORGE MACHADO; BERNARDINO SOARES; JOÃO RAMOS; HONÓRIO NOVO; ANTÓNIO FILIPE

O negócio das metas…

Mais Sucesso Escolar: 14 agrupamentos desistem por insucesso

Metas contratualizadas no programa não foram atingidas

Catorze agrupamentos/escolas dos 123 selecionados para o Programa Mais Sucesso Escolar (PMSE) desistiram do projeto por «não terem atingido as metas de sucesso contratualizadas», segundo um relatório do Ministério da Educação, que será divulgado nesta sexta-feira.

A investigação sobre o rendimento educativo identifica um conjunto de variáveis que podem explicar os resultados na educação: variáveis que se referem a fatores não ligados diretamente ao sistema educativo ou às escolas (variáveis relacionadas com as condições sociais e económicas em que decorre a ação educativa) – variáveis extrínsecas; e variáveis ligadas a fatores diretamente relacionados com o funcionamento do sistema educativo (variáveis relativas à organização do sistema educativo, aos processos de ensino e aprendizagem na sala de aula e na escola) – variáveis intrínsecas. Não sei se por voluntarismo ou por conexões partidárias que agitaram alguns diretores nas anteriores legislaturas, houve escolas que  negociaram o sucesso escolar. É importante que a investigação analise o fenómeno e nos ajude a perceber o efeito e a interdependência de cada uma dessas variáveis no rendimento educativo, por razões óbvias. Mas isso é uma coisa. Outra coisa bem distinta é pensar ser possível garantir o sucesso escolar só porque existe um aparente controlo sobre algumas das variáveis intrínsecas. Quero acreditar que foi a partir desta presunção equívoca que um conjunto de escolas contratualizou as metas de sucesso…
Ainda há males que vêm que bem!

Alunos e docentes a monte… e aos montes

Artigo 48º

Administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino

 3 – Na administração e gestão dos estabelecimentos de educação e ensino devem prevalecer critérios de natureza pedagógica e científica sobre critérios de natureza administrativa.

(LEI DE BASES DO SISTEMA EDUCATIVO – Lei Nº 46/1986, de 14 de Outubro)

Lema que devia vincular todos os econometristas do MEC.

Articulação curricular ou perda de autonomia docente?

Será desta que o MEC vai dar o exemplo na tão ambicionada articulação curricular? Ou a ideia é condicionar ainda mais o espaço de liberdade dos professores e das escolas na abordagem aos programas das diferentes áreas disciplinares?

Foi criado mais um grupo de trabalho cuja missão principal é a definição das Metas Curriculares. O objetivo deste grupo é a identificação de forma clara: dos conteúdos fundamentais que devem ser ensinados aos alunos; A ordenação sequencial ou hierárquica dos conteúdos ao longo das várias etapas de escolaridade; Os conhecimentos e capacidades a adquirir e a desenvolver pelos alunos.

Revisão curricular – Grupos/Turmas de nível – Remate

É evidente que o MEC não deseja a criação de turmas de nível. Ficaria muito caro e comprometeria a retórica oficial do cratês useira da falácia “fazer mais com menos”. Como diria a vendedora no mercado do Bolhão: “bom e barato? No olhinho do **, minha senhora”.

Creio que não existe um consenso alargado sobre o significado e alcance do conceito turmas de nível. Há quem as veja como uma forma de legitimar a segregação classista que é realizada, de modo camuflado obviamente, em algumas escolas públicas (turmas de uma pseudo elite paroquial). Há quem as veja, como é o meu caso, como uma aplicação natural da pedagogia diferenciada, aquela pedagogia que olha para o aluno como sujeito único, idiossincrático.

É evidente que o MEC não está interessado em reforçar o crédito global de horas das escolas – Um dos pré-requisitos para a oferta multilateral de atividades letivas…

É evidente que a discussão em torno da criação de turmas de nível emerge de uma medida inscrita no comunicado do MEC, relativo à revisão curricular:

implementar medidas que incrementem a igualdade de oportunidades, de homogeneidade relativa em disciplinas estruturantes, ao longo de todo o Ensino Básico, atendendo aos recursos da escola e à pertinência das situações

Acham mesmo que o MEC deseja algo de substantivo com esta medida?

A ideia velada que subjaz à criação de grupos/turmas de nível (o linguajar oficial fala em incrementar a igualdade de oportunidades e a homogeneidade relativa em disciplinas estruturantes) é unicamente a intensificação do treino nas disciplinas de Matemática e Português. Desde que não se estiquem nos recursos da escola…

A  vendedora do Bolhão é que está certa!

Revisão curricular – Grupos/Turmas de nível

A recente alteração curricular abre caminho, pelo menos na discussão blogoEsférica, à criação de turmas de nível.

O tema não é novo e a prática também não. A criação das turmas CEF’s não é mais nem menos do que uma forma de agrupar alunos com percursos escolares errantes. Constituídas por alunos com reconhecidas dificuldades de aprendizagem, as turmas CEF’s são turmas de nível. No ensino secundário, os cursos profissionais servem os mesmos propósitos: albergar os alunos que não encontram qualquer sentido nos cursos orientados para o prosseguimento de estudos. Claro que muitos destes alunos também não encontram qualquer sentido nos cursos profissionais, mas isso conduzir-nos-ia a outra conversa…

A criação de turmas não é um processo neutro sob o ponto de vista da classificação das aprendizagens. O modelo de escola pública instituído normalizou a diferenciação dos alunos agrupando-os vertical (anos de escolaridade) e horizontalmente (turmas). Se o modo vertical de agrupar alunos parece não suscitar grande controvérsia (a exceção é a criação de turmas de repetentes), o mesmo não se poderá dizer quando há diferenciação horizontal (no mesmo ano de escolaridade).

Admitamos que é possível seriar e agrupar alunos no mesmo ano de escolaridade em função das suas capacidades (cognitivas, psicomotoras, sociais,…). Omitamos as incongruências que advêm do facto de se pretender homogeneizar singularidades:

Como resolver o problema das diferenças de aptidão? Um aluno integrado numa turma «+» a Inglês pode integrar uma turma «–» a Matemática ou Educação Física?

Nesta matéria concordo com o Paulo Guinote: Há muito tempo que os grupos de nível estão oficializados. Até dentro da mesma turma! Sim, há muito tempo que os professores de Educação Física (agora vou afunilar só para não meter a foice em seara alheia) constituem grupos de nível. Há alunos que se encontram em determinada matéria num nível introdutório e noutras matérias do mesmo programa esses alunos encontram-se no nível avançado. Não existe qualquer obstáculo conceptual à criação de grupos de nível. O problema existe no domínio operacional.

Aplaudo sem reservas a criação de turmas de nível desde que sejam sustentadas por critérios de equidade e sem estigmatizar capacidades e inteligências humanas.

Modelo ideal de professores – Entre o funcionalismo e a profissão liberal

Ao contrário do que pensa o Paulo Guinote, creio que a minha visão de professor não deve estar assim tão afastada da sua.

Julgo que António Nóvoa, discorrendo sobre o processo de profissionalização do professorado, acaba por delimitar muito bem os limites do nosso aparente desacordo. Nóvoa considera que “a funcionarização deve ser encarada como uma vontade partilhada do Estado e do corpo docente. E o modelo ideal de professores situa-se no meio caminho entre o funcionalismo e a profissão liberal: ao longo da sua história sempre procuraram conjugar os privilégios de ambos os estatutos.”

Não ignorando que esta afirmação encerra um evidente oportunismo, direi histórico, da profissão docente, que nos daria pano para mangas, é inequívoco o posicionamento dual dos professores.

Se há funcionalismo, é normal que os sindicatos de professores assumam a defesa dos seus profissionais face aos empregadores, não se diferenciando nesta matéria de outras associações sindicais. E à medida que regride o estatuto socioeconómico dos professores, os movimentos sindicais clássicos acabam por ver reforçado o papel dos seus aparelhos. Correndo o risco de parecer incoerente com o que tenho defendido aqui, considero que a crescente importância dos sindicatos de professores acaba por revelar a pujança de uma visão funcionarizada da profissão, que é de todo indesejada. O corte com esta visão proletarizada da profissão docente requer um projeto de autonomia profissional responsável e exigente e uma cultura profissional assente num conjunto de regras éticas que pautem as relações com outros atores educativos e que impeçam a consagração de teorias que fomentam as desigualdades sociais.

São necessários projetos de autonomia das escolas e a reconfiguração da profissão docente.

Quanto à falta de projetos de autonomia, a proliferação de “tiranetes” na gestão escolar não recomenda o autogoverno das escolas; Quanto à reconfiguração da profissão, não é possível recriar a profissão docente sem questionar o modelo de formação e, fundamentalmente, sem reforçar o estatuto socioeconómico dos professores para que cada um defina os percursos da sua carreira.

A falácia do rigor e da exigência

imageForam publicados os pré-requisitos exigidos para a candidatura à matrícula e inscrição no ensino superior. No que toca aos cursos de desporto, há cursos que exigem a realização de provas de aptidão funcional, física e desportiva.

Como sabem, há alguns anos a esta parte e sem uma razão sólida que o fundamentasse, os cursos de desporto orientados para o prosseguimento de estudos em desporto saíram do ensino secundário. E como o nível de exigência dos programas de educação física nas escolas situadas não tange os requisitos exigidos por uma grande parte das instituições de ciências do desporto, aos alunos de desporto não lhes resta outra alternativa a não ser o mercado paralelo. E não me refiro ao mercado das explicações, mais ou menos declarado, que acolhe a maioria dos alunos que necessitam de treino intensivo nas disciplinas sujeitas a exame nacional. Refiro-me a conteúdos de ensino que podem não fazer parte dos programas de educação física situados porque, como julgo que devem saber, é necessário escolher e optar o que pode ser ensinado em cada escola face ao leque muito alargado de atividades físicas desportivas que fazem parte dos programas nacionais.

O Ministério da Educação e Ciência (MEC) devia garantir a equidade no acesso ao ensino superior. A Comissão Nacional de Acesso ao Ensino Superior (CNAES) devia verificar se os pré-requisitos são ou não exequíveis.

Duas duas três:

Ou o MEC recria, nos cursos científico-humanísticos, uma área de opção em desporto;

Ou a CNAES (atendendo à presumível articulação vertical do sistema educativo como justificar que na constituição da CNAES não exista um representante do ensino básico e secundário?) impede os pré-requisitos inexequíveis;

Ou estamos a falar de rigor e de exigência à la crate.

Neotayloristas

Há alguns anos atrás fui inquirido por um inspetor, durante uma ronda de entrevistas num painel de docentes no âmbito da avaliação externa da escola, sobre os pontos fortes do NOSSO projeto educativo.

A pergunta direta exigia uma resposta pronta. É evidente que conhecia o teor do projeto educativo, do regulamento interno, dos planos anual e plurianual de atividades, enfim, usando o linguajar tecnocrata, conhecia todos os instrumentos do exercício da autonomia reclamada ou a reclamar pela minha escola. Mas não tinha uma resposta pronta. Não sabia como sumular essa complexidade. Precisava de referentes e atirei uma pergunta para me situar na resposta:

Qual é o ponto forte do projeto educativo nacional?

Iriam imergir na lei de bases do sistema educativo para encontrar a resposta? Seriam capazes de me elucidar sobre a ideia de escola que lhe subjaz?

Como elaborar projetos educativos locais se não reconhecermos as traves mestras do projeto educativo nacional?

A conversa foi desembocar num baldio, numa terra de ninguém, naquele território onde os documentos oficiais ficcionam a realidade.

Isto vem a propósito da ideia peregrina que emerge das declarações do presidente do Conselho das Escolas que olha para a escola como se fosse uma coutada do diretor.

«O presidente do Conselho das Escolas diz não perceber os receios dos sindicalistas, ao temerem a falta de democracia, perante um modelo que actualmente entrega aos directores o poder de nomear as chefias das estruturas intermédias: “Os sindicalistas têm esta mania que nós só queremos yes boys a trabalhar connosco. É uma ideia profundamente errada, mas também não podemos nomear docentes que estão, por exemplo, contra a visão que temos sobre o projecto educativo da escola ou do agrupamento do qual somos responsáveis.”»

Por que temem a gestão democrática?

Ainda escrevi umas linhas para dizer quão obtuso é o modelo de gestão escolar que agora surge remendado pelo ministro Nuno Crato. O referencial democrático que devia enformar a organização escolar desapareceu e a escola corre o risco de perder uma das suas funções mais importantes: a fundamentação e difusão da democracia.

Entretanto o Paulo publicou este texto.

OS DUALISMOS E A GESTÃO ESCOLAR

Fiquei mais aliviado!

Reforço da Educação Física – Uma questão de equidade e de equilíbrio na oferta curricular.

A proposta do conselho de escolas que aponta para um reforço da disciplina de Educação Física é um exercício de lucidez!

1. Porque a amplitude, complexidade e profundidade dos conteúdos programáticos, que decorrem dos objetivos que foram estabelecidos e dos pressupostos materiais e pessoais condizentes, requerem um alargamento do horário semanal da disciplina de Educação Física que se deve aproximar de uma hora diária da prática desportiva. O contexto de vida aconselha a extensão da Educação Física escolar!

2. É verdade que a decisão político-administrativa de reajustar as cargas horárias das disciplinas escolares é difícil porque os ganhos de umas disciplinas revertem em prejuízo de outras. Se é um dado inquestionável que todas as disciplinas são importantes pela especificidade dos seus conteúdos, importa perceber se há ou não redundância na estimulação das múltiplas inteligências. Se há disciplinas em excesso face ao tempo disponível, terá de ser este o único critério a determinar a diminuição ou alargamento do tempo adstrito à cada disciplina escolar. Ora, sabendo que a Educação Física escolar é a única disciplina que visa preferencialmente a corporalidade, é difícil de perceber as razões pelas quais o sistema educativo maltrata o corpo e porque rejeita as oportunidades de educação e formação que o corpo proporciona.

Serviço público versus serviço privado

“Os pais de Joana, uma menina de nove anos que precisa de terapia da fala, puderam até agora usar uma sala da escola Básica Vasco da Gama, em Lisboa, que a criança frequenta, para esta ter sessões com a terapeuta duas vezes por semana, mas na semana passada receberam uma mensagem de correio eletrónico da diretora do Agrupamento Eça de Queiroz a informá-los de que a partir de agora terão que pagar dez euros por cada hora que a sala seja utilizada.”

Sem demagogia, vamos aos factos:

1. A menina precisa de terapia da fala e a escola não tem terapeuta da fala;

2. Os pais da menina recorrem a um serviço privado e contratam uma terapeuta;

3. Os pais da menina solicitam à escola a cedência de uma sala para o serviço;

4. A escola aluga uma sala aos pais da menina para que o serviço privado seja realizado;

Deve a escola pública patrocinar serviços privados?

Observada a questão numa ótica mercantil é óbvio que dinheiros públicos não devem servir para patrocinar serviços privados. A escola fez o que devia.

Observada a questão numa ótica de serviço público, de um serviço social de apoio às crianças e jovens com necessidades educativas especiais, a escola pública não é uma empresa e as lógicas de serviço público têm outro quadro de referência: a pedagogia. A escola não fez o que devia.

Decidam-se: Não podemos ter sol na eira e chuva no naval!

Revisão da estrutura curricular – Prevaleceu a lógica política imediatista.

Como se lê no documento divulgado ao fim da tarde, O Ministério da Educação e Ciência apresenta a revisão curricular, dando assim início a um período de consulta pública. Desconheço se foi apresentada a metodologia do processo de consulta e a respetiva calendarização. Para que este retalho de reforma se substantifique é necessário que a consulta pública não passe de uma mera operação de cosmética política só para pacóvio ler na imprensa. Emerge daqui a minha primeira questão:

Como se irá mobilizar o País para a educação?

Pelo modo segregacionista como se trataram as organizações sindicais, a questão parece ter encontrado já resposta.

Há, no entanto, outras questões que me ocupam mais o pensamento e que remetem para as lógicas políticas que subjazem a transformações profundas na educação. O documento apresentado reflete uma lógica política imediatista, de curto prazo. Ora, não basta prometer que “a etapa de revisão da estrutura curricular que agora se inicia abre caminho a reformas curriculares mais profundas que permitirão melhorar significativamente o ensino das disciplinas fundamentais.” Importa aclarar:

Que reformas profundas são essas? Quais as condições de sucesso de uma reforma tecnocrática e de que modo este tipo de reforma serve os interesses do desenvolvimento integral do homem? Está já anunciada uma mudança na Lei de Bases do Sistema Educativo? Será que essa alteração vai fazer tábua rasa das condicionantes e das dificuldades encontradas em 86?

Por último, não posso ficar indiferente à manifesta ingenuidade deste MEC que julga ser possível atingir resultados qualitativos na educação por decreto, sem envolver os professores, agentes centrais de qualquer mudança no sistema de ensino. Foi insensato abrir este capítulo ignorando a escola situada.

Nuno Crato parece não ter aprendido nada com o passado recente!…

A luta dos professores e a negação da individualidade

Para compreender este comentário, necessita de ler este texto muito certeiro do Luís.

O individualismo como cultura organizacional é, a meu ver, a negação da individualidade. Enquanto o individualismo significa atomização social, a individualidade implica independência e realização pessoal. Há muito tempo que os professores cultivam hábitos do individualismo o que revela ausência de uma ética do cuidado com os outros. Maria de Lurdes Rodrigues, pelas piores razões, acabou por fazer despertar essa ética e nunca estivemos profissionalmente tão perto de uma cultura de colaboração na escola situada. Agora regressamos ao passado, com a agravante de capitularmos perante a opinião pública e perante nós próprios, fazendo perigar a nossa individualidade. Adivinham-se tempos em que emergem sentimentos de culpa e agora, mais do que nunca, os professores mais lúcidos e mais assertivos precisam de ligar as pontas, criando culturas de colaboração, a bem da sanidade mental de todos.

Uma noite bem passada

Ontem à noite, num gesto de grande coragem (porque é mais fácil guardar a sete chaves as opções metodológicas dentro da sala de aula), a direção da escola da minha petiza convocou os pais para lhes explicar por que razão foi adotada a metodologia de aprendizagem cooperativa. Foram explicadas as bases desta metodologia e a ideia que importa relevar é o desenvolvimento das inteligências interpessoal, intrapessoal, e linguísticas, normalmente subvalorizadas em metodologias de ensino mais diretivas.

Pelo que me foi dado observar, a maioria dos pais saíram sossegados, mesmo aqueles que vivem mais obcecados com as lógicas da campeonite que tomaram conta do ensino secundário.

Mas senti a falta dos cratenses e dos seus fantasmas…

Fiabilidade dos resultados ou faço-de-conta que desconheço?

Declaração de interesses: Não tenho qualquer preconceito contra a iniciativa privada ou contra a oferta privada na educação. Fiz o 1º ciclo do EB numa escola pública; já no período pós-revolucionário realizei o 3º ciclo e o secundário numa escola privada, com contrato de associação, beneficiando da proximidade da minha residência; fiz a licenciatura e o mestrado numa universidade pública.

Sou professor em exclusividade (que, ao contrário da classe médica, não garante nenhum acrescento no salário) numa escola pública e, durante um ano lectivo, em meados da década de 90, trabalhei em regime de acumulação numa escola privada com contrato de associação.

Nada me move contra as escolas privadas!

Os rankings são construções mentais falaciosas que podem servir de pretexto para muita coisa, designadamente, a promoção dos mercados educativos, mas pouco ou nada esclarecem sobre a instituição. Se há medida que urge tomar no ME, e que devia ser defendida por todos, especialmente, os econometristas do sucesso (como muito bem os designou Santana Castilho), era um pedido de inspecção a todos os estabelecimentos de ensino colocados nos primeiros lugares dos rankings.

Se valorizam tanto o mercado educativo, os arautos neoliberiais da nossa praça deviam pugnar pela transparência e reclamar que, pelo menos durante um ano lectivo, a IGE enviasse equipas residentes para os estabelecimentos de ensino de forma a aferir as circunstâncias que determinam o sucesso dos seus alunos em exames nacionais. A presença de equipas da IGE no terreno dissuadiria os prevaricadores e aclararia o “modus operandi” do sucesso. É bem provável que houvesse algumas surpresas. E estou mesmo convencido que aqueles que agora embandeiram em arco pelo modo como as “privadas” chegaram ao topo da classificação seriam bem menos contidos na exaltação no próximo ano.

Uma reforma cobarde ou uma reforma de cobardes?

«Actualmente, em Portugal, o discurso da “dramatização da crise” é dominante, principalmente nas intervenções oriundas de sectores exteriores ao sistema educativo (empresários, jornalistas e economistas) que se reclamam como intérpretes privilegiados das exigências e dos desafios que resultam da “globalização” e da “competição nos mercados internacionais”, e que, em geral, encontram eco nos partidos situados à direita do espectro político. Os principais alvos desse discurso são: o Estado (e o controlo que exerce sobre o funcionamento do sistema educativo); as Ciências da Educação (e as responsabilidades que teriam tido na situação a que se chegou com as sucessivas “experiências pedagógicas” e “reformas educativas” ensaiadas, em particular, durantes os governos do Partido Socialista); os professores e os seus sindicatos (considerados como principais beneficiários e defensores de um sistema dominado por interesses corporativos). As receitas propostas para “sair da crise” são, em geral, as mesmas: redução (e progressiva extinção) do papel do Estado na educação, com a consequente privatização da escola pública; prioridade às reformas de gestão (inspiradas na gestão empresarial) e subordinação das preocupações pedagógicas aos critérios de eficiência e qualidade, definidos segundo uma lógica do mercado; redução dos poderes dos professores e dos seus sindicatos com a “abertura à sociedade civil” corporizada no aumento da influência dos pais e das empresas na configuração da oferta educativa e sua gestão.

(…) Importa lembrar, contudo, que as perspectivas e soluções propostas por estes críticos não passam de réplicas descontextualizadas de posições e iniciativas adoptadas, desde há algum tempo, em outros países e sobre as quais existe hoje uma discussão fundada em investigação consistente e empiricamente sustentada, embora insuficiente.»

João Barroso (2003). A Escola Pública – Regulação, Desregulação e Privatização. Porto. Edições ASA.

Sem surpresa, os Ramiros da blogosfera e a imprensa de direita repetem velhos chavões e ressuscitam decrépitos fantasmas. O discurso sobre a crise da educação emerge do discurso sobre a crise das finanças públicas e serve de pretexto para mudanças anacrónicas na educação utilizando-se as mesmas receitas, como lembra João Barroso.

Contudo, e ao contrário do que sucedeu no passado, a discussão não se desenvolve num plano ideológico. As receitas do costume são apresentadas como inevitáveis face às contingências de uma Troika que serve de guarita a todo o tipo de cobardes.