O Oportunismo

“O oportunismo é, porventura, a mais poderosa de todas as tentações; quem reflectiu sobre um problema e lhe encontrou solução é levado a querer realizá-la, mesmo que para isso se tenha de afastar um pouco de mais rígidas regras de moral; e a gravidade do perigo é tanto maior quanto é certo que se não é movido por um lado inferior do espírito, mas quase sempre pelo amor das grandes ideias, pela generosidade, pelo desejo de um grupo humano mais culto e mais feliz. Por outra parte, é muito difícil lutar contra uma tendência que anda inerente ao homem, à sua pequenez, à sua fragilidade ante o universo e que rompe através dos raciocínios mais fortes e das almas mais bem apetrechadas: não damos ao futuro toda a extensão que ele realmente comporta, supomos que o progresso se detém amanhã e que é neste mesmo momento, embora transigindo, embora feridos de incoerência, que temos de lançar o grão à terra e de puxar o caule verde para que a planta se erga mais depressa.

Seria bom, no entanto, que pensássemos no reduzido valor que têm leis e reformas quando não respondem a uma necessidade íntima, quando não exprimem o que já andava, embora sob a forma de vago desejo, no espírito do povo; a criação do estado de alma aparece-nos assim como bem mais importante do que o articular dos decretos; e essa disposição não a consegue o oportunismo por mais elevadas e limpas que sejam as suas intenções: vincam-na e profundam-na os exemplos de resistência moral, a perfeita recusa de se render ao momento. Depois, tempo virá na Humanidade – para isso trabalham os melhores – em que só hão-de brilhar os puros valores morais, em que todos se voltarão para os que não quiseram vencer, para os que sempre estacaram ante o meio que lhes pareceu menos lícito; eis a hora dos grandes; para ela desejaríamos que se guardassem, isentos de qualquer mancha de tempo, os que mais admiramos pela sua inteligência, pela sua compreensão do que é ser homem, os que mais destinados estavam a não se apresentarem diminuídos aos olhos do futuro.
Agostinho da Silva, in ‘Textos e Ensaios Filosóficos’

Uma questão de flexibilidade…laboral

Da versão preliminar do relatório de análise dos resultados ao inquérito sobre as condições de exercício da actividade docente realizado pelo grupo parlamentar do BE destaco duas conclusões aparentemente irrefutáveis:

1. Os professores são explorados
Os docentes despendem, em média, 46 horas semanais no exercício da sua profissão (incluindo aulas, reuniões, actividades de direcção de turma, preparação de aulas na escola e em casa, correcção de provas, etc.). Cerca de 20% do tempo despendido no total de actividades de docência corresponde a trabalho realizado em casa.

2. Os professores são mal tratados
A avaliação das condições de trabalho ao nível das infra-estruturas existentes é muito negativa, não só em relação a espaços menos desadequados (como a Sala de Professores e a Biblioteca), mas sim quanto à generalidade dos espaços para realizar trabalho individual na escola.

Olhemos para este problema no quadro da revisão do código de trabalho e, sobretudo, na ideia de flexibilidade aplicada ao horário de trabalho. E se quisermos ir um pouco mais longe, pensemos na alteração do conteúdo ocupacional dos professores no sentido do incremento das funções de administração e gestão e função de extensão educativa (actividades de custódia), e na desvalorização das funções de docência e de investigação.
O que vemos?
Vemos o professor idealizado pelo professor João Freire e transfigurado no novo ECD [o PGuinote tem publicado alguns excertos desse famigerado estudo].

Desenganem-se meus caros colegas!
A adaptação à mudança que enforma a retórica oficial só tem um significado: se não estão bem com estas condições de trabalho, desamparem a loja: a bem do défice, claro.

Onde é que eu já vi isto? A despropósito, ou talvez não, evoco as declarações do bastonário da Ordem dos Médicos, Pedro Nunes, que comentava a deserção dos médicos do sector público para o sector privado:

“Pedro Nunes afirmou ainda que os hospitais públicos tornaram a sua cultura numa cultura de hospitais privados e que os profissionais de saúde agiram de acordo a oferta de melhores condições económicas.
«Quando resolveram que os hospitais públicos passavam a ter uma cultura de hospitais privados, começando a brincar à gestão dos hospitais públicos e retirando aquilo que apegava os profissionais ao hospital público que eram as suas carreiras».
O bastonário disse ainda que desta forma se colocou a «ênfase unicamente na produtividade» e que evidentemente «os próprios profissionais reagiram a essa mudança cultural e tenderam naturalmente a ir para onde lhes davam melhores condições económicas». (TSF)

Disciplinas “à la carte”?

Ministério considera “ideia interessante” ensinar história das religiões na escola pública.
Proposta foi feita à Comissão da Liberdade Religiosa pelo patriarca de Lisboa e pela maçonaria

“O Ministério da Educação considera a possibilidade de uma disciplina de história comparada das religiões uma “ideia interessante”. A ideia foi avançada segunda e terça-feira no colóquio internacional sobre as religiões e a paz, promovido pela Comissão da Liberdade Religiosa (CLR).” (Público – edição impressa 29-06-08)

Qual o período de vigência de um plano de estudos? Como se faz um programa de uma disciplina? Quem define os conteúdos curriculares? Com que critérios? A que lógicas obedecem? Deve ou não haver articulação curricular? Se deve haver articulação articular, quem tem a responsabilidade de articular os curricula?…

– Ambrósio, apetece-me algo.
– Uma nova disciplina, senhora?

A muleta da ciência.

De várias medidas que contribuíram para os presentes resultados [nas provas de aferição 2008], mencionem-se, a título de exemplo:

  • A formação contínua, em Português e em Matemática, de milhares de professores do primeiro ciclo;
  • O Plano de Acção para a Matemática, concretizado em todos os agrupamentos de escolas;
  • O Plano Nacional de Leitura, que apetrechou e dinamizou as bibliotecas escolares de todos os agrupamentos;
  • A definição de orientações sobre os tempos de trabalho com os alunos do 1.º ciclo em leitura e em Matemática;
  • O reforço do Estudo Acompanhado, para os alunos dos 1.º e 2.º ciclos;
  • A disponibilização de um banco de mais de 3000 itens de Matemática;
  • A elaboração de brochuras de apoio científico e pedagógico, para os níveis do pré-escolar, dos 1.º e 2.º ciclos, em Matemática e em Língua Portuguesa.

in: (ME)

A ministra da educação refutou veementemente as críticas que concedem uma pretensa falta de rigor e de exigência aos exames nacionais: “Eu não me pronuncio sobre opiniões, […] isto não é uma questão de opinião”, dizia a ministra em tom elevado depois de confrontada com opiniões contrárias às suas. Argumentou que este assunto deveria ser esclarecido no âmbito da técnica, dos procedimentos estatísticos, enfim, da ciência.
Afinarei pelo diapasão da senhora ministra: para quê opinar sobre A VERDADE científica? Não quero, portanto, pensar que na génese das provas dos exames subjaz uma ideia “facilitista”. Nada disso. Longe de mim tal heresia.
Se as opiniões não contam, se o que importa são “factos científicos”, como demonstrar que as medidas que o ME diz ter tomado são responsáveis pelos presentes resultados? O ME tem em seu poder algum estudo científico que prove essa relação causal?
Espero que não se trate de uma mera opinião.

O CNE vai encontrar a chave. Há que esperar pelo parecer…

Finlândia, Irlanda e Espanha são casos de sucesso na Educação e exemplos a seguir por Portugal. É a opinião do Conselho Nacional de Educação que convidou especialistas dos países a contarem o segredo educativo.
A Finlândia tem muitas horas de aprendizagem dentro da sala de aula, mas a chave do sucesso é mesmo a aposta em professores de apoio nos primeiros quatro anos de escolaridade. Já para os irlandeses, o segredo do êxito na Educação está nos professores altamente qualificados e que gostam da profissão. A especialista espanhola, Joaquina Maeso, revelou que a receita está sobretudo no apoio à língua espanhola, pois considera que se um aluno não dominar a língua vai fracassar às outras disciplinas.
São exemplos como os da Finlândia, Irlanda e Espanha que vão ajudar a formular o parecer sobre a Educação no ensino básico que o Conselho Nacional de Educação deve emitir em Julho.
in: TVI

Perdemos demasiado tempo à procura do elixir que nos fará transcender: Onde estará, afinal, a chave do sucesso na Educação?
É que passámos demasiado tempo a observar o caldo de cultura alheio e continuámos esperançados de que é possível importar modelos, paradigmas, e outros quejandos.
Parecemos umas baratas sem tino nem destino! Será possível existir um sucesso na educação sem que esse sucesso [travestido sei lá de quê] esteja reflectido num pretenso sucesso societal? Que miopia é esta que nos faz olhar para o sistema educativo através de uma lente que só enxerga o sistema escolar?

Triste sina a nossa!…

Recomendação do CNE

Avaliação «desligada» de notas máximas
Recomendação é do Conselho Nacional de Educação

O Conselho Nacional de Educação (CNE) aprova a Avaliação Externa das Escolas mas recomenda que, por agora, os resultados deste processo não tenham implicações na atribuição das classificações mais elevadas, no âmbito avaliação de desempenho, segundo parecer divulgado esta sexta-feira.
«Desaconselha-se, pelo menos nesta fase, qualquer ligação entre os resultados da avaliação das escolas e punições dos seus agentes individuais, designadamente a quota de professores titulares e de atribuição de escalões mais elevados na atribuição de professores», refere o CNE, o órgão consultivo do Ministério da Educação presidido pelo ex-ministro da Educação Júlio Pedrosa, em parecer de 27 de Maio, hoje divulgado.
[…] Quanto ao Sistema de Avaliação da Educação e do Ensino não-Superior, o Conselho critica que se esteja a reduzir essa avaliação às escolas, ficando de fora a administração educativa. «As escolas não são organizações isoladas e não podem nesse quadro ser desligadas de uma avaliação mais global do sistema educativo e de ensino», refere o parecer. [in: IOL Diário]

Desaconselha-se, pelo menos nesta fase (…)? Será apenas um problema de… conjuntura? E depois das eleições? Seria aconselhável?

Será que estou a ver bem?

Escolas públicas superam privadas
A modernização tecnológica conheceu um avanço assinalável no ensino público português, deixando, à distância, os investimentos feitos no privado. Em 2007, quase 80% das escolas estatais tinham PC, contra 23% no sector privado. (ler aqui)

Não importa saber se o estudo é fiável ou não. Importa perceber o que aí vem: Se melhoram as condições nas escolas então deverão melhorar os resultados. Os professores que se cuidem…

Monodocência – Toque de finados

Escola de Joane já “fundiu” 1º e 2º ciclos e sem “transições bruscas”
[…] Alfredo Lima defende que as Actividades Extra-Curriculares, que as crianças frequentam logo que iniciam o percurso escolar, passem a ser curriculares.
“Os alunos do 1º ano já têm Inglês, Educação Física, Música e Estudo Acompanhado que são algumas das disciplinas que vão ter ao longo de toda a vida escolar”, salientou o presidente do agrupamento.
[…] “Acho muito bem a proposta de juntar os dois ciclos num só desde que isso não implique haver menos docentes a leccionar e turmas maiores”, salientou o presidente do Agrupamento de Escolas Bernardino Machado. […]

Atendendo à universalização das AEC’s e à obrigatoriedade do ensino da disciplina de Inglês, não faz qualquer sentido falar em monodocência no 1º ciclo. O ME está à espera de quê para reconhecer esta evidência?

Psicologuês…

Este artigo de José Morgado (in: Público, 25/5/08) releva um conjunto de 7 equívocos que emergem dos discursos de alguns psicólogos supostamente impreparados para as matérias ligadas aos processos educativos:

Equívoco 1 – “Não se pode contrariar as crianças”.
Equívoco 2 – “As crianças têm sempre razão”.
Equívoco 3 – “As crianças são sempre boazinhas”.
Equívoco 4 – “Não se pode dizer às crianças que erraram, por que se traumatizam”.
Equívoco 5 – “As crianças podem fazer o que querem, trata-se de experiências”.
Equívoco 6 – “Não se pode castigar as crianças”.
Equívoco 7 – “A autoridade não é boa para as crianças”.

Dir-me-ão que estes equívocos não passam os muros da escola e que é apenas retórica de alguns fazedores de opinião. Pois…

Excelente.

Intervenção de José Soeiro na sessão solena do 25 de Abril 2008 (Bloco de Esquerda)

O 25 de Abril foi feito para nos libertar do passado. Por isso, qualquer celebração tem de interpelar o presente. É esse o dever de memória: situarmo-nos aqui e agora sabendo que há uma história que nos prometeu a modernidade contra o atraso. A alegria da memória revolucionária rejeita a prisão num presente contínuo. Não estamos condenados a viver o futuro como angustiante repetição do presente ou assustador regresso ao passado.

O projecto de modernidade que nos trouxe o 25 de Abril teve a sua expressão concreta na conquista de direitos sociais que são a marca revolucionária da nossa democracia. Foi a liberdade política, a liberdade de expressão e de organização, a inversão da relação de forças entre capital e trabalho, a exigência de uma cidadania que era mais que um mero estatuto legal. Era acção colectiva, prática social, desobediência ao poder, direitos civis, políticos e sociais inseparáveis.

Entre esses direitos, temos os serviços públicos, a segurança social, o serviço nacional de saúde, a democratização do ensino, a valorização da educação como factor central de desenvolvimento e de combate às injustiças.

A escola tem sido um elemento central da crença no progresso. Foi assim com a generosidade dos pedagogos da Primeira República e foi assim com o 25 de Abril. Os grandes pensadores progressistas consideraram sempre a escola como um elemento transformador das sociedades.

A política sobre a escola e a democratização do ensino sempre foi demarcadora, porque define o modo como encaramos o saber, a emancipação intelectual, a distribuição dos meios de ler e interpretar o mundo, a autonomia de cada um e uma. Também hoje é assim: a política sobre a educação é demarcadora, sobretudo porque vivemos uma crise nas escolas.

O sentimento dominante em relação à escola é hoje de incerteza. A massificação do ensino foi um processo extraordinário, mas não correspondeu a uma igualização das oportunidades sociais dos cidadãos. As promessas de que mais escola traria mais desenvolvimento, mais igualdade e maior mobilidade social nem sempre se confirmaram. Em grande medida, a escola massificou-se sem se democratizar completamente. Avançamos muito no problema do acesso, mas não resolvemos o problema do sucesso educativo para todos. O acesso à escola, por si só, não consegue romper o ciclo vicioso da pobreza, porque não garante a todos as mesmas condições de sucesso. A escola contribui para a reprodução social e frequentemente tem acentuado as desigualdades.

A escola fabrica várias formas de exclusão. Não deixa entrar os que estão fora e esse é o problema do acesso. Põe fora os que estão dentro – e aí estamos perante o drama do insucesso escolar e do abandono. Exclui incluindo – a forma escolar é em si uniformizadora e adversa à diversidade. E, num certo sentido, a inclusão na escola deixou de fazer sentido, porque é difícil perceber para que é que precisamos de lá estar. A cada um destes problemas – o acesso, o sucesso, a diversidade dos públicos escolares e o sentido do trabalho escolar – nós só podemos responder com uma escolha: mais e melhor democracia.

O problema das escolas não é, portanto, os professores, mesmo que se queira tantas vezes transformá-los nos culpados das políticas educativas. O problema das escolas não são os jovens, mesmo que se queira construir histericamente a imagem de que os estudantes são todos perigosos delinquentes. O problema das escolas não é terem demasiada democracia na sua gestão, mesmo que se use essa distorção como argumento para subordinar as políticas educativas ao modelo das empresas.

A crise da escola não é uma crise técnica, relacionada com um problema de eficácia. É uma crise política, ligada a um problema de legitimidade. Não há forma de resolver esta crise sem a pensar politicamente e sem a articular com os diferentes projectos de sociedade que conflituam no país.

Os discursos conservadores sobre a educação ganham hoje espaço público e são cada vez mais agressivos. Conjugam a saudade de uma escola de elites, da “homogeneidade perdida” do tempo em que os alunos vinham todos das mesmas famílias e das mesmas culturas com a ideia de que o insucesso e a exclusão é uma inevitabilidade numa escola exigente. Algumas crianças estariam destinadas a um “sucesso parcial” e essa desigualdade é que permitiria a selecção social dos melhores.

Este darwinismo social não serve a democracia, porque considera que o próprio processo de democratização da escola só pode levar a dificuldades – e até à impossibilidade – no cumprimento da sua missão.

A resposta democrática valoriza a diversificação dos públicos escolares, a interculturalidade, a heterogeneidade, os diferentes comportamentos, linguagens, classes e nacionalidades que habitam a escola portuguesa. A resposta democrática rejeita as formas de hierarquia e discriminação dentro da escola.

A escola que existe é responsável não apenas pela reprodução das desigualdades, mas pela produção de uma exclusão que resulta da própria organização escolar. A educação inclusiva tem de romper com os valores da escola tradicional, do aluno-padrão, de aprendizagem como transmissão, de escola como estrutura de reprodução.

A escola não pode ser um lugar de desigualdade e sofrimento. A democracia precisa de restituir a professores e alunos as condições mínimas para a sua felicidade. Essa felicidade é um enorme desafio. Trata-se de superar a forma escolar, de reinventar a escola e o trabalho que lá é feito.

Foi sempre assim com todos os movimentos políticos e pedagógicos que se empenharam no projecto da escola democrática. Todos perceberam que o seu potencial era a escola ser, já em si, um espaço de vivência democrática: a “sociedade dos condiscípulos” de António Sérgio, o espaço da cooperação e da partilha, esse microcosmos social gerido pelos que lá estão, praticando a cidadania.

A limitação da democracia na vida das escolas, na sua gestão, na sua organização, é sempre um empobrecimento da escola pública. Se pedirmos a professores e alunos para se demitirem de participar na gestão das escolas, não nos admiremos que se demitam também da gestão do país. A cidadania não se estuda para um teste, aprende-se exercendo-a, na escola desde logo. Elegendo os órgãos, fazendo o debate democrático, vivendo com o conflito. A ideia de que a democracia enquanto forma de vivência para as escolas é ineficaz ou morosa – logo, precisa de ser substituída pelo autoritarismo imposto de fora ou pelo gerencialismo importado do mercado – é uma ideia perigosa não apenas para as escolas, mas para o país.

É impossível pensar a escola como uma ilha isolada do mundo. A escola não pode resolver todos os problemas sociais. Não poderá nunca existir uma escola inclusiva numa sociedade que não o é.

As expectativas de mobilidade social associadas à escola – determinantes na sua valorização pelas pessoas – estão hoje a ser frustradas pelo acréscimo das desigualdades e da exclusão. O aumento do desemprego, a precarização generalizada da juventude e o empobrecimento do país dá-se hoje em simultâneo com um acréscimo das qualificações escolares.

O problema é portanto das escolhas políticas do centrão e do rotativismo que amarram o país à pobreza e ao défice social. De nada valem as declarações vazias das almas sensíveis que tanto se preocupam com a «exclusão», porque os mesmos responsáveis políticos que se condoem com a exclusão têm sido insensíveis à acentuação das desigualdades.

A crise da escola não pode ser equacionada senão remetendo-a para a crise do compromisso entre capitalismo e democracia, compromisso que tinha sido assegurado, até certo ponto, pelo Estado Social. A desregulação dos direitos do trabalho, o desmantelamento dos serviços públicos que é o dogma do liberalismo dominante, a restrição democrática que significa a destruição de direitos sociais trazidos pela Revolução são os factores que estão, primordialmente, na origem dos fenómenos de exclusão.

Para que a extensão da escolarização possa ser, como sempre advogaram os seus mais generosos defensores, factor de progresso e de emancipação das classes exploradas é indispensável impor mudanças profundas no próprio trabalho.

A inadequação do sistema educativo e formativo em relação ao mercado de trabalho é uma profecia liberal invertida. Não temos qualificações a mais. Temos, isso sim, falta de empregos qualificados, exploração dos jovens, um modelo produtivo atrasado baseado na mão-de-obra barata, que precisa de taxas de desemprego estrutural para manter taxas de lucro e uma pressão permanente sobre os trabalhadores.

A estrutura de relações de produção existente em Portugal bloqueia as forças potencialmente produtivas produzidas no sistema de ensino.

Este problema é, a par da educação, um dos maiores défices democráticos que hoje vivemos. A minha geração, a geração dos 500 euros, vive na corda bamba, congelada pela precariedade. É uma geração em relação à qual os Governos têm virado as costas. A precariedade foi-nos imposta como modo de vida: nenhuns direitos, nenhuma capacidade de projectar um futuro, nenhuma garantia de respeito, nenhuma certeza de emancipação.

Muitos dos direitos que fizeram parte do código genético da democracia de Abril não existem para grande parte dos jovens. Empresas de Trabalho Temporário que falsificam relações de trabalho. Falsos recibos verdes, a começar pelos que existem no Estado. Contratos a prazo que se sucedem. Estágios não-remunerados uns atrás dos outros. Arbitrariedade laboral completa. Esta é a condição de toda uma geração que já nasceu em democracia.

A democracia tem estado a ser confiscada pelos patrões, pelas ETT’s e pelo Estado que dá o pior exemplo com milhares de trabalhadores precários. De nada adiantam medidas cosméticas que legitimam estas práticas quando vêm atreladas ao despedimento na hora, que significa a precarização geral da sociedade.

A democracia não pode ser confiscada por ninguém. Não é apenas um sistema político e o voto livre, que é essencial. Uma democracia de alta intensidade é aquela que se estende a todas as esferas da vida, a todas as relações sociais. A democracia é a resposta mais forte contra todas as formas de dominação – no espaço da empresa, na escola, na família, na sexualidade. É isso o socialismo do nosso tempo, um projecto imenso que se encontra por cumprir.

É o compromisso com esse projecto que faz hoje a diferença entre o situacionismo e as alternativas.

Na política, como na vida, nós somos o que fazemos. Mas somos sobretudo o que fazemos para mudar o que somos. E se há uma coisa que o 25 de Abril nos ensina é que é sempre possível mudar tudo.

Como eu percebo este colega.

(Via Caminhando…)
Aos meus alunos, aos Pais dos meus alunos, aos professores e a todos os meus concidadãos

Tenho cinquenta e tal anos de idade, trinta e muitos dos quais como docente no ensino secundário e no ensino superior.

Fiz a Licenciatura com 16 valores, o Estágio Pedagógico com 18 e um mestrado em Ciências da Educação com Muito Bom.
Dediquei a minha vida à Escola Pública. Fui Presidente do Conselho Executivo (dois mandatos), orientador de estágio pedagógico (3 anos), delegado de grupo / coordenador de departamento (dois mandatos), Presidente do Conselho Pedagógico (um mandato) e director de turma durante vários anos.

Nos últimos tempos leccionei no ensino superior, com ligação permanente à formação de professores.Desempenhei vários cargos pedagógicos, participei em múltiplos projectos e desenvolvi dois trabalhos de elevado valor científico.
Entretanto, regressei ao ensino secundário e à minha escola de origem.
Alguns dos antigos colegas, embora mais novos do que eu e com menos tempo de serviço (compraram o tempo, explicaram-me depois) já se tinham reformado. Eu também já tinha idade, mas faltavam-me alguns meses para o tempo necessário quando mudaram as regras do jogo. E como se não bastasse a alteração dessas regras, é aprovado, entretanto, um novo estatuto para a carreira docente. E logo de seguida é aberto o concurso para professores titulares. Um concurso para uma nova categoria onde eu não tinha lugar!
Não reunia condições. Mesmo com um Mestrado em Ciências da Educação e sem ter dado uma única falta nos últimos sete anos, o meu curriculum valia, apenas, 93 pontos! Faltavam 2 pontos para o mínimo exigido a quem estivesse no 10º escalão.

Com as novas regras, o meu departamento passou a ser coordenado, a partir do presente ano lectivo, por um professor titular. Um professor que está posicionado no 8º escalão. Tem menos 15 anos de serviço do que eu. Foi meu aluno no ensino secundário e, mais tarde, meu estagiário. Fez um bacharelato com média de 10 valores e no estágio pedagógico obteve a classificação de 11 valores. Recentemente concluiu a licenciatura numa estabelecimento de ensino privado, desconhecendo a classificação obtida. É um professor que nunca exerceu qualquer cargo pedagógico, à excepção de director de turma. Nos últimos sete anos deu 84 faltas, algumas das quais para fazer 15 dias de férias na República Dominicana (o atestado médico que utilizou está arquivado na secretaria da escola, enquanto os bilhetes do avião e a factura do hotel constam de um outro processo localizável). O seu curriculum vale 84 pontos, menos 9 pontos do que o meu. Contudo, este docente foi nomeado professor titular.

De acordo com o Senhor Primeiro Ministro e demais membros do seu Governo, com o apoio do Senhor Presidente da República e, agora, com o apoio dos dirigentes sindicais, este professor está em melhores condições do que eu para integrar “ (…) um corpo de docentes altamente qualificado, com mais experiência, mais formação e mais autoridade, que assegure em permanência as funções de organização das escolas para a promoção do sucesso educativo, a prevenção do abandono escolar e a melhoria da qualidade das aprendizagens.”

A conclusão, embora absurda, é clara: se eu estivesse apenas no 9º escalão, e com os mesmos pontos, seria considerado um docente altamente qualificado, com mais experiência, mais formação e mais autoridade. Como estou no 10º escalão, e não atingindo os 95 pontos, eu já não sou nada.

Isto é o resultado de uma selecção feita com base na “(…) aplicação de uma grelha de critérios objectivos, observáveis e quantificáveis, com ponderações que permitam distinguir as experiências profissionais mais relevantes (…)[onde se procurou] reduzir ao mínimo as margens de subjectividade e de discricionariedade na apreciação do currículo dos candidatos, reafirmando-se o objectivo de valorizar e dar prioridade na classificação aos professores que têm dado provas de maior disponibilidade para assumir funções de responsabilidade.” É assim que “reza” o DL 200/2007, de 22 de Maio. Admirável!

Agora consta-se por aí (e por aqui) que aquele professor (coordenador do meu departamento) me irá avaliar…
Não, isso não será verdade. Esse professor irá, provavelmente, fazer de conta que avalia, porque só pode avaliar quem sabe, quem for mais competente do que aquele que se pretende avaliar.
O título de “titular” não é, só por si, suficiente. Mesmo que isto seja só para fazer de conta…

Conhecidos que são os meus interesses, passo ao principal objectivo desta carta, que é, simplesmente, pedir perdão!

Pedir perdão, em primeiro lugar, aos meus alunos. Pedir perdão a todos os Pais dos meus alunos. Pedir perdão porque estou de professor, mas sem me sentir professor. Tal como milhares de colegas, humilhados e desencorajados, sinto-me transformado num funcionário inútil, à espera da aposentação.
Ninguém consegue ser bom professor sem um mínimo de dignidade. Ninguém consegue ser bom professor sem um mínimo de paixão.

As minhas aulas eram, outrora, coloridas, vivas e muito participadas. Com acetatos, diaporamas, vídeos, power point, etc. Hoje é, apenas, o giz e o quadro. Só a preto e branco, com alguns cinzentos à mistura.
Sinto-me desmotivado, incapaz de me empenhar e de estimular. Receio vir a odiar a sala de aulas e a própria escola. Receio começar a faltar para imitar o professor titular e coordenador do meu departamento (só não irei passar férias para a República Dominicana porque tenho outras prioridades…). Receio que os professores deste País comecem a fingir que ensinam e a fingir que avaliam. Sim, porque neste país já tudo me parece a fingir.

Cumprimentos.

(Um professor anónimo e humilhado, tal como milhares de outros professores)

E os outros 80.000, por onde andam?

(Via Didáctica da Invenção)
A Plataforma que reúne os sindicatos dos professores entregou hoje no Ministério da Educação um abaixo-assinado com 20 mil assinaturas a exigir a suspensão do processo de avaliação até final do ano lectivo. Após a entrega do documento, a Plataforma anunciou novos protestos em Abril e Maio.
Depois de uma manifestação com 100.000 professores, convenhamos que limitar as expectativas a… 20.000 é muito pouco. Onde andam os 80.000 que foram a Lisboa e não assinaram? Foi baixar muito a fasquia! E quando já se ouve falar em mais Manifs e até greves, apetece perguntar se estamos de volta ao passado e se deixaremos que isso aconteça… Será que os 100.000 professores que foram a Lisboa foram mesmo um 31 para os sindicatos, como afirmou Carlos Amaral Dias na Antena 1?”

Hoje, este texto é ainda mais actual.

Adenda:
Logo a seguir ao programa Terra Nostra na Antena 1, considerei que a análise de Carlos Amaral Dias era de uma lucidez inabalável e os dias seguinte vieram confirmá-lo!Ninguém esperava 100.000 professores em Lisboa e daquele dia para a frente ninguém sabia o que fazer com um número tão assustador! Se fizéssemos outra Manif em Lisboa, com 80.000 professores, seria uma fracasso… Aquela Manif colocou-nos muito perto do céu!
António Carlos Coelho | Homepage | 19.04.08 – 11:45 pm | #

O meu comentário: Há que interpretar os números, António. Eu vi 100 000 professores que protestaram contras as políticas deste ME. Este é o único dado objectivo que tenho. Agora passo à interpretação: a marcha da indignação não podia ter outro lema. Presumo que se o lema fosse a avaliação, o estatuto, a gestão ou a defesa da escola púbica, a adesão seria muito menor. Digo isto pelo conformismo, mais ou menos velado, que mantém as escolas em banho-maria. 20 000 colegas assumiram a discordância com este modelo de avaliação. Muitos mais estarão em desacordo com o modelo de avaliação e não terão subscrito o abaixo-assinado por entenderem que esta forma de luta é inócua. Outros (quantos?… não serão 80 000), por se sentirem promovidos pelo modelo, calam e consentem.
Se o abaixo-assinado fosse subscrito pelos 100 000, a plataforma sindical arriscar-se-ia a um entendimento nestas condições?

A voz do dono?

“ «Não há uma única escola que tenha pedido a suspensão», afirmou Maria de Lurdes Rodrigues […]
Admitiu que há «manifestações de preocupação» e «desejos de não concretização da avaliação» manifestado por alguns professores individualmente, grupos de professores ou mesmo conselhos pedagógicos, mas sublinhou que isso não pode ser confundido com a posição da escola.

«Nenhum conselho executivo de qualquer escola pediu a suspensão da avaliação.» […] ”

Os conselhos executivos, sem excepção segundo a ministra, fizeram ouvidos de mercador aos inúmeros apelos directos oriundos das comunidades educativas [representadas nos conselhos pedagógicos e assembleias de escolas]. Pergunto, com que legitimidade? Como foi possível não dar voz às vozes que os elegeram? Por carreirismo, por medo? Que ideia é esta de representação? Os conselhos executivos representam a escola ou será o ME representado pelos conselhos executivos?

Se dúvidas houvesse sobre o papel que está reservado ao futuro director, aqui temos uma evidência!

Resumo da reunião dos dois secretários de estado com os PCEs de Lisboa

Deixo uma saudação especial para o Ramiro Marques. Bem-haja.

“04-Abril 2008 – reunião sobre avaliação do desempenho…Hoje fui a uma reunião em conjunto com todos os presidentes CE e membros das comissões de coordenação de avaliação de toda a drel) com o Sr Pedreira e o Sr Valter Lemos sobre Avaliação docente, gestão e formação. Chegámos… entrámos… uns sentaram-se em cadeiras outros nas escadas…no chão…(várias dezenas!) porque não cabiam todos… Já é a 3ª vez que vou a uma reunião destas (com altas individualidades do ME) em que os profs se sentam no chão…uma vergonha!!! A reunião estava marcada para as 10h… começou às 10h30. Estivemos cerca de 2h a ouvir o sr Pedreira explicar-nos através de uma sessão de powerpoint o dec 2/2008… (como se nós não conhecêssemos a sua fundamentação teórica…) a importância de sermos avaliados… o facto determos DIREITO a uma avaliação…etc etc…Seguiu-se um momento onde os presentes poderiam colocar dúvidas… e os srs Lemos e Pedreira escreveram… escreveram para depois esclarecerem…Houve quem agradecesse ao blog do colega Ramiro Marques a partilha de instrumentos de registo e a ajuda a tantas dúvidas que vão surgindo…(Foi um aplauso de agradecimento generalizado!) No meio das dúvidas… faltou a pilha ao micro portátil… então o Sr Lemos sugeriu que fizéssemos um pequeno intervalo…Após o reinicio da sessão o Sr Lemos lá foi dando umas respostas-novidades atabalhoadas… já que quem tinha colocado situações concretas ficou na mesma… ou seja: “o CE terá de encontrar a solução mais adequada”… 🙂 Entretanto ficámos a saber que, na próxima semana, vai sair mais um despacho sobre as quotas de cada parâmetro da avaliação… e depois outro sobre a avaliação de quem não tiver componente lectiva… Por isso…
meus caros não se apressem porque o chorrilho ainda não terminou. Ahhh… mas o mais giro foi a conclusão…O mínimo dos mínimos de avaliação que as escolas terão de fazer é a avaliação aos contratados e que consiste em: Ficha de auto-avaliação e ficha do PCE-dados objectivos: assiduidade, avaliação dos alunos. As escolas que conseguirem fazer mais… devem fazer… porque algumas estão a avaliar todos os docentes já este ano… e isso é trabalho que não se lhes pode dizer para deitarem fora…Ah!… e mais disse o sr Pedreira: “Os instrumentos de registo que as escolas estão a elaborar… é preciso não esquecer que não são documentos escritos em pedra…podem e devem ser alterados quando e sempre que necessário…” Agora elaboram uns mas no inicio do próximo ano pode haver novos elementos e o processo é um processo aberto…(gostaram? esta foi gira…mas vem aí outra…)Disse também o Sr Pedreira: “o facto de este modelo de avaliação ser complexo… (e aí foi uma gargalhada geral… seguida de intervenções do tipo…Ahhh! afinal sempre é complexo!!!) ao que o Sr Pedreira confirmou:”Sim… o ME reconhece a sua grande complexidade…é um sistema complexo…nós reconhecemos…mas agora cabe aos Conselhos Executivos e às escolas simplificá-lo!!”Lindo! E nessa liiinda reunião (onde fomos postos na rua às 13h28m) porque a sala só estava disponibilizada até às 13h30… por isso teriam de terminar a reunião e sair…

Professora que esteve presente na reunião

Comentário meu
Afinal, ainda há muitos PCEs que resistem e que não calam a mágoa que lhes vai na alma.”

Adenda: eheheh… a Maria Lisboa também foi à missa. Pode ler aqui: http://professorsemquadro.blogspot.com/2008/04/foi-vez-das-lisboas-oriental-e.html

“É por isto que o Plano Tecnológico para a Educação é tão importante como parte da corajosa reforma que o Governo está a implementar.”

“A vida é hoje cada vez mais multifuncional. Ao mesmo tempo vemos televisão, lemos, escrevemos, jogamos e falamos! É isso que os jovens estudantes fazem quando estudam com a música alta, o computador ligado e o telemóvel pronto a trocar mensagens. É assim que aprendem e é nesse ambiente que vão ter que viver e criar valor. E a escola? A escola é cada vez mais isso nos intervalos, nas actividades lúdicas e complementares, mas não tem ainda condições para ser isso nos períodos formais de aulas.
É por isto que o Plano Tecnológico para a Educação é tão importante como parte da corajosa reforma que o Governo está a implementar.”
(Carlos Zorrinho – Coordenador nacional da Estratégia de Lisboa e do Plano Tecnológico)

Ora diga lá outra vez… É que não percebi para onde quer transportar a carroça.
Sugere então que as empresas passem a funcionar nesse ambiente. Os trabalhadores devem ouvir música alta, o computador ligado e o telemóvel pronto a trocar mensagens. Hummm… estou a ver. Será possível sugerir essa inovação ao senhor Pinto de Sousa para que os funcionários públicos passem desde já a funcionar nesse ambiente… lúdico: Nas repartições públicas, nas secretarias dos ministérios, nos tribunais, nas escolas… fantástico.

Só para relembrar…

A escola é uma instituição!

“a escola não é um serviço ou uma organização qualquer, é uma instituição – “a escola não se mede nem se pode medir pela satisfação dos alunos e dos seus pais, mas pela capacidade de promover os valores que proclama e que procura incarnar.
(…) Não se inscreve num mercado, mas contribui para a promoção da humanidade” (Meirieu, 2005:10).
A escola é para se aprender a conhecer, a fazer, a ser, a viver com os outros, os célebres quatro pilares da Comissão da UNESCO para a educação no século XXI. No mesmo sentido, Lessard recorda que “as instituições cumprem missões, enquanto as organizações perseguem objectivos, traduzíveis em resultados precisos” (Lessard, 2005a:23), pelo que, com as lógicas da obrigação de resultados, arriscamo-nos a evacuar a dimensão institucional da escola a favor de uma racionalidade instrumental estreita, em última instância, a reduzir o mundo à dimensão dos instrumentos que temos para o controlar.”

(José Azevedo, In: Actas de um Seminário realizado em 13 de Dezembro de 2005-AVALIAÇÃO DAS ESCOLAS – Modelos e Processos)

Confrangedor

Para quem acompanha os assuntos da educação com seriedade não pode ficar indiferente às contradições no discurso da ministra da educação. A relevância do cargo exige rigor e verdade.

“Quanto à polémica em torno da exclusão dos professores da presidência do Conselho Geral, futuro órgão máximo das escolas, Maria de Lurdes Rodrigues afirma que essa decisão foi uma resposta aos pedidos dos conselhos executivos.”

“No que ao Conselho Geral diz respeito, entende o Conselho das Escolas que não se compreende o afastamento dos docentes do exercício do cargo de presidente, caso fosse essa a decisão sufragada dos eleitores do Conselho Geral.” (Conselho das Escolas, Parecer 1/2008)

Pois…

O maior cego é o surdo (II)

“Para mudar na saúde e na educação, por exemplo, nunca bastarão comissões técnicas, grupos de trabalho ou sumários executivos dos colaboradores; nem serão proveitosas reuniões com autarcas (sempre prontos a retirar dividendos políticos) ou encontros com os conselhos executivos das escolas (sem auscultar os professores e alunos). Pelo contrário, as mudanças anunciadas (muitas delas correctas) terão sucesso se forem acompanhadas do apoio da Ordem dos Médicos, dos conselhos pedagógicos das escolas, da opinião dos pais, dos pareceres de cidadãos de prestígio, sem ambição na carreira partidária e política.” (Daniel Sampaio, Pública 10/02/08)

Uma boa notícia para abrir o fim-de-semana

“O Tribunal Administrativo de Lisboa admitiu “liminarmente” a providência cautelar, com efeitos suspensivos, interposta pelo Sindicato Independente e Democrático dos Professores (Sindep), que apontava irregularidades cometidas pelo Ministério da Educação no âmbito da avaliação dos professores. A tutela tem 10 dias para contestar a decisão, que poderá mesmo congelar todo o processo. [continuar a ler a notícia…]”

Uma espécie de brincadeira de Carnaval

Qual é afinal a escala? Pergunta a Idalina. “Se os professores vão ser avaliados e se essa avaliação constitui um elemento chave da promoção na carreira e mesmo de continuidade nela, não tem de haver uma escala?!? Cada agrupamento ou escola utiliza a sua escala? Um professor transita de umas escolas para outras sem ser avaliado e classificado através de uma escala única?!?”

Atentemos ao quadro de referência, ao perfil geral de desempenho profissional do educador de infância e dos professores dos ensinos básico e secundário. Vamos lá construir os instrumentos de avaliação para captar a realidade que se esconde por detrás de cada uma destas dimensões?!… Enquanto cogito nos instrumentos, ajudem-me a encontrar a escala!

II
Dimensão profissional, social e ética

1 — O professor promove aprendizagens curriculares, fundamentando a sua prática profissional num saber específico resultante da produção e uso de diversos saberes integrados em função das acções concretas da mesma prática, social e eticamente situada.
2 — No âmbito do disposto no número anterior, o professor:
a) Assume-se como um profissional de educação, com a função específica de ensinar, pelo que recorre ao saber próprio da profissão, apoiado na investigação e na reflexão partilhada da prática educativa e enquadrado em orientações de política educativa para cuja definição contribui activamente [nota do autor: peço desculpa mas não entendi esta parte] ;
b) Exerce a sua actividade profissional na escola, entendida como uma instituição educativa, à qual está socialmente cometida a responsabilidade específica de garantir a todos, numa perspectiva de escola inclusiva, um conjunto de aprendizagens de natureza diversa, designado por currículo, que, num dado momento e no quadro de uma construção social negociada e assumida como temporária, é reconhecido como necessidade e direito de todos para o seu desenvolvimento integral;
c) Fomenta o desenvolvimento da autonomia dos alunos e a sua plena inclusão na sociedade, tendo em conta o carácter complexo e diferenciado das aprendizagens escolares;
d) Promove a qualidade dos contextos de inserção do processo educativo, de modo a garantir o bem-estar dos alunos e o desenvolvimento de todas as componentes da sua identidade individual e cultural;
e) Identifica ponderadamente e respeita as diferenças culturais e pessoais dos alunos e demais membros da comunidade educativa, valorizando os diferentes saberes e culturas e combatendo processos de exclusão e discriminação;
f) Manifesta capacidade relacional e de comunicação, bem como equilíbrio emocional, nas várias circunstâncias da sua actividade profissional;
g) Assume a dimensão cívica e formativa das suas funções, com as inerentes exigências éticas e deontológicas que lhe estão associadas.

III
Dimensão de desenvolvimento do ensino e da aprendizagem
1 — O professor promove aprendizagens no âmbito de um currículo, no quadro de uma relação pedagógica de qualidade, integrando, com critérios de rigor científico e metodológico, conhecimentos das áreas que o fundamentam.
2 — No âmbito do disposto no número anterior, o professor:
a) Promove aprendizagens significativas no âmbito dos objectivos do projecto curricular de turma, desenvolvendo as competências essenciais e estruturantes que o integram;
b) Utiliza, de forma integrada, saberes próprios da sua especialidade e saberes transversais e multidisciplinares adequados ao respectivo nível e ciclo de ensino;
c) Organiza o ensino e promove, individualmente ou em equipa, as aprendizagens no quadro dos paradigmas epistemológicos das áreas do conhecimento e de opções pedagógicas e didácticas fundamentadas, recorrendo à actividade experimental sempre que esta se revele pertinente;
d) Utiliza correctamente a língua portuguesa, nas suas vertentes escrita e oral, constituindo essa correcta utilização objectivo da sua acção formativa;
e) Utiliza, em função das diferentes situações, e incorpora adequadamente nas actividades de aprendizagem linguagens diversas e suportes variados, nomeadamente as tecnologias de informação e comunicação, promovendo a aquisição de competências básicas neste último domínio;
f) Promove a aprendizagem sistemática dos processos de trabalho intelectual e das formas de o organizar e comunicar, bem como o envolvimento activo dos alunos nos processos de aprendizagem e na gestão do currículo;
g) Desenvolve estratégias pedagógicas diferenciadas, conducentes ao sucesso e realização de cada aluno no quadro sócio-cultural da diversidade das sociedades e da heterogeneidade dos sujeitos, mobilizando valores, saberes, experiências e outras componentes dos contextos e percursos pessoais, culturais e sociais dos alunos;
h) Assegura a realização de actividades educativas de apoio aos alunos e coopera na detecção e acompanhamento de crianças ou jovens com necessidades educativas especiais;
i) Incentiva a construção participada de regras de convivência democrática e gere, com segurança e flexibilidade, situações problemáticas e conflitos interpessoais de natureza diversa;
j) Utiliza a avaliação, nas suas diferentes modalidades e áreas de aplicação, como elemento regulador e promotor da qualidade do ensino, da aprendizagem e da sua própria formação.

IV
Dimensão de participação na escola e de relação com a comunidade

1 — O professor exerce a sua actividade profissional, de uma forma integrada, no âmbito das diferentes dimensões da escola como instituição educativa e no contexto da comunidade em que esta se insere.
2 — No âmbito do disposto no número anterior, o professor:
a) Perspectiva a escola e a comunidade como espaços de educação inclusiva e de intervenção social, no quadro de uma formação integral dos alunos para a cidadania democrática;
b) Participa na construção, desenvolvimento e avaliação do projecto educativo da escola e dos respectivos projectos curriculares, bem como nas actividades de administração e gestão da escola, atendendo à articulação entre os vários níveis e ciclos de ensino;
c) Integra no projecto curricular saberes e práticas sociais da comunidade, conferindo-lhes relevância educativa;
d) Colabora com todos os intervenientes no processo educativo, favorecendo a criação e o desenvolvimento de relações de respeito mútuo entre docentes, alunos, encarregados de educação e pessoal não docente, bem como com outras instituições da comunidade;
e) Promove interacções com as famílias, nomeadamente no âmbito dos projectos de vida e de formação dos seus alunos;
f) Valoriza a escola enquanto pólo de desenvolvimento social e cultural, cooperando com outras instituições da comunidade e participando nos seus projectos;
g) Coopera na elaboração e realização de estudos e de projectos de intervenção integrados na escola e no seu contexto.

V
Dimensão de desenvolvimento profissional ao longo da vida

1 — O professor incorpora a sua formação como elemento constitutivo da prática profissional, construindo-a a partir das necessidades e realizações que consciencializa, mediante a análise problematizada da sua prática pedagógica, a reflexão fundamentada sobre a construção da profissão e o recurso à investigação, em cooperação com outros profissionais.

2 — No âmbito do disposto no número anterior, o professor:
a) Reflecte sobre as suas práticas, apoiando-se na experiência, na investigação e em outros recursos importantes para a avaliação do seu desenvolvimento profissional, nomeadamente no seu próprio projecto de formação;
b) Reflecte sobre aspectos éticos e deontológicos inerentes à profissão, avaliando os efeitos das decisões tomadas;
c) Perspectiva o trabalho de equipa como factor de enriquecimento da sua formação e da actividade profissional, privilegiando a partilha de saberes e de experiências;
d) Desenvolve competências pessoais, sociais e profissionais, numa perspectiva de formação ao longo da vida, considerando as diversidades e semelhanças das realidades nacionais e internacionais, nomeadamente na União Europeia;
e) Participa em projectos de investigação relacionados com o ensino, a aprendizagem e o desenvolvimento dos alunos.

Chegou ao fim deste excerto sem avançar o texto? E ainda se lembra do título desta entrada? Concordará comigo que o verdadeiro Carnaval ainda não chegou…

Adenda:O que se pede às escolas é que em 20 dias preparem a avaliação, criando os instrumentos de registo, e nada mais”, afirma Jorge Pedreira, realçando que só depois se pedirá, por exemplo, aos professores que proponham os seus objectivos.”

E nada mais??… Em cima do joelho, pois claro…

Brincadeiras de Carnaval III

Quando a esmola é grande o pobre desconfia, diz o provérbio.

Sócrates pediu autógrafo aos «vencedores» de Novas Oportunidades
O primeiro-ministro José Sócrates foi hoje a Sever do Vouga pedir autógrafos aos alunos do programa de novas oportunidades que alcançaram o nível secundário de certificação escolar, «por serem um exemplo para o país»

Apesar de conotar este acto simbólico [obviamente] com a necessidade de reforçar positivamente os aliados, os beneficiários, os acólitos,… às medidas do governo, considero-o desproporcionado à grandeza do feito. Em nome da coerência, é injustificável o silêncio dos governantes diante de inúmeros actos altruístas que povoam a nossa actualidade, esses sim, merecedores de divinização.
Sem necessidade de sair do domínio da educação, quantos autógrafos teria de solicitar o primeiro-ministro àqueles que implementam com o maior brio e espírito de missão os maiores disparates inventados pelos mangas-de-alpaca que se escondem nos gabinetes ministeriais?

Imaculada…

Não tendo qualquer pretensão em ocupar a cátedra dos especialistas em comentário político, acabo por ficar espantado (eu sei que estou cada vez mais susceptível…) por constatar que nenhum jornalista relevou (até ao momento) das palavras do vice-presidente da Assembleia da República e reputado socialista, Manuel Alegre, a referência à ministra da educação. Manuel Alegre, na sequência deste comentário, dizia à TSF que a ministra da educação deveria ser incluída no “pacote” da remodelação.

O estado de graça da ministra na comunicação social continua… sem mácula.

Escola pública em risco ou o risco da escola pública?

Diz o estudo realizado por dois investigadores do ISCTE, em 5 escolas de Lisboa, noticiado aqui no jornal da tarde [entre o minuto 16:36 e o 19:18], que “ a escola pública igual para todos está em risco”.

A escola pública igual para todos? Percebo a ideia mas preferia que a escola pública fosse diferente para todos. Adiante… o estudo não acrescenta nada de novo. Admitindo que este estudo do ISCTE é credível e que as conclusões são para levar a sério – ao revelarem problemas graves de equidade social na escola pública, qual foi o impacto das recentes medidas do governo associadas à campanha pública de descredibilização do trabalho docente? Dito de outra forma: ao empolar os resultados da avaliação externa da escola (a avaliação foi a panaceia do governo para os problemas educativos) e dos professores (ECD), não terá o ME induzido as lideranças fortes das escolas a seleccionarem os alunos para garantir bons resultados académicos?

Olhando agora para “o lado B” desta notícia, reparo que Albino Almeida (AA) reclama cotas para a constituição das turmas. Será que AA deseja que as cotas se devem aplicar também aos CEF’s (ensino básico) e aos Cursos Profissionais (ensino secundário), ou será que as cotas só devem ser consideradas para as turmas de excelência?
Se há um enquadramento legal para as turmas de nível, por que razão AA não contesta a discriminação promovida pelo ME quando legisla a criação de turmas de repetentes?

Pisa uma vez mais

[…] na primeira série do PISA, Portugal aparece no ranking de países numa posição modesta em Matemática. Como já se referiu, o PISA avalia competências de jovens de 15 anos. Acontece que, na maioria dos países participantes, a esmagadora maioria dos jovens desta idade frequentam os 10° ou 11° após de escolaridade. Em, Portugal, pelo contrário, temos um número muito elevado de jovens de 15 anos que frequentam os 7°, 8° ou 9° anos de escolaridade, ou mesmo anos de escolaridade mais iniciais, muitos dos quais participaram, naturalmente, no estudo. É óbvio que os resultados não podem deixar de ser fortemente influenciados por este facto, pois, por exemplo, é muito diferente testar um jovem de 15 anos que frequenta o 8°ano de escolaridade ou um outro que frequente o 10°ano de escolaridade. Uma análise mais fina dos dados mostra que a média dos jovens portugueses que frequentam os 10° ou 11°anos de escolaridade é superior à média verificada no conjunto dos países participantes. O que pode ser também interessante analisar e interpretar. Em todo o caso, o que aqui se pretende referir é a incapacidade que, ao longo dos anos, temos vindo a demonstrar para proceder a análises nacionais dos dados. Não para evitar a comparação com os dados dos restantes países, mas para a contextualizar e proceder a análises que retratem mais rigorosamente a nossa realidade e que, no contexto de um estudo internacional, poderão não fazer muito sentido.” (o negrito é meu) (Fernandes, 2005)

É a tal “disfunção do sistema educativo” a que se referia o Secretário de Estado Adjunto da Educação nas declarações à imprensa. Percebe-se que Jorge Pedreira leu a cartilha e leu o que mais lhe conveio. Usou um bom argumento para se defender dos pretensos maus resultados académicos dos alunos passando de seguida ao contra-ataque, numa espécie de fuga para a frente, como tem sido apanágio deste ME.

«Portugal consegue ter um resultado acima da média entre os alunos que têm um percurso escolar normal [que nunca chumbaram]. Nos outros, a situação é dramática», sublinhou Jorge Pedreira, adiantando que o estudo mostra que a retenção não está a funcionar em Portugal como um mecanismo de recuperação dos estudantes. (in: Portugal Diário)

Urge retirar os empecilhos do caminho para pedir meças no PISA. Deste modo, num ápice, acabamos por melhorar as estatísticas do insucesso escolar. Direi que é uma ideia… reluzente… a condizer com a quadra natalícia.