Aprende-se para os exames ou fazem-se exames para aprender?

Se há área do conhecimento onde me sinto confortável essa área é a do treino. E por que razão invoco um argumento de autoridade para me referir aos exames nacionais? Porque é possível estabelecer uma analogia entre o treino desportivo e o treino dos exames. Quem pensa que sabe alguma coisa do treino desportivo para crianças e jovens está seguro de que ele difere do treino dos adultos. Quer o treino, quer a competição (ela própria uma elemento a ter em conta no processo de treino), visam objectivos distintos quando se dirigem aos adultos. É recorrente dizer-se que as crianças e jovens competem para o treino enquanto os adultos treinam para as competições.

Do mesmo modo que as competições ocupam um lugar especial no processo de treino das crianças e jovens, na justa medida em que as competições não são um fim em si mesmo, os exames são, pela mesma ordem de razões, elementos coadjuvantes no processo de aprendizagem, nunca se constituindo um fim em si mesmo.

Isto vem a propósito do delírio causado pela defesa dos exames nacionais como panaceia para a melhoria das aprendizagens. O Ramiro considera que mais exames e mais testes intermédios suscitariam melhores resultados nos PISA. Seria um caso merecedor de estudo se assim não fosse. O problema não se coloca tanto ao nível dos efeitos do treino intensivo nos resultados competitivos de curto-prazo. O problema que deve merecer a reflexão de todos nós coloca-se ao nível das perdas que resultam da aplicação de um treino intensivo precoce. Como o tempo é finito e escasso quando se trata de suscitar o desenvolvimento integral das crianças e jovens, que capacidades deixam de ser estimuladas pelo facto de se reduzir o treino das inteligências ao treino das habilidades solicitadas por uma dada competição?

4 thoughts on “Aprende-se para os exames ou fazem-se exames para aprender?

  1. Pois, Miguel. Mas nem é só por o tempo ser escasso que o treino para exames reduzirá (nalguns casos eliminará) o “treino das inteligências”. Por um lado, se essa malfadada ideia de introduzir exames nos dois primeiros ciclos for por diante, resta saber que peso terão as notas do exame em relação às notas da avaliação interna, pois, se tiverem um peso decisivo, nem o professor mais independente se atreverá a não treinar, treinar, com receio de prejudicar os alunos; por outro lado, mesmo que o peso não seja grande, haverá muitos professores que se preocuparão mais com a sua própria imagem face aos resultados dos seus alunos nos exames, do que com o que mais importa sobretudo na matemática desses ciclos, que é o desenvolvimento das capacidades intelectuais que o treino de modo nenhum faz.
    Resta a esperança de que não vão por aí porque há que economizar e os exames custam mais dinheiro (as provas de aferição, que não contam para os resultados do aluno, já permitem uma aferição do sistema, e até podiam passar a fazer-se por amostragem). Resta também a esperança de que não escolham para ministro da educação o pior dos nomes que a comunicação social tem tentado adivinhar: Nuno Crato. Aliás , se tal acontecer, tenho dados para um forte ataque num post que, ao menos passado para o FaceBook, tem alguma visibilidade.
    Por agora, estou em tempo de espera (espera para ver)

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